Acórdão n.º 417/2006, de 13 de Dezembro de 2006

Acórdáo n.o 417/2006

Processo n.o 538/2005

Acordam na 1.a Secçáo do Tribunal Constitucional:

I- Relatório. - 1 - Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relaçáo do Porto, em que é recorrente EP - Estradas de Portugal, E. P. E. (que sucedeu ao IEP - Instituto das Estradas de Portugal), e sáo recorridos Armindo Borges Alves da Costa e Maria Fernanda Magalháes Ferreira da Costa, foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.o, n.o 1, alínea b), da Lei da Organizaçáo, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do Acórdáo daquele Tribunal de 11 de Abril de 2005.

A recorrente requereu a apreciaçáo da «inconstitucionalidade da norma contida no artigo 26.o, n.o 12, do Código das Expropriaçóes, aprovado pela Lei n.o 168/99, de 18 de Setembro, quando interpretada no sentido de poder ser aplicada (mesmo que por aplicaçáo extensiva ou analógica) a terrenos sem aptidáo construtiva - no caso, em virtude da sua integraçáo na Reserva Agrícola Nacional (RAN)», por violaçáo do princípio da igualdade; bem como a «inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 do artigo 23.o e 1 do artigo 26.o do actual Código das Expropriaçóes, quando interpretadas no sentido de permitir avaliar e indemnizar como 'solo apto para construçáo' (ainda que extensiva ou analogicamente) solo integrado na RAN à data da declaraçáo de utilidade pública, expropriado para implantaçáo de vias de comunicaçáo», por violaçáo dos princípios da justa indemnizaçáo por expropriaçáo e da igualdade.

2 - O Instituto para a Construçáo Rodoviária (ao qual sucedeu o IEP - Instituto das Estradas de Portugal) requereu a expropriaçáo de uma parcela de terreno pertencente aos recorridos, destinada à construçáo da variante nascente de Famalicáo, com a área de 2599 m2

Interpostos recursos da decisáo arbitral, que fixou em 13 068 000$ o valor da indemnizaçáo, foi decidido, por sentença de 15 de Julho de 2004, do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Famalicáo, fixar em E 211 498,30 o valor da indemnizaçáo a pagar pela ora recorrente aos recorridos. A entidade expropriante interpôs recurso desta decisáo para o Tribunal da Relaçáo do Porto, sustentando, para além do mais, a inconstitucionalidade das normas já mencionadas.

3 - Em 11 de Abril de 2005, o Tribunal da Relaçáo do Porto acordou em julgar improcedente o recurso e confirmar a decisáo recorrida:

III - Factos provados. - O Tribunal, para fundamentar a sua decisáo, considerou provados os seguintes factos:

1.o Foi adjudicada à expropriante a propriedade de uma parcela de terreno com a área de 2599 m2, a qual constituía a totalidade de um prédio rústico sito no lugar de Regada, freguesia de Gaviáo, Vila Nova de Famalicáo, descrito com o n.o 25 705, que confronta a norte com EN 206/Avenida do Brasil, a nascente com rio Pelhe, a sul com Joaquim Correia Marques e a poente em ponta com a EN 206 e a Avenida do Brasil.

2.o O prédio está inserido no núcleo urbano da cidade de Vila Nova de Famalicáo, sendo dotado de um nível médio de equipamento, serviços e comércio, dispondo do lado norte da EN 206/ Avenida do Brasil de via pavimentada em tapete asfáltico, com a largura média de 10 m, devidamente infra-estruturada.

3.o A área expropriada, que constitui a totalidade do prédio, é formada por duas parcelas, sendo de 1973 m2 a necessária para a obra e 626 m2 considerada como sobrante, tendo uma configuraçáo triangular, de declive muito suave para sul.

4.o Tal prédio está classificado na planta de ordenamento do Plano Director Municipal de Vila Nova de Famalicáo como «espaço de aglomerado tipo 2», na extremidade poente e, maioritariamente, como «Reserva Agrícola Nacional».

5.o As parcelas de terreno situadas na área envolvente, cujo perí-metro exterior se situa a 300 m (ou menos) do limite da parcela expropriada, estáo classificadas na planta de ordenamento do território do PDM como: 'RAN'; 'REN'; 'espaços de aglomerado tipo 4 - 2 pisos', 'espaços de aglomerado tipo 3 - 2 pisos', 'espaços de expansáo de aglomerado tipo 1 - 6 pisos', 'espaço verde urbano' e, maioritariamente, como 'espaços de aglomerado tipo 2 - 4 pisos'.

6.o O prédio foi adquirido pelos expropriados em data anterior à classificaçáo dos solos pela carta da RAN e à ratificaçáo do PDM.

7.o A título de benfeitorias, o prédio possuía um bardo de vinha, conduzido e enforcado com um fio de arame, de pouca produçáo, suportado em amieiros.

8.o Bordejando o prédio, a sul, existia uma ramada, com vinha de castas correntes e em plena produçáo, cobrindo uma área de 310 m.

IV - O direito. - O solo expropriado foi classificado e valorado pelos peritos nomeados pelo tribunal e dos expropriados como 'solo apto a construçáo' e pelo perito da expropriante como 'solo apto para outros fins', circunstância esta que, desde logo, origina uma disparidade enorme em termos de avaliaçáo final.

[. . .] vamo-nos cingir à questáo essencial aqui em discussáo e que consiste em saber se o solo dos autos nunca poderia ser classificado e avaliado como 'solo apto para a construçáo' em virtude da sua integraçáo em RAN e ainda pelo facto de incidirem sobre o mesmo prédio várias servidóes e restriçóes que impossibilitam a construçáo.

Ou seja, mais genericamente, se, encontrando-se um terreno a expropriar incluído em RAN, acarreta a possibilidade de ser classificado e valorado como 'solo para construçáo'.

A doutrina e a jurisprudência estáo, perante o novo Código das Expropriaçóes, divididas, sendo que, para uns, haverá de ser feita uma interpretaçáo extensiva do n.o 12 do artigo 26.o do CE/99, tendo em atençáo o n.o 2 do artigo 25.o do mesmo Código, donde concluir que a inclusáo de um terreno na RAN ou na REN náo acarreta necessariamente a extinçáo da capacidade edificativa do solo, impedindo a sua classificaçáo como solo apto para construçáo, ou seja, desde que o terreno a expropriar, embora integrado na RAN, tenha algumas das características exigidas naquele n.o 2 do artigo 25.o para o tornar apto a construçáo, deve ser considerado, numa interpretaçáo extensiva do n.o 12 do artigo 26.o, com tendo aptidáo edificativa - Acórdáo da Relaçáo de Coimbra de 15 de Dezembro de 2003, in Colectânea de Jurisprudência,t. V, p. 37, Acórdáo da Relaçáo de Coimbra de 22 de Junho de 2004, in Colectânea de Jurisprudência, t. III, p. 30, e Acórdáo da Relaçáo do Porto de 6 de Novembro de 2003, em www.dgsi.pt -, enquanto para outros, desde que o terreno a expropriar esteja integrado na RAN, náo há que atender à sua capacidade edificativa, uma vez que tal capacidade náo se faz renascer com a expropriaçáo - por todos, Acórdáo da Relaçáo do Porto de 26 de Fevereiro de 2004, em www.dgsi.pt.

[. . .] no presente caso, ainda mais relevante e justificado se mostra o entendimento seguido de existir a possibilidade de um solo integrado na RAN poder ser avaliado como 'solo apto a construçáo', uma vez que existe mesmo na área expropriada parte que, embora náo significativa, se situa em 'espaço de aglomerado tipo 2', ou seja, em espaço urbano, ou seja, a ocorrência simultânea de existência num mesmo terreno de solo integrado em RAN e em espaços de aglomerado.

Por isso que a questáo que agora se coloca é a de saber se nas circunstâncias dos autos é possível sustentar que a inclusáo de um terreno na RAN acarreta ou náo necessariamente a extinçáo da sua capacidade edificativa para efeitos de atribuiçáo de indemnizaçáo em expropriaçáo quando se destina à construçáo de uma infra-estrutura rodoviária, como é a variante nascente a Vila Nova de Famalicáo.

E o problema ou a soluçáo náo é classificar e passar um solo de RAN classificado de 'solo apto para outros fins' para 'solo apto a construçáo', mas antes e apenas se perante as circunstâncias específicas da situaçáo da parcela a expropriar se devem ou náo ser usados os critérios de avaliaçáo do solo apto para construçáo, atendendo especialmente aos factores e vectores inseridos no n.o 12

do artigo 26.o do CE/99. O que se trata aqui náo é classificar pura e simplesmente a parcela como 'solo apto para construçáo', mas se tal parcela deve ser valorizada de acordo com os critérios fixados para o 'solo apto para construçáo' [. . .]

No caso dos autos e em funçáo das características já apontadas e determinadas, a parcela expropriada fica numa situaçáo em tudo idêntica à das que se encontram previstas no número do artigo enunciado, na medida em que há uma desafectaçáo da RAN e foi expropriada para infra-estrutura pública rodoviária, pelo que nada impede que se faça aplicaçáo extensiva ou analógica desse artigo 26.o, n.o 12, por força do disposto no artigo 10.o do CC - v. o Acórdáo da Relaçáo de Coimbra de 22 de Junho de 2004, in Colectânea de Jurisprudência, ano 2004, t. III, p. 34, e Acórdáo da Relaçáo do Porto de 28 de Novembro de 2003, em www.dgsi.pt.

Ora, confrontando agora e mais precisamente com a matéria dada como provada na sentença em recurso, verificamos que:

"O prédio está inserido no núcleo urbano da cidade de Vila Nova de Famalicáo, sendo dotado de um nível médio de equi-pamento, serviços e comércio, dispondo do lado norte da EN 206/Avenida do Brasil de via pavimentada em tapete asfáltico, com a largura média de 10 m, devidamente infra-estruturada;

Tal prédio está classificado na planta de ordenamento do Plano...

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