Decreto-Lei n.º 104/97, de 29 de Abril de 1997

Decreto-Lei n.º 104/97 de 29 de Abril 1. A visão que, em matéria de enquadramento da actividade ferroviária, prevaleceu em Portugal até ao final da década de 80 encontra a sua raiz profunda na Lei n.º 2008, de 7 de Setembro de 1945, que continuou a balizar aquele enquadramento até à sua revogação, em 1990. Constituíram vectores essenciais desse enquadramento, sobretudo em função do que dispunham as bases I e II da referida lei, os princípios da concessão única e da atribuição à concessionária única das funções de transformação e reapetrechamento da rede, bem como da própria exploração do transporte. Este regime de concessionária única, responsável por tudo, desde o transporte ao investimento na infra-estrutura, manteve-se ao longo de mais de quatro décadas.

  1. Nos anos de transição da década de 80 para a de 90 consolidou-se no ordenamento jurídico português o princípio de que cabe ao Estado, e não à empresa de caminho de ferro, proceder ao financiamento dos investimentos em infra-estruturas de longa duração (ILD). Já antes, porém, se havia operado a assunção pelo Estado de algumas actividades de investimento na infra-estrutura ferroviária, asseguradas, aliás, por entidades jurídicas distintas dele, no âmbito da delegação de poderes em órgãos da administração estadual indirecta. Assim, na região do Grande Porto, a partir de uma intervenção pontual através do Gabinete da Ponte Ferroviária sobre o Rio Douro, criado pelo Decreto-Lei n.º 307/81, de 13 de Novembro, foi-se alargando a actuação do Estado até à assunção da promoção e coordenação de todas as actividades relacionadas com a renovação do nó ferroviário do Porto, mediante a publicação do Decreto-Lei n.º 347/86, de 15 de Outubro, que criou o Gabinete do Nó Ferroviário do Porto (GNFP). Posteriormente, a fim de assegurar a promoção, a coordenação, o desenvolvimento e o controlo de todas as actividades relacionadas com o nó ferroviário de Lisboa, foi criado pelo Decreto-Lei n.º 315/87, de 20 de Agosto, o Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa (GNFL).

  2. Na Lei n.º 10/90, de 17 de Março, designada por Lei de Bases do Sistema de Transportes Terrestres, veio consagrar-se o princípio da separação entre a responsabilidade pela construção, renovação e conservação da infra-estrutura, atribuída ao Estado ou a 'entidade actuando por sua concessão ou delegação', e a exploração do transporte ferroviário.

  3. Sem prejuízo da futura consagração de medidas legislativas estruturantes das actividades conexas com o sistema ferroviário, importa, de imediato, introduzir algumas alterações no regime jurídico actual em matéria de gestão da infra-estrutura, que se pretendem potenciadoras de efeitos benéficos, sobretudo nas regiões do País onde o transporte ferroviário apresenta uma relevância mais crítica, atendendo às necessidades de deslocação pendular das populações.

  4. O presente diploma tem subjacentes os seguintes intuitos programáticos: a) Proceder à modernização da política e da estrutura de transportes ferroviários, por forma a atribuir-lhes um papel mais adequado às necessidades actuais da economia e das populações, introduzindo, ao nível das próprias estruturas orgânicas utilizadas, a distinção entre as actividades de transporte ferroviário e as de gestão da infra-estrutura ferroviária, na linha de evolução do direito comunitário; b) Agilizar a realização e a gestão dos investimentos na infra-estrutura, mediante atribuição das funções de promoção, coordenação, desenvolvimento e controlo dos investimentos à entidade à qual seja atribuída a gestão da mesma, permitindo pois uma integração efectiva dessas duas vertentes; c) Proceder à racionalização económica do funcionamento do sector dos transportes, mediante o estabelecimento de taxas de utilização da infra-estrutura ferroviária, viabilizando a sua utilização por vários operadores de serviços de transporte, como, de resto, é paradigma da política comum de transportes a nível comunitário.

  5. Nestes termos, cria-se, na tutela dos Ministros das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, uma empresa pública de gestão da infra-estrutura integrante da rede ferroviária nacional, à qual são atribuídas missões específicas de desenvolvimento, modernização e gestão das infra-estruturas. Trata-se de uma entidade cujas atribuições, por se restringirem ao domínio da infra-estrutura, se podem mais adequadamente harmonizar com a abertura da actividade de transporte ferroviário à iniciativa privada.

  6. A metodologia de constituição e desenvolvimento da nova empresa desenrola-se de forma faseada, adequada às necessidades de garantia da prossecução dos processos de investimento em curso na modernização da rede ferroviária nacional. O critério de faseamento respectivo assenta, assim, em dois vectores diferenciados, um de assunção de atribuições e actividades, outro de transmissão de elementos dominiais e patrimoniais.

Assim: Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte: Artigo 1.º Criação da REFER, E.P., e extinção do GNFL, do GNFP e do GECAF 1 - É criada, nos termos do presente diploma, a Rede Ferroviária Nacional REFER, E. P., abreviadamente designada por REFER, E. P., a qual se rege pelo DecretoLei n.º 260/76, de 8 de Abril, com as alterações posteriores, pelo estatuto que constitui o anexo I ao presente diploma, que dele faz parte integrante, e pela demais legislação aplicável.

2 - São extintos o Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa (GNFL), criado pelo Decreto-Lei n.º 315/87, de 20 de Agosto, o Gabinete do Nó Ferroviário do Porto (GNFP), criado pelo Decreto-Lei n.º 347/86, de 15 de Outubro, e o Gabinete de Gestão das Obras de Instalação do Caminho de Ferro na Ponte sobre o Tejo em Lisboa (GECAF), criado pelo Decreto-Lei n.º 71/94, de 3 de Março, em cujos bens, direitos e obrigações a REFER, E. P., sucede universalmente, nos termos e com as excepções definidos no presente diploma.

Artigo 2.º Natureza e objecto da REFER, E. P.

1 - A REFER, E. P., tem a natureza de pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, estando sujeita à tutela dos Ministros das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

2 - A REFER, E. P., tem por objecto principal a prestação do serviço público de gestão da infra-estrutura integrante da rede ferroviária nacional, que nela é delegado por efeito automático do presente diploma.

3 - Sem prejuízo das atribuições que, em matéria de regulação ferroviária, caibam ao Estado ou a entidade por este designada, consideram-se abrangidos pelo disposto no número anterior os poderes de definição das regras específicas de acesso à infra-estrutura, ou a partes desta, por empresas ou agrupamentos de transporte ferroviário e a prática dos actos respeitantes à emissão, modificação e extinção dos respectivos certificados de segurança, conforme previsto no artigo 11.º da Directiva n.º 95/19/CE, do Conselho, de 19 de Junho de 1995.

Artigo 3.º Outras atribuições e competências 1 - Constitui também atribuição da REFER, E. P., a construção, instalação e renovação das infra-estruturas ferroviárias, sempre com observância das regras gerais sobre o regime financeiro a que estão sujeitos os investimentos em infra-estruturas ferroviárias de longa duração (ILD).

2 - Compete igualmente à REFER, E. P., relativamente à Ponte de 25 de Abril, a coordenação das obras de reforço estrutural, beneficiação geral da estrutura metálica, instalação do tabuleiro ferroviário e alargamento do tabuleiro rodoviário, bem como de instalação do viaduto ferroviário na margem norte do Tejo.

3 - Integram a atribuição e competência exclusivas da REFER, E. P., os actos previstos no n.º 2 do artigo 12.º da Lei n.º 10/90, de 17 de Março, e no Decreto-Lei n.º 269/92, de 28 de Novembro, e, bem assim, a construção, instalação e gestão das interfaces com os serviços de outros modos de transporte, desde que integrantes do domínio público ferroviário.

Artigo 4.º Definições Para efeitos do presente diploma, entende-se por: a) Infra-estrutura ferroviária: o conjunto dos elementos referidos no anexo II ao presente diploma; b) Gestão da infra-estrutura: gestão da capacidade, conservação e manutenção da infra-estrutura, bem como gestão dos respectivos sistemas de regulação e segurança.

Artigo 5.º Regras aplicáveis ao serviço público 1 - O serviço público de gestão da infra-estrutura ferroviária deve fazer-se por forma a respeitar o carácter integrado da rede ferroviária nacional e com observância dos princípios e normas de regulação ferroviária aprovados pelo Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território ou por entidade por este designada.

2 - A construção de novas linhas e ramais ferroviários requer a prévia aprovação do Ministro das Finanças e do ministro da tutela, mediante a sua inclusão nos planos de investimentos, de acordo com os princípios constantes do artigo 11.º da Lei n.º 10/90, de 17 de Março.

Artigo 6.º Articulação com outras entidades 1 - A REFER, E. P., e as empresas e agrupamentos de transporte ferroviário acordarão o respectivo modo de articulação, nas acções e decisões que devam ser tomadas relativamente à gestão, exploração e desenvolvimento das infra-estruturas e à sua coordenação com o serviço público de transporte ferroviário.

2 - Aplica-se ao acesso às infra-estruturas ferroviárias o disposto no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 252/95, de 23 de Setembro, com as devidas adaptações.

Artigo 7.º Utilização da infra-estrutura, serviços e prestações acessórios 1 - Pela utilização da infra-estrutura ferroviária por empresas e agrupamentos de transporte ferroviário, a REFER, E. P., terá direito à cobrança das correspondentes taxas de utilização, a homologar pelo Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território ou por entidade a quem venham a ser atribuídas funções de regulação ferroviária.

2 - As taxas de utilização devem ser calculadas...

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