Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril de 2003

Decreto-Lei n.º 86/2003 de 26 de Abril A transformação dos sistemas sociais operada no decurso do século XX, em virtude das quais o Estado passou a assumir novas funções, inclusive produtivas, de satisfação das necessidades sociais e públicas, provocou, paralelamente, um elevado aumento da despesa pública, observando-se nas sociedades modernas um peso excessivo do Estado e níveis incomportáveis de endividamento público, sem o equivalente aumento da qualidade dos serviços públicos prestados aos cidadãos. Em resposta, tem vindo a assistir-se à alteração do entendimento quanto ao papel do Estado na economia e, mais genericamente, quanto à forma de satisfação das necessidadescolectivas.

A similitude entre determinadas actividades prosseguidas por entidades privadas e as subjacentes à prestação de certos serviços públicos, tem levado à conclusão de que também nos serviços públicos é possível tirar proveito da tradicional melhor capacidade de gestão do sector privado, melhorando a qualidade do serviço prestado e gerando poupanças consideráveis na utilização de recursos públicos.

Uma das formas, internacionalmente consagrada e testada, de obtenção pelo Estado de tais competências de gestão, consiste no estabelecimento de relacionamentos duradouros com privados, em regime de parceria público-privada, no âmbito dos quais lhes são transferidos os riscos, nomeadamente tecnológicos e operacionais, com os quais se encontram mais familiarizados e para cujo manuseamento se encontram mais habilitados.

Neste âmbito, têm vindo o Estado e outros entes públicos a desenvolver modelos alternativos e experiências inovadoras de relacionamento com entidadesprivadas.

Essas inovações quase sempre passam por um relacionamento de longo prazo entre os parceiros públicos e privados, envolvendo a repartição de encargos e riscos entre as partes e o estabelecimento de compromissos de médio ou longo prazo que, quando implicam encargos a satisfazer pelos entes públicos envolvidos, afectam e condicionam imperativamente a totalidade ou parte dos respectivos orçamentos futuros, compreendidos no período de duração dos contratos celebrados.

Tais modelos, nos casos em que criam encargos de médio ou longo prazo para o parceiro público, e pelo reflexo que comportam em termos de alteração do perfil e características da despesa pública, acarretam, também, a necessidade de dar passos no sentido de uma orçamentação plurianual do sector público administrativo, que, por um lado, permita aos decisores públicos avaliar objectivamente, em toda a sua dimensão e projecção temporal, os custos e benefícios plurianuais das opções tomadas, bem como ponderar devidamente a responsabilidade que assumem ao decidi-las e, por outro, habilite o parceiro público a evidenciar e enquadrar orçamentalmente, em tempo útil e realisticamente, a integralidade dos compromissos financeiros que resultam das parcerias contratadas.

A implementação desse sistema de orçamentação plurianual, a qual se encontra em curso, não elimina, no entanto, a necessidade de estipulação de algumas regras gerais relativas aos procedimentos de assunção de responsabilidades e de partilha de riscos no âmbito de parcerias público-privadas, tendo em vista garantir a respectiva economia, eficiência e eficácia, bem como a respectiva articulação com as normas de enquadramentoorçamental.

Em paralelo, o objectivo de melhorar os procedimentos de contratação e padronizar os instrumentos de regulação jurídica das parcerias, torna-se, assim, ainda mais imperioso e evidente, como forma determinante de extrair todo o valor implícito, em termos de racionalização, previsibilidade e legitimação da realização de despesa pública, na existência de um tal sistema de programação financeira.

Instituem-se, assim, princípios gerais de eficiência e economia relativos à repartição de riscos entre o parceiro público e o parceiro privado que permitam dotar a relação contratual subjacente de uma harmonia e equilíbrio ao nível da repartição dos encargos e da distribuição do risco.

Tais princípios deverão desempenhar a dupla função de, por um lado, enformar o conteúdo de cada parceria efectivamente concretizada e, por outro, de obrigar o decisor público a reflectir, na fase constitutiva, acerca da adequação do recurso à figura da parceria, em geral, ou de determinados modelos, em particular, sempre que a apresentação dos projectos de forma atractiva para o mercado privado implique a assunção de encargos, por parte do Estado, que, pela duração dos compromissos assumidos ou pela imprevisibilidade de determinadas matérias, coloquem em causa o valor acrescentado do recurso a este modo de relacionamento, em detrimento de outros alternativos, ou o normal exercício da prossecução do interesse público no longo prazo.

Estes princípios exigem também, nas fases preparatórias, uma mais cuidada avaliação da possível repartição do risco, e propiciam, durante a vigência da parceria, uma maior eficiência da mesma, criando incentivos à definição de parcerias financeiramente sustentáveis e bem geridas.

O presente diploma avança ainda na consagração plena, no ordenamento jurídico português, do princípio segundo o qual a parceria apenas se justifica quando se revelar vantajosa em confronto com o comparador de sector público.

A este nível, a inovação traduz-se no facto de a exigência constante do n.º 2 do artigo 16.º da lei de enquadramento orçamental receber um tratamento procedimental compatível com a complexidade do juízo subjacente, através da exigência, em várias fases processuais, do confronto do projecto de parceria com o comparador de sector...

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