Acórdão n.º 756/2020

Data de publicação23 Fevereiro 2021
SeçãoParte D - Tribunais e Ministério Público
ÓrgãoTribunal Constitucional

Acórdão n.º 756/2020

Sumário: Julga improcedentes os recursos da decisão da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos que julga prestadas com as irregularidades nela discriminadas as contas apresentadas pelo Partido Socialista relativas à Campanha Eleitoral respeitante à eleição para a Assembleia da República, de 4 de outubro de 2015; julga parcialmente procedente os recursos de contraordenação interpostos pelo Partido Socialista e pelo Mandatário Financeiro para a Campanha em causa.

Processos n.os 248 e 249/2020

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I - Relatório

1 - Por decisão datada de 20 de junho de 2018, a Entidade das Contas e dos Financiamentos Políticos (doravante, "ECFP") julgou prestadas com as irregularidades que a seguir se discriminam, as contas pelo Partido Socialista (PS) relativas à Campanha Eleitoral para a Eleição, realizada em 4 de outubro de 2015, dos deputados para a Assembleia da República [artigos 27.ª, n.º 4, da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, na redação que lhe foi dada pela Lei Orgânica n.º 5/2015, de 10 de Abril (Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, doravante, "LFP") e 43.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento da ECFP, doravante, "LEC").

Foram as seguintes as irregularidades apuradas:

a) Contribuições do Partido indevidamente refletidas como contribuições em espécie, situação atentatória do artigo 15.º, n.º 3, da LFP;

b) Despesas com deslocações ao estrangeiro não elegíveis, em violação dos artigos 3.º e 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 95-C/76, de 30 de Janeiro, e 19.º da LFP;

c) Impossibilidade de concluir sobre a razoabilidade da valorização de algumas despesas, contrariando o disposto no artigo 15.º da LFP.

2 - Desta decisão foram interpostos recursos pelo PS e pelo Mandatário Financeiro para a Campanha em causa, Hugo Filipe Bento Pereira, nos termos dos artigos 23.º da LEC e 9.º, alínea e), da LTC, tendo sido determinada a subida a final, por ocasião da impugnação da decisão sancionatória, nos termos do n.º 3 do artigo 407.º do Código de Processo Penal (doravante, "CPP"), ex-vi do artigo 41.º do Regime Geral das Contraordenações (doravante, "RGCO").

3 - Na sequência da decisão relativa à prestação de contas, a ECFP levantou um auto de notícia e instaurou processos contraordenacionais contra o Partido e o Mandatário Financeiro, pela prática das irregularidades discriminadas naquela decisão.

4 - No âmbito do procedimento contraordenacional instaurado contra o PS (Processo n.º 22/2018), a ECFP, por decisão proferida em 28 de novembro de 2019, aplicou ao Partido uma coima no montante de (euro)4.668,00, equivalente a 18 (dezoito) SMN de 2008, pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 31.º, n.os 1 e 2, da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho (Lei Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, doravante "LFP)"; e ao Mandatário Financeiro (Processo n.º 23/2018), na mesma data e com fundamento no artigo 31.º, n.º 1, da mesma lei, uma coima no montante de (euro)1.704,00, equivalente a 4 (quatro) SMN de 2008.

5 - Desta decisão foram interpostos recursos pelo PS e pelo Mandatário Financeiro.

6 - Recebidos os requerimentos de recurso, subscritos pelo PS e pelo Mandatário Financeiro, a ECFP sustentou as decisões recorridas e determinou a remessa dos autos ao Tribunal Constitucional.

4. [sic] Admitidos os recursos, ordenou-se a abertura de vista ao Ministério Público, nos termos do n.º 1 do artigo 103.º-A da LTC.

5. [sic] O Ministério Público emitiu pareceu, pronunciando-se pela improcedência do recurso, parecer que foi notificado ao Partido e ao Mandatário Financeiro.

6. [sic] O PS e o Mandatário Financeiro não se pronunciaram.

II. Considerações gerais sobre o novo regime de fiscalização das contas dos partidos e das campanhas eleitorais

7 - A Lei Orgânica n.º 1/2018, de 19 de abril, veio alterar, entre outras, a LFP e a LEC, introduzindo profundas modificações no regime de apreciação e fiscalização das contas dos partidos políticos e no regime de aplicação das respetivas coimas.

Considerando que à data de entrada em vigor desta lei - 20 de abril de 2018 (artigo 10.º) - os presentes autos aguardavam julgamento respeitante à legalidade e regularidade das contas, tal regime é-lhes aplicável, nos termos da norma transitória do artigo 7.º da referida Lei Orgânica.

A respeito do novo regime legal, quer quanto à competência de fiscalização, quer no que respeita ao regime processual, v. Acórdão n.º 421/20.

III - Dos Recursos das decisões da ECFP relativos à legalidade e irregularidade das contas de campanha

A - Factos Provados

8 - Com relevo para a decisão provou-se que:

8.1 - O Partido Socialista (PS) é um partido político português, constituído em 1 de Fevereiro de 1975, cuja atividade se encontra registada junto do Tribunal Constitucional.

8.2 - O PS apresentou candidatura às eleições para a Assembleia da República, realizadas a 4 de outubro de 2015.

8.3 - O Partido apresentou, em 29 de junho de 2016, junto do Tribunal Constitucional as respetivas contas relativas à campanha eleitoral mencionada no ponto 2.

8.4 - Nas contas apresentadas foram registadas como contribuições em espécie do Partido, no valor total de (euro)4.744,50, as seguintes despesas cujas faturas foram liquidadas diretamente pelo Partido, sem que o valor respetivo tenha entrado na conta bancária da Campanha com o n.º 45467604916 05 do banco Millenium BCP - Private Banking:

8.4.1 - Fatura n.º 1500/000098, emitida em 25/09/2015, pelo fornecedor "Batikano's - Industria Hoteleira, Lda.", no valor de (euro)430,50;

8.4.2 - Fatura n.º FT 002/2095, emitida em 29/09/2015, pelo fornecedor "TASCAKEFISH, Lda.", no valor de (euro)946,00;

8.4.3 - Fatura n.º FAC SEDE/6597, emitida em 29/09/2015, pelo fornecedor "Florineve - Produção e Comércio de Flores, Lda.", no valor de (euro)318,00;

8.4.4 - Fatura n.º 2015FT/74, emitida em 16/10/2015, pelo fornecedor "Samuel Camacho, Luz e Som", no valor de (euro)1.098,00;

8.4.5 - Fatura n.º FT 2015/41, emitida em 21/01/2016, pelo fornecedor "Os Amigos da Música - Conjunto Musical, Lda.", no valor de (euro)1.952,00.

8.5 - O Arguido registou nas contas apresentadas as seguintes despesas de campanha:

8.5.1 - Fatura n.º FT2015A1/157, emitida em 25/08/2015, pelo fornecedor "AXIMAGE, COMUNICAÇÃO E IMAGEM, Lda.", no valor de (euro)2.767.50, com o descritivo "Realização de duas reuniões de grupo nos dias 2 e 3 de setembro, conforme nossa proposta e vossa nota de encomenda, n.º Ap 22/0815, 50 % iniciais";

8.5.2 - Fatura n.º FT2015/000670, emitida em 25/05/2015, pelo fornecedor "BOLD Internacional", no valor de (euro)4.081,14, com o descritivo "Desenvolvimento Website PS2015, Diamond by BOLD";

8.5.3 - Fatura n.º 586/2015 (FA), emitida em 31/08/2015, pelo fornecedor "CUNHA VAZ & ASSOCIADOS-Consult. em Comunicação, S. A.", no valor de (euro)25.215,00, com o descritivo "50 % valor total Serviços de Media Trainning e Apoio às Redes Sociais";

8.5.4 - Fatura n.º FAC 4/72, emitida em 01/10/2015, pelo fornecedor "domp - Desenvolvimento Organizacional, Marketing e Publicidade S. A.", no valor de (euro)4.781,01, com o descritivo "SERVIÇO DE TRABALHOS ESPECIALIZADOS VOSSA NOTA DE ENCOMENDA N.º AP 40/0915";

8.5.5 - Fatura n.º 232, emitida em 07/04/2015, pelo fornecedor "Edson-FCB Publicidade, Lda.", no valor de (euro)18.450,00, com o descritivo "Consultoria de planeamento estratégico de comunicação; Consultoria de planeamento de storytelling (estabelecer, através de imputs do candidato, o guião com as histórias principal e secundárias para a campanha; fazer regularmente o reset desse guião); Criação de peças chave da campanha; Participação (no papel de communication adviser) em algumas reuniões de coordenação política/estratégica; Análise regular da campanha nas redes sociais.".

8.5.6 - Fatura n.º 46/2015 [FA], emitida em 13/07/2015, pelo fornecedor "GRANDEVENTO - Organização de Eventos", no valor de (euro)49.999,50, com o descritivo "ELEIÇÕES LEGISLATIVAS 2015, Levantamento Nacional de Locais para Comícios (conforme relatório anexo); Valores dos Serviços prestado e acima relacionados. Os serviços facturados foram disponibilizados ao adquirente nesta data (n.º 5 - alínea F do artº. 36.º do CIVA)";

8.5.7 - Fatura n.º 1/8, emitida em 29/05/2015, pelo fornecedor "LPM STRATEGIES, UNIPESSOAL, LDA.", no valor de (euro)6.150,00, com o descritivo "Prestação de serviços de consultoria de marketing e comunicação - 1.ª tranche.; valor; *Encomenda N.º: AP 53/0415; *Serviços prestados ou bens fornecidos no corrente mês.";

8.5.8 - Fatura n.º 2015/82, emitida em 31/08/2015, pelo fornecedor "Naughty Boys", no valor de (euro)5.535,00, com o descritivo "Legislativas 2015; Assessoria Mediática 1.ª tranche";

8.5.9 - Fatura n.º 2015/37, emitida em 01/09/2015, pelo fornecedor "Savvy Pirate Communication", no valor de (euro)34.855,13, com o descritivo "Activação Digital; Filme; Criação do conceito para a Campanha "Eu Confio"; Outdoor Físico; Fee de Agência";

8.5.10 - Fatura n.º FA 2015/391, emitida em 03/07/2015, pelo fornecedor "Espiral de Letras - Publicidade e Eventos, Lda.", no valor de (euro)39.572,18, com o descritivo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT