Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 2/2010, de 02 de Fevereiro de 2010

n. 2/2010

Processo n. 457/09 - Pleno da 1.ª Secçáo

Acordam no pleno da Secçáo de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA):

I - Relatório

CIMPOR - Cimentos de Portugal, SGPS, S. A., recorre, para uniformizaçáo de jurisprudência, do acórdáo do TCASul que confirmou a sentença que julgou o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa incompetente em razáo da matéria.

Invocou como fundamento da oposiçáo o Acórdáo da Secçáo de Contencioso Administrativo do STA de 15 de Maio de 2003 proferido no recurso n. 993/02.

Alegou, tendo apresentado as seguintes conclusóes:

a) O douto acórdáo recorrido está em manifesta oposiçáo com o douto acórdáo da 1.ª Secçáo deste Supremo Tribunal proferido no processo n. 993/02 -11, de 15 de Março de 2003.

b) Subjacente aos presentes autos náo está, ao contrário do doutamente decidido, uma questáo fiscal.

c) E por isso mesmo é que a questáo dos autos náo está abrangida na competência dos tribunais tributários estabelecida no n. 1 do artigo 49. do ETAF, designadamente na subalínea iv) da sua alínea a).

d) Entendendo de forma diferente, o douto acórdáo recorrido violou a referida disposiçáo legal.

Náo foram produzidas contra -alegaçóes e o Ministério Público nada disse ou requereu.

Sem vistos, mas com distribuiçáo prévia do projecto de acórdáo, cumpre decidir.

II - Fundamentaçáo

II.1 - Com interesse para a decisáo importa registar os seguintes factos:

1) A CIMPOR - Cimentos de Portugal, E. P., foi transformada em CIMPOR - Cimentos de Portugal, S. A. (CIMPOR), nos termos do Decreto -Lei n. 197/91, de 29 de Maio;

2) A CIMPOR foi objecto de um processo de reprivatizaçáo, nos termos enunciados no Decreto -Lei n. 120/94, de 10 de Maio;

3) Antes de cada uma das quatro fases da privatizaçáo, a CIMPOR foi objecto de uma avaliaçáo, nos termos da alínea e) do artigo 296. da CRP e do artigo 5. da Lei n. 11/90, de 5 de Abril;

4) Em 18 de Fevereiro de 2000, a A. foi notificada pela Direcçáo -Geral dos Impostos de uma liquidaçáo adicional do imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas relativa ao ano de 1995, no valor de € 1 381 928,50;

5) A CIMPOR deduziu no tribunal tributário impugnaçáo judicial de parte da referida liquidaçáo adicional;

6) Em 14 de Julho de 2000, a CIMPOR requereu o pagamento da dívida no âmbito do Decreto -Lei n. 124/96, de 16 de Agosto (Plano Mateus);

7) Em 19 de Janeiro de 2001 a CIMPOR apresentou novo requerimento, em complemento do apresentado em 14 de Julho de 2000;

8) A CIMPOR efectuou o pagamento da liquidaçáo adicional referida, quer na parte náo impugnada quer na parte impugnada, em Novembro de 2000 e Fevereiro de 2001;

9) O valor de tal liquidaçáo e os valores efectivamente pagos náo foram tomados em conta nos processos de avaliaçáo patrimonial da CIMPOR efectuados aquando de cada uma das quatro fases da sua privatizaçáo;

10) Em 29 de Janeiro de 2003, tendo em conta a referida liquidaçáo e os pagamentos efectuados, e nos termos do artigo 3., n. 2, alínea d), do Decreto -Lei n. 453/88, de 13 de Dezembro, a CIMPOR requereu ao presidente do Fundo de Regularizaçáo da Dívida Pública «o pagamento à requerente da quantia de IRC adicionalmente liquidada, num total de € 1 381 928,50, acrescido de todos os encargos com esta liquidaçáo adicional, incluindo custas decorrentes da impugnaçáo [...] que venham a ser liquidados pela Administraçáo Fiscal, com o compromisso de, obtendo ganho de causa naquela impugnaçáo, devolver a quantia que a mais receber»;

276 11) Em 21 de Maio de 2003, a CIMPOR foi notificada do indeferindo de tal requerimento;

12) Face ao referido indeferimento a CIMPOR interpôs recurso contencioso para o STA;

13) Por Acórdáo de 9 de Dezembro de 2004, este STA anulou o referido despacho por enfermar de «vício de violaçáo de lei na parte em que nega, definitivamente, à recorrente o direito ao pagamento da quantia de € 1 381 928,50, referente à liquidaçáo adicional de IRC relativo ao ano de 1995, e, por vício procedimental, de violaçáo do direito de audiência, na parte em que recusa o pagamento da quantia referida antes de existir uma decisáo judicial definitiva da impugnaçáo judicial que tem por objecto tal liquidaçáo»;

13) Em 5 de Dezembro de 2005, a CIMPOR requereu ao STA, ao abrigo do disposto nos artigos 173. e seguintes do CPTA, a execuçáo do referido douto acórdáo;

14) Por Acórdáo de 14 de Março de 2006, o STA veio a fixar os termos em que o acórdáo anulatório deveria ser cumprido;

15) Em 11 de Janeiro de 2007, o Secretário de Estado do Tesouro e Finanças proferiu o despacho ora impugnado, junto por cópia à petiçáo inicial, aqui dado por reproduzido, na íntegra, e de que se respiga o seguinte:

Considerando que o acórdáo supra -referido náo distingue entre a parte da mencionada liquidaçáo adicional que constitui objecto da impugnaçáo judicial intentada pela CIMPOR e a parte remanescente;

Considerando que quer o mencionado acórdáo do STA, quer o parecer da SER, admitem que o pagamento pelo Fundo de Regularizaçáo da Dívida Pública (FRDP) dependa do trânsito em julgado da decisáo de mérito sobre a pretensáo de impugnaçáo;

Considerando ainda que a desistência da acçáo pela CIMPOR, neste momento e com vista a provocar a obrigaçáo de ressarcimento por parte do FRDP, poderia suscitar questóes de boa fé e em nada contribuiria para a satisfaçáo do interesse público:

Determina -se que o pagamento da importância reclamada é efectuado contra a comprovaçáo de que a dívida à administraçáo fiscal se tornou definitiva, por efeito de decisáo de mérito transitada em julgado, proferida no correspondente processo de impugnaçáo judicial, tal como se sugere no mencionado parecer da Secçáo Especializada para as Reprivatizaçóes.

II.2 - O acórdáo recorrido limitou -se a negar provimento ao recurso, remetendo para os fundamentos da decisáo impugnada (do TAC de Lisboa), ao abrigo do disposto no artigo 713., n. 5, do Código de Processo Civil (aplicável ao recurso de agravo por força do artigo 749. do mesmo Código), normativo subsidiariamente aplicável aos recur-sos ordinários de decisóes jurisdicionais dos tribunais administrativos e fiscais, nos termos do artigo 140. do CPTA.

II.3 - Transcreve -se de seguida o essencial da aludida decisáo do TAC:

A presente acçáo prende -se com uma liquidaçáo adicional efectuada em sede de IRC pela DGCI cujo valor, pago pela A., esta pretende que lhe que lhe seja reposto, pelo que se está perante uma acçáo administrativa especial de âmbito tributário.

Com efeito, a acçáo configura um recurso contencioso de um acto administrativo em matéria tributária

(porque referente a um imposto) que náo comporta a apreciaçáo da legalidade do acto de liquidaçáo e, por isso, é regulada pelas normas do CPTA (n. 2 do artigo 97. do CPPT).

A competência para conhecer das acçóes de impugnaçáo de actos administrativos respeitantes a questóes fiscais que náo sejam atribuídos à competência de outros tribunais é dos tribunais tributários, nos termos da subalínea IV) da alínea a) n. 1 do artigo 49. do ETAF.

Tendo este Tribunal, desde 1 de Outubro de 2007, competência apenas em matéria administrativa (artigo 2. do Decreto -Lei n. 182/2007, de 9 de Maio, e artigo 2. da...

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