Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/2020

ELIhttps://data.dre.pt/eli/resolconsmin/49/2020/06/24/p/dre
Data de publicação24 Junho 2020
SeçãoSerie I
ÓrgãoPresidência do Conselho de Ministros

Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/2020

Sumário: Cria o Programa de Transformação da Paisagem.

No processo de discussão e participação do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT), a qualidade da paisagem em meio rural foi assumida como fundamental para a valorização e desenvolvimento sustentável dos territórios e para qualidade de vida dos cidadãos.

Os espaços florestais, área arborizada, matos e pastagens, que ocupam quase 70 % da área terrestre de Portugal continental, constituem um elemento vital da paisagem rural e de sustentação e conetividade dos ecossistemas, além de uma âncora económica, ambiental e social dos territórios e da sua memória coletiva. Desempenham um papel determinante para o sequestro de carbono, indispensável para que Portugal possa atingir a neutralidade carbónica em 2050 e cumprem, ainda, um importante papel na regulação dos diferentes ciclos naturais, tendo uma função estruturante para a conservação da natureza e biodiversidade.

Não obstante, em parte significativa destes espaços florestais, definidos no PNPOT como «territórios de floresta a valorizar», as características físicas, como o relevo ou solos pobres, o acentuado despovoamento e envelhecimento da população, e consequente abandono do modelo agrossilvopastoril, a par de uma extrema fragmentação das propriedades, determinam um quadro marcado por extensas áreas florestais de monocultura, a sua maioria não geridas, que, em presença de condições atmosféricas adversas, atingem níveis de perigosidade de incêndio extremo, pondo em causa pessoas, animais e bens, incluindo património natural e cultural.

Este ciclo de simplificação dos processos ecológicos, com diminuição de mosaicos agroflorestais e económicos tem resultado em incêndios rurais cada vez mais intensos, com consequências ao nível da biodiversidade e da capacidade produtiva dos solos, e no desencadear de processos de erosão e desertificação física dos solos, a que acrescem perdas sociais e prejuízos económicos avultados, fragilizando ainda mais estes territórios.

Para estes contextos, impõe-se desenvolver respostas estruturadas e sustentáveis ambiental e financeiramente de forma a aumentar a sua resiliência socioecológica e contribuir para o seu desenvolvimento integrado, a partir do reordenamento da paisagem, na senda de uma floresta ordenada, biodiversa e resiliente, conjugada com um mosaico agrícola, agroflorestal e silvopastoril, capaz de prestar diversos serviços ambientais e de sustentar as atividades económicas que lhes estão associadas, reduzindo significativamente a severidade da área ardida.

Para o efeito, é fundamental motivar os proprietários, preferencialmente constituídos em agrupamentos, a investir e gerir as suas propriedades rústicas, incluindo no contexto pós-fogo, de modo a quebrar o ciclo de desinvestimento e a promover a gestão ativa, o ordenamento e a revitalização das áreas florestais de minifúndio.

Com base nestes pressupostos, o Governo comprometeu-se a prosseguir com a reforma florestal iniciada na anterior legislatura, como componente essencial da prossecução do primeiro de quatro desafios estratégicos assumidos para a atual legislatura - o de enfrentar as alterações climáticas garantido uma transição justa. Neste âmbito, definiu no seu Programa do Governo medidas concretas para intervir no espaço rural, promovendo a diversificação da paisagem, a diminuição da carga de combustível, o aumento da área florestal gerida e a reconversão e densificação da área existente para espécies mais adaptadas ao território, incluindo agrícolas, tendo em vista a sua resiliência aos riscos, nomeadamente de incêndios, e a valorização da paisagem numa ótica multidimensional e promotora do sequestro de carbono.

São essas medidas que agora se apresentam, num programa estruturado, a implementar a curto, médio e longo prazo - o Programa de Transformação da Paisagem (PTP), dirigido a territórios de floresta com elevada perigosidade de incêndio.

Neste âmbito, reforça-se a conformidade concetual do PTP com o PNPOT, no quadro das medidas dirigidas à valorização da paisagem, revitalização dos territórios das florestas, remuneração dos serviços prestados pelos ecossistemas, bem como de prevenção e adaptação do território às mudanças climáticas.

Encontra-se alinhado com os objetivos da Estratégia Nacional das Florestas 2030 (ENF 2030), nomeadamente ao nível do aumento da resiliência do território aos incêndios rurais, da recuperação e reabilitação das áreas afetadas e promoção de uma gestão sustentável dos territórios e com a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030 (ENCNB 2030), no qual é assumido que a adequada gestão das florestas é essencial para a conservação do património natural e para a recuperação de ecossistemas florestais abandonados, particularmente em áreas englobadas no Sistema Nacional de Áreas Classificadas.

Em termos conceptuais e programáticos, o PTP responde às orientações do Programa de Valorização do Interior, em concreto ao Programa + CO3SO Capital Natural, que tem em vista promover o desenho da paisagem como referencial de uma nova economia dos territórios rurais ancorada numa floresta multifuncional, biodiversa e resiliente, e às diretrizes do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, que introduz um novo modelo de governação do risco e uma abordagem integrada ao problema dos fogos rurais assente em quatro grandes objetivos estratégicos: valorizar o território, cuidar dos espaços rurais, modificar comportamentos e gerir eficientemente os riscos.

Finalmente, porque o PTP é um programa com medidas a lançar e concretizar no curto prazo, mas cuja dimensão é de médio e longo prazo, não só ao nível das ações, mas também de objetivos e resultados, assume um caráter dinâmico, prevendo ajustamentos e progressos ao nível dos meios e instrumentos aplicáveis, nomeadamente no que se refere ao novo quadro comunitário de apoio, e ao nível da disponibilização de novos incentivos financeiros e fiscais. O objetivo é garantir investimento público e privado para estes territórios vulneráveis, viabilizando uma gestão ativa, enquanto pilar da prevenção dos incêndios rurais e da construção de uma paisagem rural sustentável e resiliente.

Assim:

Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:

1 - Criar o Programa de Transformação da Paisagem (PTP), enquanto programa estratégico para intervenção integrada em territórios com vulnerabilidades decorrentes da conflitualidade entre a perigosidade e a ocupação e uso do solo, com o objetivo de promover uma transformação da paisagem que garanta a resiliência, a sustentabilidade e a valorização do território.

2 - Determinar que o critério-base para a delimitação dos territórios vulneráveis abrangidos pelo PTP é a carta de perigosidade de incêndio rural, divulgada pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I. P. (ICNF, I. P.), observado o valor existente e potencial de criação de valor, em bens e serviços, avaliado pelo ICNF, I. P., pela Direção-Geral do Território e pela Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais, I. P.

3 - Determinar que são abrangidos pelo PTP os territórios delimitados como vulneráveis, identificados à escala da freguesia, e aprovados por portaria dos membros do governo responsáveis pelas áreas da proteção civil, das autarquias locais, das florestas e do ordenamento do território, e da agricultura e do desenvolvimento rural.

4 - Determinar que podem ser abrangidas pelo PTP as áreas que sejam percorridas por incêndios de grandes dimensões, com área igual ou superior a 500 hectares, incluindo aqueles que se encontrem fora da delimitação geográfica referida no número anterior, por proposta do ICNF, I. P., ao membro do Governo responsável pela área da conservação da natureza, das florestas e do ordenamento do território, caso integre áreas classificadas.

5 - Estabelecer como princípios orientadores do PTP:

a) O suporte e a remuneração da transformação da paisagem de longo prazo, através de um processo participado de base local que reforce a cultura territorial e a capacidade dos atores do território;

b) A adoção de políticas públicas de natureza ambiental que alinhem os interesses da sociedade e das gerações futuras com os dos proprietários e gestores da terra, de modo a promover uma maior justiça interterritorial e intergeracional, garantido a devida valorização da propriedade rural e a promoção da gestão sustentável;

c) A aplicação à propriedade rústica de uma gestão sustentável como pilar do ordenamento do território rural, viabilizando-a nos territórios de minifúndio através da sua valorização produtiva e do reconhecimento e compensação das externalidades positivas;

d) A defesa do interesse público na assunção da gestão dos prédios rústicos não geridos e sem dono conhecido, designadamente no que se refere à execução das ações de defesa da floresta contra incêndios e prevenção de riscos bióticos (pragas e doenças) e abióticos (outras catástrofes);

e) O acompanhamento próximo dos projetos e boa monitorização e avaliação de resultados em função de metas e objetivos estabelecidos, baseados em indicadores de eficiência e eficácia económicas e sustentabilidade territorial;

f) A definição de modelos de intervenção expeditos e flexíveis, em particular no pós-fogo de modo a acionar, no imediato e in loco, as ações necessárias à estabilização de emergência.

6 - Determinar que o PTP integra as seguintes medidas programáticas de intervenção:

a) Programas de Reordenamento e Gestão da Paisagem (PRGP), destinados a promover o desenho da paisagem como referencial de uma nova economia dos territórios rurais, que promova uma floresta multifuncional, biodiversa e resiliente, mais rentável, com maior capacidade de sequestro de carbono e capaz de produzir melhores serviços a partir dos ecossistemas, conforme o anexo i à presente resolução e da qual faz parte integrante;

b) Áreas Integradas de Gestão da Paisagem, que definem um modelo...

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