Parecer n.º 12/2018

Data de publicação28 Maio 2018
SeçãoSerie II
ÓrgãoEducação - Conselho Nacional de Educação

Parecer n.º 12/2018

Parecer sobre o Regime Jurídico de Graus e Diplomas do Ensino Superior

Preâmbulo

No uso das competências que por lei lhe são conferidas e nos termos regimentais, após apreciação do projeto de Parecer elaborado pelos relatores Ana Maria Leal Faria, Manuel José Damásio e Pedro Dominguinhos o Conselho Nacional de Educação, em reunião plenária de

7 de maio de 2018, deliberou aprovar o referido projeto, emitindo assim o seu sexto Parecer do ano de 2018.

O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) solicitou ao Conselho Nacional de Educação (CNE) um Parecer sobre a Proposta de decreto-lei que altera o regime jurídico dos graus e diplomas do Ensino Superior - Decreto-Lei n.º 38/2018. A iniciativa legislativa em apreço é a quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de março, alterado pelos Decretos-Leis n.os 107/2008, de 25 de junho, n.º 230/2009, de 14 de setembro, n.º 115/2013, de 7 de agosto, e n.º 63/2016, de 13 de setembro, que aprova o regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior. A proposta submetida ao Conselho Nacional de Educação, para parecer, possui um conjunto de alterações, das quais se destacam:

i) Reforço das condições de acreditação dos cursos no que concerne à percentagem de docentes de carreira, com introdução deste conceito no enquadramento legal do ensino superior;

ii) Alteração genérica em todos os ciclos de formação, seja no ensino universitário, seja no ensino politécnico, dos rácios exigidos para efeitos de acreditação de um ciclo de estudos;

iii) Eliminação do conceito de especialista de reconhecido mérito profissional;

iv) Ampliação da possibilidade de redução da duração do ciclo de estudos conducente ao grau de mestre;

v) Limitação dos Mestrados Integrados a situações em que existam diretivas europeias em termos de acreditação profissional;

vi) Alargamento da atribuição do grau de doutor a todas as instituições de ensino superior (IES), sem distinção entre ensino universitário e ensino politécnico.

vii) Reformulação e alargamento do conceito de "investigação" em linha com as orientações internacionais dominantes;

viii) Alargamento, em função da alteração anterior, das exigências em termos de desenvolvimento de atividades de I&D a todos os ciclos de estudo, com especificação de exigências distintas consoante o seu nível;

ix) Exigência de ligação a unidades de I&D acreditadas pela FCT com a classificação de "Muito Bom" ou "Excelente" para acreditação dos doutoramentos, bem como definição da percentagem de docentes integrados nessas unidades de I&D;

x) Reforço dos ambientes de investigação associados aos doutoramentos, ao mesmo tempo que se limita a existência de componente curricular, devendo esta constituir-se como exceção;

xi) Definição de regulamentação para autorização de ciclos de estudo a funcionar no estrangeiro.

A proposta de alteração do decreto-lei relativo à definição de Graus e Diplomas pretende corporizar, de acordo com o MCTES, as sugestões e conclusões contidas no Relatório da OCDE aos Sistemas de I&D, Inovação e Ensino Superior em Portugal, apresentadas publicamente no dia 9 de fevereiro de 2018, no sentido de modernizar o sistema de ensino superior e contribuir para o seu desenvolvimento.

Neste contexto, importa ponderar a estratégia que preside à produção das iniciativas em análise, nomeadamente por via da aferição da capacidade de as alterações propostas poderem vir a contribuir efetivamente para a modernização do sistema de ensino superior, seja por via da diversificação das ofertas formativas, seja por via do aprofundamento das missões do ensino universitário e politécnico, quer ainda pela potenciação da atuação em rede das instituições.

O ensino superior e as atividades de investigação não cessaram de se complexificar ao longo das últimas décadas, resultando, hoje, num conjunto de dimensões e realidades diversificadas, que dedicam uma cada vez maior atenção, nomeadamente em função do seu grau de internacionalização, a questões como os critérios de exigência dos sistemas de ensino superior, a qualificação dos seus recursos humanos, e a transferência e produção de conhecimento como consequência de atividades de I&D. Exemplos do reconhecimento deste quadro são a Resolução n.º 78/2016 do Conselho de Ministros, dedicada à valorização da internacionalização e da investigação científica em Portugal, ou estudos recentes sobre a modernização do ensino superior, como é o caso do relatório da Comissão Europeia/EACEA/Eurydice, "A Modernização do Ensino Superior na Europa: Pessoal Académico" - 2017 (1).

A iniciativa legislativa de que resultou a proposta de Decreto-Lei n.º 38/2018 insere-se por isso numa linha de continuidade da legislação anterior relativa ao regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior que, desde 2006, vem tentando consolidar no País os objetivos genéricos originalmente definidos no âmbito do processo de Bolonha. Tal como em 2007, também agora esta iniciativa legislativa é enquadrada por um relatório da OCDE, "Review of the Tertiary Education, Research and Innovation System in Portugal" (2), da qual se destaca, em síntese, a recomendação da necessidade de se promoverem diversas medidas que tenham como objetivo - após uma consulta em larga escala que envolva todos os intervenientes no sistema - a produção de uma nova estratégia nacional para o conhecimento e inovação de que possa resultar um quadro estável de prioridades e a definição de um modelo sustentável de governação.

O Parecer começa por questionar o caráter avulso de algumas das medidas propostas e a sua falta de enquadramento numa revisão mais vasta da Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) e do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), bem como dos regulamentos e estatutos da própria Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), como aliás recomenda a própria OCDE. Sugere-se, pois, a cuidada ponderação da necessidade de articular a reforma agora proposta com outras alterações legislativas e de promover uma reforma institucional da FCT que lhe garanta a necessária independência, que aumente a sua capacidade operacional e que reduza o grau de burocratização atual.

Recomenda-se, também, que se repense o caráter demasiado regulador e eventualmente prejudicial para o sistema de algumas das medidas propostas, e que se oriente a reforma para um aprofundamento da autonomia das IES e não para a promulgação de medidas que a cerceiam, pois, a proposta de decreto-lei em apreço dá conta de um redireccionamento das linhas orientadoras das políticas de ensino superior em Portugal no sentido de restringir fortemente a sua autonomia, sobretudo do ponto de vista pedagógico e científico.

Finalmente, questiona-se a proposta de norma transitória, por ser manifestamente ambiciosa. Considera-se demasiado curto o quadro temporal proposto para implementação da legislação, com riscos de enorme perturbação do sistema e da estabilidade desejável do funcionamento das instituições. Aconselha-se, por isso, a adoção de um período e modelo de transição mais longo.

Tecidas estas considerações gerais, far-se-á uma análise dos aspetos particulares da proposta legislativa que parecem merecer maior atenção.

i) Do reforço da exigência de estabilidade do corpo docente para efeitos de acreditação dos diplomas e ciclos de estudo

Entende-se como adequada a exigência da qualificação do corpo docente, nomeadamente para efeitos de acreditação dos ciclos de estudo, bem como a procura da estabilidade do mesmo, medida pela percentagem dos docentes de carreira afetos à atividade de uma IES. Esta é, por um lado, uma questão de dignificação das relações laborais, e por outro, uma resposta à expectativa de que um corpo docente mais estável consiga cumprir com melhores resultados as funções que lhe são confiadas e, desta forma, potenciar a missão das IES junto da sociedade. Importa, no entanto, referir algumas situações que devem merecer reflexão adicional e eventuais alterações:

a) O diploma em análise não prevê um período transitório para os ciclos de estudo em funcionamento. Sabe-se que foi iniciado este ano o próximo ciclo de avaliação promovido pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES). Concordando-se com a filosofia, entende-se que se deve definir um período para adaptação das instituições, que pode coincidir com o segundo ciclo de avaliação promovido pela A3ES, para que as percentagens de docentes de carreira sejam alcançadas;

b) Se é clara a existência de uma carreira docente devidamente consolidada no ensino superior público que possibilitará a implementação do definido na alínea k) do artigo 3.º da proposta legislativa, tal situação não se verifica no ensino particular e cooperativo. De facto, hoje não existe ainda um estatuto específico de carreira para os docentes e investigadores deste subsetor, embora tal esteja previsto há vários anos. Assim, eventuais definições como as agora propostas, só poderiam ser determinadas por acordo a estabelecer entre os sujeitos de uma relação laboral. Para procurar enquadrar a questão, invoca-se no texto preambular da proposta de decreto-lei, o artigo 52.º da Lei n.º 62/2007, que aprovou o RJIES. A norma programática, inserida nessa legislação, estabelece que "aos docentes do ensino superior privado deve ser assegurada uma carreira paralela à dos docentes do ensino superior público". A questão é que uma carreira paralela não significa que seja aplicável ao pessoal docente do ensino privado o Estatuto da Carreira Docente Universitária, nem o Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Politécnico - ambos pensados e com âmbito de aplicação limitado aos docentes com o estatuto de trabalhadores em funções públicas. Face ao exposto, recomenda-se o acautelar desta questão por via da previsão da situação de excecionalidade do caso mencionado e consequente criação de condições para a produção da necessária legislação.

c) O relatório da OCDE, as práticas internacionais e os estatutos da carreira docente universitária e politécnica...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT