Acórdão n.º 868/96, de 16 de Outubro de 1996

Acórdão n.º 868/96 - Processo n.º 613/92 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional: I - 1 - Um grupo de 24 deputados à Assembleia da República veio requerer, ao abrigo do disposto na alínea f) do n.º 2 do artigo 281.º (e não 218.º como, por evidente lapso, referem) da Constituição da República (CR), redacção da segunda revisão constitucional, e do n.º 1 do artigo 51.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, em sede de fiscalização abstracta sucessiva, a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, de um conjunto de normas da Lei n.º 30/92, de 20 de Outubro, cujo artigo único introduziu alterações à Lei n.º 65/77, de 26 de Agosto, relativa ao direito à greve.

Fundamentou o pedido nos termos seguintes: A Assembleia da República, na reunião plenária de 17 de Julho de 1992, concluiu o processo de discussão e votação do diploma que viria a constituir a Lei n.º 30/92, votando o respectivo texto na generalidade, na especialidade e em votação final global.

No entanto, confrontando a acta da sessão desse dia 17, publicada no Diário da Assembleia da República, 1.' série, n.º 91, de 18 imediato, observa-se que o texto não foi, na sua totalidade, votado na especialidade.

Com efeito, 'após ter sido votado na especialidade das alterações ao texto do artigo 5.º e votadas as propostas de eliminação, alteração e aditamento relativas ao artigo 8.º, não foi submetido a votação na especialidade o novo texto da alínea g) do n.º 2 e dos n.º 4, 5, 7, 8 e 9 do referido artigo 8.º (v. Diário da Assembleia da República, 1. série, n.º 91, de 18 de Julho de 1992, pp. 3008 e 3009)'.

Ora, nos termos do artigo 171.º, n.º 2, da CR, a votação dos projectos de lei e das propostas de lei 'compreende uma votação na generalidade, uma votação na especialidade e uma votação final global' e, por seu turno, o artigo 156.º, n.º 2, do Regimento da Assembleia da República explicita que 'a votação na especialidade versa sobre cada artigo, número ou alínea' (o texto regimental então vigente era o publicado no Diário da República, 1.' série-A, de 15 de Abril de 1991, conforme Resolução da Assembleia da República n.º 12/91. Salvo indicação em contrário, as subsequentes alusões ao Regimento entendem-se feitas a essa versão).

Obedecendo cada uma dessas votações a uma lógica distinta, segundo os requerentes, sufragando a opinião de J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira Constituição da República Portuguesa Anotada, anotação IV ao artigo 171. -, verifica-se que apenas foram aprovados na especialidade o artigo 5.º, as alíneas c) e d) do n.º 2 do artigo 8. e o n.º 6 deste artigo 8.º, tendo a votação final global recaído sobre estes números e alíneas, pelo que só estes deveriam ter sido incluídos na Lei n.º 30/92, sendo os restantes inexistentes, implicando a sua inclusão neste diploma uma inconstitucionalidade formal, por violação do artigo 171.º, n.º 2, da CR.

Por outro lado - acrescentam - a inconstitucionalidade formal, por vício de procedimento legislativo, das normas referidas afecta, de forma derivada ou reflexa, 'outras normas do artigo único da Lei n.º 30/92, em face do princípio da precisão ou determinabilidade das leis'.

A concluir, requerem 'a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas da Lei n.º 30/92, de 20 de Outubro, artigo único, alterações ao artigo 8.º, n.º 2, alínea g), e n.º 4, 5, 7, 8 e 9, por violação do artigo 171.º, n.º 2, da Constituição da República, e das restantes normas que, face ao princípio da precisão ou da determinabilidade das leis, não possam subsistir por força dessa declaração de inconstitucionalidade'.

Juntaram um exemplar do citado n.º 91 do Diário da Assembleia da República, aprovado em sessão plenária de 22 de Outubro de 1992.

2 - Face ao despacho do Ex. Conselheiro Presidente que, invocando o disposto no artigo 51.º, n.º 1, da Lei n.º 28/82, ordenou a notificação do primeiro dos deputados requerentes convidando, de acordo com o n.º 3 do mesmo preceito, à precisa identificação e delimitação - à 'especificação' - das normas cuja apreciação se requer, considerando a submissão dos processo de fiscalização abstracta da constitucionalidade de normas a um estrito 'princípio do pedido', no tocante à delimitação do objecto do pedido, veio este a ser reformulado, requerendo-se nos seguintes termos: 'a) A declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas da Lei n.º 30/92, de 20 de Outubro, artigo único, alterações ao artigo 8.º, n.º 2, alínea g), e n.º 4, 5, 7, 8 e 9, por violação do artigo 171.º, n.º 2, da Constituição da República; b) A declaração da inconstitucionalidade consequente do artigo 8.º, n.º 6, da Lei n.º 30/92, de 20 de Outubro, que, face ao princípio da precisão ou da determinabilidade das leis, não poderá subsistir por via da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas acima referidas.' 3 - Notificado para responder, o Presidente da Assembleia da República veio oferecer o merecimento dos autos.

Juntou à resposta os Diário da Assembleia da República relativos à discussão e aprovação da Lei n.º 30/92, bem como o referente à reunião da Comissão Permanente em que foi abordada a questão do 'processo de envio para promulgação do decreto n.º 29/VI, de 8 de Agosto de 1992 (alteração da Lei n.º 65/77, de 26 de Agosto - lei da greve)'.

4 - A Lei n.º 30/92, decretada pela Assembleia da República ao abrigo dos artigos 164.º, alínea d), 168.º, n.º 1, alínea b), e 169.º, n.º 3, da CR, introduziu alterações, no seu artigo único, aos artigos 5.º e 8.º da Lei n.º 65/77, de 26 de Agosto, conhecida por lei da greve.

No que ao artigo 8. respeita - pois não interessa reter o artigo 5.º - a Lei n.º 30/92 alterou-lhe o disposto nos n.º 2, alíneas c), d) e g), e 4 e, bem assim, aditou-lhe os n.º 5 a 9, inclusive, de modo que o novo texto desse preceito passou a ser o seguinte: 'Artigo 8.º Obrigações durante a greve 1 - ...................................................................................................................

2 - ...................................................................................................................

  1. ....................................................................................................................

  2. ....................................................................................................................

  3. Salubridade pública, incluindo a realização de funerais; d) Serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis; e) ....................................................................................................................

  4. .....................................................................................................................

  5. Transportes, incluindo portos, aeroportos, estações de caminho de ferro e de camionagem, relativos a passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis e a bens essenciais à economia nacional, abrangendo as respectivas cargas e descargas.

3 - ...................................................................................................................

4 - Os serviços mínimos previstos no n.º 1 podem ser definidos por convenção colectiva ou por acordo com os representantes dos trabalhadores.

5 - Não havendo acordo anterior ao pré-aviso quanto à definição dos serviços mínimos previstos no n.º 1, o Ministério do Emprego e da Segurança Social convoca os representantes dos trabalhadores referidos no artigo 3. e os representantes dos empregadores, tendo em vista a negociação de um acordo quanto aos serviços mínimos e quanto aos meios necessários para os assegurar.

6 - Na falta de acordo até ao termo do 5.º dia posterior ao pré-aviso de greve, a definição dos serviços e dos meios referidos no número anterior é estabelecida por despacho conjunto, devidamente fundamentado, do Ministro do Emprego e da Segurança Social e do ministro responsável pelo sector de actividade, com observância dos princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.

7 - O despacho previsto no número anterior produz efeitos imediatamente após a sua notificação aos representantes referidos no n.º 5 e deve ser afixado nas instalações da empresa ou estabelecimento, nos locais habitualmente destinados à informação dos trabalhadores.

8 - Os representantes dos trabalhadores a que se refere o artigo 3.º devem designar os trabalhadores que ficam adstritos à prestação dos serviços referidos nos n.º 1 e 3, até quarenta e oito horas antes do início do período de greve, e, se não o fizerem, deve a entidade empregadora proceder a essa designação.

9 - No caso de incumprimento das obrigações previstas nos n.º 1, 3 e 8, pode o Governo determinar a requisição ou mobilização, nos termos da lei aplicável.' Segundo os requerentes, o procedimento legislativo adoptado apenas teria sido integralmente cumprido no respeitante ao artigo 8.º, n.º 2, alíneas c) e d), e 6 (além do artigo 5.º): no tocante à alínea g) do n.º 2 e aos n.º 4, 5, 7, 8 e 9 desse artigo 8.º teria sido emitida a sua votação na especialidade sobre esses números e alínea, não tendo recaído, em consequência, votação final global.

5 - Cumpre, assim, apreciar e decidir da regularidade formal do procedimento eventualmente violador do disposto no artigo 171.º, n.º 2, da CR e gerador de inconstitucionalidade formal.

E, posteriormente - se esse for o caso -, analisar se o n.º 6 do artigo 8.º sofre reflexamente a mesma sorte.

II - 1 - Em tempo oportuno, o Presidente da República requereu a este Tribunal, em sede de...

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