Acórdão n.º 405/2003, de 15 de Outubro de 2003

Acórdão n.º 405/2003 Processo n.º 598/02 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional: I - Relatório. - 1 - O Provedor de Justiça, no uso da competência prevista no artigo 281.º, n.º 2, alínea d), da Constituição da República Portuguesa (CRP), requereu ao Tribunal Constitucional que fosse apreciada e declarada, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade constante dos artigos 13.º, n.º 1, 59.º, n.º 1, alínea a), da CRP, das normas resultantes da conjugação dos artigos 16.º, alínea b), 85.º, n.º 1, e 86.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 564/99, de 21 de Dezembro, com o constante do anexo II a este diploma, 'na medida em que permitem a inversão de posições remuneratórias'.

O Decreto-Lei n.º 564/99, que estabelece o estatuto legal da carreira de técnico de diagnóstico e terapêutica, dispõe nas normas questionadas: Artigo 16.º Escalão de promoção Na promoção à categoria superior, a integração na respectiva escala indiciária faz-se nos termos seguintes: a) .....................................................................................................................

  1. Para o escalão a que na escala indiciária da categoria para a qual se faz a promoção corresponda o índice superior mais aproximado, se vier já auferindo remuneração igual ou superior à do escalão 1, ou para o escalão seguinte, sempre que a remuneração que caberia em caso de progressão na categoria de origem fosse superior.

    Artigo 85.º Transição 1 - Os técnicos de diagnóstico e terapêutica transitam na categoria e no escalão actualmente detidos, com excepção do disposto no número seguinte.

    2 - ....................................................................................................................

    Artigo 86.º Aplicação dos novos escalões indiciários 1 - As escalas indiciárias a que se refere o n.º 2 do artigo 4.º vigoram de acordo com o faseamento previsto nos mapas I a III do anexo II do presente diploma.

    2 - ....................................................................................................................

    ANEXO II MAPA I Tabelas a aplicar entre 1 de Janeiro e 30 de Junho de 1999 (ver tabela no documento original) MAPA II Tabelas a aplicar entre 1 de Julho de 1999 e 30 de Junho de 2000 (ver tabela no documento original) MAPA III Tabelas a aplicar a partir de 1 de Julho de 2000 (ver tabela no documento original) São os seguintes os fundamentos do pedido: '1.º O Decreto-Lei n.º 564/99, de 21 de Dezembro, veio definir o estatuto da carreira dos técnicos de diagnóstico e terapêutica, no seguimento do Decreto-Lei n.º 203/90, de 20 de Junho, que procedeu à aplicação aos mesmos do novo sistema retributivo.

    1. No seu artigo 4.º, n.º 1, sob a epígrafe de 'Estrutura da carreira', são criadas na carreira de técnico de diagnóstico e terapêutica as categorias de técnico de 2.' classe, técnico de 1.' classe, técnico principal, técnico especialista e técnico especialista de 1.' classe.

    2. O n.º 2 do mesmo artigo 4.º determina que as escalas indiciárias, correspondentes às categorias anteriormente enunciadas, constam do anexo I, o qual constitui parte integrante do diploma em questão.

    3. O artigo 6.º, n.º 2, define de forma genérica, nas diversas alíneas que o compõem, o conteúdo funcional da carreira de técnico de diagnóstico e terapêutica.

    4. Por sua vez, o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 564/99 determina quais as competências desenvolvidas no âmbito das várias categorias que a enformam e com base nas quais a mesma se estrutura, resultando como principal factor de diferenciação entre estas a natureza e complexidade das actividades em causa.

    5. A matéria relativa ao ingresso, acesso e progressão na carreira de técnico de diagnóstico e terapêutica surge regulada nas disposições constantes do capítulo III do diploma em análise, nomeadamente no que respeita ao acesso, escalão de integração após promoção e progressão, nos artigos 15.º, 16.º e 17.º,respectivamente.

    6. Da letra do artigo 15.º resulta que o acesso às diferentes categorias que estruturam a presente carreira se faz mediante concurso de avaliação curricular de entre técnicos pertencentes a categoria imediatamente anterior com um mínimo de três anos de exercício de funções na mesma e avaliação de desempenho de Satisfaz.

    7. Por sua vez, o artigo 16.º, alínea b), em complementaridade com o anteriormente prescrito, determina que à promoção, operada nos termos já estabelecidos, corresponderá a concomitante integração na respectiva escala indiciária, através da entrada para o 'escalão a que na escala indiciária da categoria para a qual se faz a promoção corresponda o índice superior mais aproximado, se vier já auferindo remuneração igual ou superior à do escalão 1, ou para o escalão seguinte, sempre que a remuneração que caberia em caso de progressão na categoria de origem fosse superior'.

    8. Por seu turno, o artigo 17.º prescreve, como regra geral a observar nesta matéria, que a progressão se processa por módulos de três anos em cada categoria, com avaliação de desempenho de Satisfaz, realçando-se assim a importância de que se reveste o tempo de serviço prestado para esse efeito.

    9. Em sede de disposições finais e transitórias, prevê o artigo 85.º, n.º 1, que, em virtude da entrada em vigor do diploma em apreço, os técnicos de diagnóstico e terapêutica transitariam na categoria e escalão que detivessem àqueladata.

    10. Por seu turno, o artigo 86.º, n.º 1, do mesmo diploma prevê que, relativamente à aplicação dos novos escalões indiciários, as escalas constantes do anexo I, correspondentes às categorias que compõem esta carreira, seriam aplicadas de acordo com um plano de faseamento definido nos mapas I a III do anexo II.

    11. Da análise das tabelas salariais anexas ao mesmo diploma resulta a existência de sobreposição dos índices dos vários escalões nas categorias, registando-se em categorias inferiores índices superiores aos dos escalões das categorias superiores.

    12. Tal facto, conjugado com os preceitos oportunamente referidos, nomeadamente o n.º 2 do artigo 16.º, e com o facto de haver funcionários promovidos em categoria superior ao abrigo do Decreto-Lei n.º 203/90, de 20 de Junho, cuja escala indiciária é diferente da aplicada a propósito do diploma em análise, leva a que, na aplicação deste diploma, se atribua escalão mais alto aos trabalhadores que foram promovidos nessa mesma categoria mais tarde (já após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 564/99), resultando do facto de terem alcançado um escalão mais alto na categoria anterior com a reformulação por este operada na estrutura remuneratória indiciária.

    13. Da aplicação da solução legal dada nestes termos resulta que, em determinadas situações, ocorrerá uma inversão de posições relativas detidas por funcionários de uma mesma categoria, no âmbito da mesma carreira.

    14. Na realidade, em virtude da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 564/99 e do plano de faseamento a este anexo, criaram-se situações de injustiça relativa, traduzidas no facto de técnicos de diagnóstico e terapêutica com maior antiguidade na categoria de técnicos de 1.' classe auferirem menor remuneração relativamente a outros com menor antiguidade e idênticas qualificações.

    15. De acordo com o disposto no artigo 14.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, reconhece-se ser o juízo de equidade interna um dos princípios estruturantes do sistema retributivo da função pública, cujo principal objectivo se centrará em 'salvaguardar a relação de proporcionalidade entre as responsabilidades de cada cargo e as correspondentes remunerações e, bem assim, garantir a harmonia remuneratória entre cargos no âmbito da Administração'.

    16. Ao permitir-se a inversão de posições nos termos que antecedem estar-se-á, desde logo, a violar o citado princípio, promovendo-se a desarmonia remuneratória entre funcionários dentro de uma mesma categoria.

    17. Por seu turno, o princípio da igualdade, vertido no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, exige positivamente um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de factodiversas.

    18. Determina o referido comando constitucional que o princípio da igualdade seja visto sob a perspectiva de uma igualdade material, em detrimento de um juízo de igualdade formalmente traçado (cf. Miranda, Jorge, Manual de Direito Constitucional, vol. IV, pp. 226-227; Canotilho, Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 3.' ed., p. 400).

    19. Deste modo, impõe-se que seja dado tratamento desigual a situações desiguais, mas substancial e objectivamente desiguais, ou seja, impostas pela desigualdade das circunstâncias ou pela natureza das coisas, violando-se este comando quando a solução dada pelo legislador surja como arbitrária ao tratar igualmente o que é desigual ou tratando desigualmente o que é igual (cf.

      Miranda, Jorge, loc. cit., pp. 226-228; Canotilho, Gomes, loc. cit.).

    20. O artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da lei fundamental, ao concretizar o princípio da igualdade, no âmbito da relação jurídico-laboral, determina que 'para trabalho igual salário igual', considerando que a trabalho igual em quantidade, natureza e qualidade deverá corresponder igual retribuição.

    21. De igual modo determina este princípio que a trabalho desigual deverá corresponder salário distinto, definindo ele próprio o factor que permite diferenciações remuneratórias não arbitrárias (cf. Canotilho, Gomes/Moreira, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.' ed., p. 319).

    22. À luz do normativo constitucional invocado teremos que, com a presente situação, os técnicos de diagnóstico e terapêutica há mais anos na categoria de técnico de 1.' classe recebem, de facto, salário diferente (inferior) daqueles funcionários que desempenhem as referidas funções há menos tempo.

    23. Não se suscitando qualquer critério materialmente acolhido na Constituição que fundamente essa diferenciação, não parece razoável aceitar tal solução normativa, pondo em causa o princípio da...

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