Jurisprudência n.º 1/2001, de 05 de Janeiro de 2001

Jurisprudência n.º 1/2001 Revista Ampliada n.º 943/99 - 1.' Secção Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: No Tribunal Judicial da comarca da Nazaré, em autos de reclamação de créditos a correr por apenso ao processo de falência em que foi declarada falida a sociedade por quotas Porcelanas Vítor e Silva, Lda., foi reclamado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional um crédito de 13 742 500$00, correspondente à parte não reembolsada de um apoio financeiro reembolsável por ele concedido em 1988 à falida no âmbito do Programa ILE (Iniciativa Local de Emprego) - ao abrigo do Despacho Normativo n.º 46/86, de 4 de Junho -, montante esse ao qual acresciam juros de mora no valor de 4 747 752$00.

Este crédito, tal como os restantes créditos reclamados por outros credores, foi considerado verificado no despacho saneador, aí se tendo procedido à graduação de todos pela forma seguinte: 1.º Os créditos dos trabalhadores, por, de acordo com o artigo 12.º da Lei n.º 17/86, de 14 de Junho, e o artigo 737.º, n.º 1, alínea d), do CC, gozarem de privilégio imobiliário geral e mobiliário geral; 2.º Todos os restantes créditos rateadamente, por terem sido havidos como comuns, sendo dado o esclarecimento de que os créditos da segurança social e do Estado passaram a ter essa natureza por força do artigo 152.º do CPEREF, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril.

Houve apelação do IEFP, que a Relação de Coimbra julgou improcedente.

Deste acórdão trouxe o IEFP a este STJ o presente recurso de revista em que, alegando a pedir a graduação do seu crédito em primeiro lugar e antes dos créditos dos trabalhadores, e dizendo terem sido violados o artigo 152.º do CPEREF e, ainda, o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 437/78, de 28 de Dezembro, formulou conclusões com o seguinte conteúdo: '1 - O regime previsto no artigo 152.º do CPEREF não se aplica ao IEFP; 2 - O sentido daquela norma é o de extinguir os privilégios creditórios do Estado em sentido restrito, enquanto representado pelo Governo, das autarquias locais e das instituições de segurança social, sendo que o IEFP continua a gozar dos respectivos privilégios na reclamação de créditos contra as empresas devedoras, após a declaração de falência; 3 - A não ser assim, não faria sentido aparecerem autonomizadas no citado artigo, a par do Estado, as autarquias locais e, principalmente, as instituições de segurança social, que, à semelhança do IEFP, são também entidades que gozam de personalidade jurídica de direito público, com autonomia administrativa e financeira e património próprio, ou seja, em tudo iguais ao IEFP; 4 - Aliás, tanto assim é que o próprio legislador do CPEREF, noutros preceitos do diploma, como os artigos 22.º, n.º 1, e 62.º, n.º 2, se refere distintamente a Estado, a institutos públicos e a instituições de segurança social enquanto entidades públicas titulares de créditos privilegiados, mas intencionamente não fez o mesmo no artigo 152.º; 5 - De resto, outra solução não seria de esperar face à especificidade dos créditos do IEFP, isto é, resultando tais créditos da atribuição de apoios financeiros concedidos para efeitos de criação e manutenção de postos de trabalho bem como para formação profissional, o tratamento a dar-lhes teria que ser, obviamente, diferente; 6 - E, além disso, sintomático da correcção do entendimento que perfilhamos, temos o facto de o legislador do Decreto-Lei n.º 315/98, de 20 de Outubro, vir agora dar nova redacção ao artigo 152.º mas manter inalterada a referência aos entes públicos que perdem os privilégios creditórios com a declaração de falência, não incluindo ou não se referindo, como o faz noutros preceitos, aos 'institutospúblicos'; 7 - Em suma, o IEFP continua a gozar, após a declaração de falência e para efeito de graduação de créditos, dos privilégios creditórios previstos no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 437/78, de 28 de Dezembro; 8 - Efectivamente, conforme dispõe o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 437/78, os créditos resultantes dos apoios financeiros concedidos no âmbito da promoção do emprego e da formação profissional - como é o caso dos autos gozam de garantias especiais, isto é, do privilégio mobiliário geral sobre os bens móveis do devedor, graduando-se logo após os créditos referidos na alínea a) do artigo 747.º do CC e gozam ainda do privilégio imobiliário sobre os bens imóveis de devedor, graduando-se logo após os créditos referidos no artigo 748.º do CC.' Houve resposta do Ministério Público junto da Relação de Coimbra, que se manifestou no sentido da procedência do recurso - opinião que neste STJ foi secundada pelo Sr. Procurador-Geral-Adjunto.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Está assente, por virtude da verificação de créditos a que se procedeu no despacho saneador e contra a qual não houve reacção, a existência de um crédito do recorrente sobre a falida com o montante e origem acima descritos, de créditos da segurança social provenientes de contribuições não liquidadas e respectivos juros, de quatro créditos do Estado por custas, de três créditos de que são titulares fornecedores de mercadorias, de um crédito dos Serviços Municipalizados da Nazaré por fornecimento de água e, finalmente, de diversos créditos dos trabalhadores emergentes da cessação dos seus contratos de trabalho.

Estes últimos foram, nas instâncias, tidos como beneficiados, nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 17/86, de 14 de Junho, por privilégio mobiliário geral e por privilégio imobiliário geral, respectivamente, e graduados em primeiro lugar por força do disposto nesse artigo e no artigo 737.º, n.º 1, alínea d), do CC.

O reconhecimento de que os créditos dos trabalhadores aqui em causa beneficiam de ambos estes privilégios não vem discutido, sendo, em todo o caso, de dizer que esses privilégios resultam, em termos inequívocos, do disposto no n.º 1 do mencionado artigo 12.º, o que conduz ao seu pagamento preferencial face a todos os créditos não privilegiados ou com privilégio com menor força que, tendo a falida como devedora, foram também verificados.

No entanto, é de assinalar o seguinte.

Ao referir-se, como se referiu, a existência de créditos dos trabalhadores com privilégio mobiliário geral e com privilégio imobiliário geral e ao fazer-se a sua graduação em primeiro lugar por força do disposto nesse artigo e no artigo 737.º, n.º 1, alínea d), do CC cometeu-se uma imprecisão, já que este último normativo apenas respeitaria ao primeiro destes privilégios, sendo que a graduação do privilégio imobiliário haveria que ser feita com referência aos créditos referidos no artigo 748.º do CC e antes destes - tudo por força das alíneas a) e b) do n.º 3 do referido artigo 12.º Fica-se sem se saber se tal se deveu ao conhecimento, que não temos, de só estarem em causa bens móveis da falida - caso em que terá sido inútil a referência ao privilégio imobiliário -, ou a erro de aplicação de direito.

Sempre se poderá, se for caso disso, decidir a final tendo em atenção esta distinção de regimes legais.

A questão que vem submetida à nossa consideração reside em saber se o crédito do recorrente goza de privilégios creditórios aqui subsistentes e invocáveis e que impliquem a sua graduação à frente dos créditos dos trabalhadores - opinião defendida pelo recorrente -, ou se, pelo contrário, tal crédito reveste aqui a natureza de crédito comum - tese defendida no acórdão recorrido.

O recorrente é um...

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