Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro de 2007
Lei n.o 2/2007
de 15 de Janeiro
Aprova a Lei das Finanças Locais, revogando a Lei n.o 42/98, de 6 de Agosto
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.o da Constituiçáo, o seguinte:
TÍTULO I Objecto e princípios fundamentais
Artigo 1.o Objecto
1 - A presente lei estabelece o regime financeiro dos municípios e das freguesias.
2 - Os princípios previstos no presente título sáo aplicáveis às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, na medida em que se mostrem compatíveis com a natureza destas, sendo o seu regime financeiro específico estabelecido em diploma próprio.
Artigo 2.o
Princípio da coerência
O regime financeiro dos municípios e das freguesias respeita o princípio da coerência com o quadro de atribuiçóes e competências que legalmente lhes está come-tido, designadamente ao prever regras que visam assegurar o adequado financiamento de novas atribuiçóes e competências.
Artigo 3.o
Princípio da autonomia financeira dos municípios e das freguesias
1 - Os municípios e as freguesias têm património e finanças próprios, cuja gestáo compete aos respectivos órgáos.
2 - A autonomia financeira dos municípios e das freguesias assenta, designadamente, nos seguintes poderes dos seus órgáos:
a) Elaborar, aprovar e modificar as opçóes do plano, orçamentos e outros documentos previsionais; b) Elaborar e aprovar os documentos de prestaçáo de contas; c) Exercer os poderes tributários que legalmente lhes estejam cometidos; d) Arrecadar e dispor de receitas que por lei lhes sejam destinadas; e) Ordenar e processar as despesas legalmente autorizadas;
f) Gerir o seu próprio património, bem como aquele que lhes seja afecto.
3 - Sáo nulas as deliberaçóes de qualquer órgáo dos municípios e freguesias que envolvam o exercício de poderes tributários ou determinem o lançamento de taxas náo previstas na lei.
4 - Sáo igualmente nulas as deliberaçóes de qualquer órgáo dos municípios e freguesias que determinem ou autorizem a realizaçáo de despesas náo permitidas por lei.
Artigo 4.o
Princípios e regras orçamentais
1 - Os municípios e as freguesias estáo sujeitos às normas consagradas na Lei de Enquadramento Orça-mental e aos princípios e regras orçamentais e de estabilidade orçamental.
2 - O princípio da náo consignaçáo náo se aplica às receitas provenientes de fundos comunitários e do fundo social municipal, previsto nos artigos 24.o e 28.o, às receitas dos preços referidos no n.o 3 do artigo 16.o, às receitas provenientes dos empréstimos a médio e longo prazos para aplicaçáo em investimentos, bem como às provenientes da cooperaçáo técnica e financeira e outras previstas na lei.
3 - O princípio da equidade intergeracional, relativo à distribuiçáo de benefícios e custos entre geraçóes, implica a apreciaçáo nesse plano da incidência orça-mental:
a) Das medidas e acçóes incluídas no plano plurianual de investimentos; b) Do investimento em capacitaçáo humana co-financiado pela autarquia local; c) Dos encargos com os passivos financeiros da autarquia local; d) Das necessidades de financiamento do sector empresarial local, bem como das associaçóes de municípios; e) Dos encargos vencidos e náo liquidados a fornecedores; f) Dos encargos explícitos e implícitos em parcerias público-privadas, concessóes e demais compromissos financeiros de carácter plurianual.
4 - Os municípios e as freguesias estáo também sujeitos, na aprovaçáo e execuçáo dos seus orçamentos, aos princípios da estabilidade orçamental, da solidariedade recíproca entre níveis de administraçáo e da transparência orçamental.
5 - O princípio da transparência orçamental traduz-se na existência de um dever de informaçáo mútuo entre o Estado e as autarquias locais, como garantia da estabilidade orçamental e da solidariedade recíproca, bem como no dever de estas prestarem aos cidadáos, de forma acessível e rigorosa, informaçáo sobre a sua situaçáo financeira.
6 - O princípio da transparência na aprovaçáo e execuçáo dos orçamentos dos municípios e das freguesias aplica-se igualmente à informaçáo financeira respeitante às associaçóes de municípios ou de freguesias, bem como às entidades que integram o sector empresarial local, concessóes municipais e parcerias público-privadas.
Artigo 5.o
Coordenaçáo das finanças locais com as finanças estaduais
1 - A coordenaçáo das finanças dos municípios e das freguesias com as finanças do Estado tem especialmente em conta o desenvolvimento equilibrado de todo o País e a necessidade de atingir os objectivos e metas orçamentais traçados no âmbito das políticas de convergência a que Portugal se tenha obrigado no seio da Uniáo Europeia.
2 - A coordenaçáo referida no número anterior efectua-se através do Conselho de Coordenaçáo Financeira do Sector Público Administrativo, sendo as autarquiaslocais ouvidas antes da preparaçáo do Programa de Estabilidade e Crescimento e da Lei do Orçamento do Estado, designadamente quanto à participaçáo das autarquias nos recursos públicos e ao montante global de endividamento autárquico.
3 - Tendo em vista assegurar a coordenaçáo efectiva entre as finanças do Estado e as finanças das autarquias locais, a Lei do Orçamento do Estado pode definir limites máximos ao endividamento municipal diferentes daqueles que se encontram estabelecidos na presente lei.
4 - A violaçáo do limite de endividamento líquido previsto para cada município no n.o 1 do artigo 37.o origina uma reduçáo no mesmo montante das transferências orçamentais devidas no ano subsequente pelo subsector Estado, o qual é afecto ao Fundo de Regularizaçáo Municipal, nos termos do artigo 42.o da presente lei.
Artigo 6.o
Promoçáo da sustentabilidade local
1 - O regime financeiro dos municípios e das freguesias deve contribuir para a promoçáo do desenvolvimento económico, para a preservaçáo do ambiente, para o ordenamento do território e para o bem-estar social.
2 - A promoçáo da sustentabilidade local é assegurada, designadamente:
a) Pela discriminaçáo positiva dos municípios com área afecta à Rede Natura 2000 e área protegida, no âmbito do Fundo Geral Municipal; b) Pela exclusáo das dívidas contraídas para desenvolvimento de actividades de reabilitaçáo urbana dos limites ao endividamento municipal; c) Pela concessáo de isençóes e benefícios fiscais, relativos a impostos a cuja receita os municípios têm direito, a contribuintes que prossigam as suas actividades de acordo com padróes de qualidade ambiental e urbanística; d) Pela utilizaçáo de instrumentos tributários orientados para a promoçáo de finalidades sociais e de qualidade urbanística, territorial e ambiental, designadamente taxas.
Artigo 7.o
Participaçáo das autarquias nos recursos públicos
1 - A participaçáo de cada autarquia local nos recur-sos públicos é determinada nos termos e de acordo com os critérios previstos na presente lei, visando o equilíbrio financeiro vertical e horizontal.
2 - O equilíbrio financeiro vertical visa adequar os recursos de cada nível de administraçáo às respectivas atribuiçóes e competências.
3 - O equilíbrio financeiro horizontal pretende pro-mover a correcçáo de desigualdades entre autarquias do mesmo grau resultantes, designadamente, de diferentes capacidades na arrecadaçáo de receitas ou de diferentes necessidades de despesa.
Artigo 8.o
Cooperaçáo técnica e financeira
1 - Náo sáo permitidas quaisquer formas de subsídios ou comparticipaçóes financeiras aos municípios e freguesias por parte do Estado, dos institutos públicos ou dos fundos autónomos.
2 - Pode, excepcionalmente, ser inscrita na Lei do Orçamento do Estado uma dotaçáo global afecta aos diversos ministérios, para financiamento de projectos de interesse nacional a desenvolver pelas autarquias locais, de grande relevância para o desenvolvimento regional e local, correspondentes a políticas identificadas como prioritárias naquela lei, de acordo com os princípios da igualdade, imparcialidade e justiça.
3 - O Governo e os Governos Regionais podem ainda tomar providências orçamentais necessárias à concessáo de auxílios financeiros às autarquias locais, nas seguintes situaçóes:
a) Calamidade pública; b) Municípios negativamente afectados por investimentos da responsabilidade da administraçáo central; c) Circunstâncias graves que afectem drasticamente a operacionalidade das infra-estruturas e dos serviços municipais de protecçáo civil; d) Reconversáo de áreas urbanas de génese ilegal ou programas de reabilitaçáo urbana quando o seu peso relativo transcenda a capacidade e a responsabilidade autárquica nos termos da lei.
4 - A concessáo de auxílios financeiros às autarquias locais em situaçóes de calamidade pública é regulada em diploma próprio, o qual deverá, designadamente, proceder à criaçáo do Fundo de Emergência Municipal.
5 - A concessáo de qualquer auxílio financeiro e a celebraçáo de contrato ou protocolo com as autarquias locais tem de ser previamente autorizada por despacho dos Ministros da tutela e das Finanças, publicado na
2.a série do 6 - Sáo nulos os instrumentos de cooperaçáo técnica e financeira e de auxílio financeiro celebrados ou executados sem que seja observado o disposto no número anterior.
7 - O Governo publica trimestralmente na 2.a série do os instrumentos de cooperaçáo técnica e financeira e de auxílio financeiro, celebrados por cada ministério, bem como os respectivos montantes e prazos.
8 - O regime de cooperaçáo técnica e financeira, bem como o regime de concessáo de auxílios financeiros às autarquias locais, sáo regulados por diploma próprio.
Artigo 9.o
Tutela inspectiva
A tutela sobre a gestáo patrimonial e financeira das autarquias locais abrange a sua administraçáo directa e indirecta e as entidades do sector empresarial local, é meramente inspectiva e só pode ser exercida segundo as formas e nos casos previstos na lei, salvaguardando sempre a democraticidade e a autonomia do poder local.
TÍTULO II Receitas das autarquias locais
CAPÍTULO I
Receitas dos municípios
Artigo 10.o
Receitas municipais
Constituem receitas dos municípios:
a) O produto da cobrança...
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