Acórdão n.º 250/2008, de 22 de Julho de 2008

Acórdáo n. 250/2008

Processo n. 546/07

Acordam na 3.ª Secçáo do Tribunal Constitucional

I - Relatório

1 - Nos presentes autos, em que é recorrente Cláudio da Silva Alves e recorrido o Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos e Bancários, o primeiro interpôs recurso do acórdáo do Tribunal da Relaçáo do Porto, nos termos da alínea b) do n. 1 do artigo 70. da LTC, com fundamento na inconstitucionalidade da dimensáo interpretativa das normas do artigo 170., n. 1, do Código de Processo do Trabalho, e do artigo 288., n. 3, do Código de Processo Civil, por ele aplicadas em violaçáo do disposto "no artigo 20., n. s 1 e 4, da Constituiçáo (direito de tutela efectiva, acesso à justiça e aos tribunais, e mediante processo equitativo)".

2 - Notificado para alegar, o recorrente apresentou as seguintes conclusóes:

"1.ª No acórdáo a quo foi interpretado o disposto no artigo 170.

n. 1 do CPT no sentido de que o direito de impugnaçáo judicial nele estabelecido só se verifica - ou a decisáo nele referida só é impugnável judicialmente - após ter sido confirmada por via de recurso, nos termos do artigo 47. do Estatutos do Réu. Dito de outro modo, a interpretaçáo dada ao preceito no sentido de que a decisáo nele referida só pode ser aquela que resulte confirmada se e quando o órgáo dito hierárquico, conforme aquela regra dos Estatutos, assim o entender.

  1. Tal recurso, contudo, náo se configura em si mesmo como obrigatório, náo estabelece efeito suspensivo para a execuçáo da decisáo

    impugnada, náo tem prazo para ser interposto, nem apresenta prazo para ser proferida a respectiva decisáo - o que tudo determina a efectiva possibilidade de estar totalmente cumprida a decisáo disciplinar assim atacada, antes de existir decisáo judicialmente impugnável (no sentido que o acórdáo recorrido deu ao artigo 170. n. 1 do CPT).

  2. Na pretensáo de tutela jurisdicional do A., negada pela interpretaçáo que a 1.ª instância e a Relaçáo expressaram quanto à dimensáo restritiva do artigo 170. n. 1 do CPT, estavam em causa, isto é, solicitava -se a defesa judicial para os direitos fundamentais de ser e manter -se membro de sindicato, e o direito à segurança social - conforme artigos 55. n. s 1 e 2 al. b), e 63. n. s 1 e 2 da CRP.

  3. Ora aquela interpretaçáo do artigo 170. n. 1 do CPT viola o disposto no artigo 20. n. s 1, 4 e 5 da CRP, enquanto preceitos de onde se retira o direito de acesso à tutela jurisdicional, em procedimento equitativo, sem desproporcionados entraves ou obstáculos de ordem processual, e de modo temporalmente adequado à defesa de direitos fundamentais.

  4. Acresce ainda que, num segundo momento decisório, o acórdáo recorrido interpreta o artigo 170. n. 1 do CPT, combinado com o disposto no artigo 288. n. 3 e artigo 663. n. 1 (este ex vi artigos 672.

    n. 1 e 713. n. 2 do CPC), no sentido de que o direito naquele conferido já náo pode ser utilizado, com vista a uma decisáo de mérito, mesmo que se mostre sanado o pressuposto processual dito como previamente exigível, e verificável a necessidade de tutela jurisdicional (dada a manutençáo da decisáo disciplinar, pela "sentença" dada no recurso do artigo 47. dos Estatutos da R.)

  5. Ou, por outras palavras, deve entender -se que o acórdáo recorrido interpreta os preceitos acabados de referir no sentido de que a falta do requisito náo pode ser sanada na pendência da acçáo prevista no dito artigo 170. n. 1 do CPT.

  6. Ora, ambos estes sentidos normativos, retirados daqueles preceitos, sáo violadores, isto é, sáo proibidos - face ao disposto em artigo 204. da CRP - perante a constitucionalizaçáo do direito de acesso à tutela jurisdicional e a uma decisáo com efectiva prevalência da apreciaçáo do fundo e mérito da causa, como artigo 20. n. s 1, 4 e 5 da CRP consagram, de modo a impedir que sob a capa de decisáo formal se efectue denegaçáo de justiça - como o A. náo tem dúvida em assacar à concepçáo normativa seguida no acórdáo em causa."

    3 - O recorrido contra -alegou concluindo que "náo houve qualquer denegaçáo da justiça, nem foram postos em causa dos direitos do Recorrente" e que náo se verificou qualquer interpretaçáo inconstitucional das normas aplicadas nos presentes autos.

    4 - Durante a fase de exame preliminar à prolaçáo do presente acórdáo, a Relatora detectou fundamentos passíveis de conduzir ao náo conhecimento parcial do objecto do recurso, pelo que proferiu o seguinte despacho, em 16 de Janeiro de 2008:

    "Nos termos do artigo 704. CPC, aplicável «ex vi» artigo 69. LTC, notifique -se o recorrente para, no prazo de 10 dias, se pronunciar sobre a possibilidade de náo conhecimento do recurso quanto às interpretaçóes normativas invocadas nos pontos 6 e 7 do requerimento de recurso (fls. 822), por náo terem sido aplicadas pela decisáo recorrida ou por náo terem sido invocadas de modo processualmente adequado." (fls. 936)

    Na sequência deste despacho, o recorrente pronunciou -se nestes termos:

    "1. A resposta colocada pelo despacho a que ora se responde suscita as seguintes observaçóes prévias:

    a) Em primeiro lugar, o Tribunal a quo está sujeito a regras de ofício, cujo cumprimento lhe é imposto, sem que a sua náo expressa invocaçáo de aplicaçáo, pelo interessado, acarrete qualquer consequência a este - é o que, assim, se dispóe, p. ex., no artigo 664. do CPC, mas também no artigo 663. n. 1, no caso, aplicável ex vi artigos 762. e 713. n. 2 daquela lei procedimental;

    b) Em segundo lugar, "colocar uma questáo" em sentido inteligente, ou como se diz, "para bom entendedor", significa apresentar um facto - nu e cru, digamos -, e uma pretensáo, tal que, a sua relevância jurídica, mesmo náo invocada mas forçosamente apreciada por causa da obrigatoriedade oficiosa acima referida, determine a interpretaçáo/aplicaçáo, bem ou mal, expressa, ou náo, do respectivo normativo legal pertinente.

    2 - Posto isto, o ónus procedimental para o presente recurso, sob pena de violaçáo do direito ao recurso ao TC - quando náo existe na nossa Ordem Jurídica o "recurso de amparo" - náo pode ser interpretado em termos táo retoricamente ritualistas, tal que se exija, quase, ou na prática, a obrigaçáo de uso de um expresso formulário, ipsis verbis igual na instância e neste TC. Supóe -se.3 - Neste sentido, é certo que a matéria em apreço surge nos autos em três momentos:

    a) Na própria alegaçáo de agravo;

    b) Na parte final da resposta ao parecer do M.P., já...

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