Acórdão n.º 348/2006, de 04 de Julho de 2006

Acórdáo n.o 348/2006

Processo n.o 10/CPP - Plenário

Acta

Aos 31 dias do mês de Maio do ano de 2006, achando-se presentes o Ex.mo Conselheiro Vice-Presidente Rui Manuel Gens de Moura Ramos e os Ex.mos Conselheiros Gil Manuel Gonçalves Gomes Galváo, Maria Joáo da Silva Baila Madeira Antunes, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Mário José de Araújo Torres, Carlos José Belo Pamplona de Oliveira, Maria Helena Barros de Brito, Maria Fernanda dos Santos Martins Palma Pereira, Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza, Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto, José Manuel de Sepúlveda Bravo Serra e Benjamim Silva Rodrigues, foram trazidos à conferência os presentes autos, para neles ser apreciado o que o Ministério Público nos mesmos promove, em matéria de responsabilidade contra-ordenacional dos dirigentes partidários pelas ilegalidades das contas dos partidos políticos, relativas ao ano de 2002.

Após debate e votaçáo, foi ditado o seguinte:

I- Relatório. -1-O Acórdáo n.o 288/2005 deste Tribunal aplicou aos partidos políticos coimas pelas infracçóes cometidas por estes em matéria de financiamento e organizaçáo contabilística, no ano de 2002, e determinou a continuaçáo dos autos com vista ao Ministério Público, de forma a promover o que tivesse por conveniente relativamente à responsabilidade pessoal dos dirigentes dos partidos políticos pelas ditas infracçóes, em conformidade com o preceituado nos artigos 14.o, n.o 3, e 14.o-A, n.o 1, da Lei n.o 56/98, de 18 de Agosto (com as alteraçóes resultantes da Lei n.o 23/2000, de 23 de Agosto), e no artigo 103.o-A da Lei do Tribunal Constitucional.

2 - Na sequência dessa decisáo, veio o Ministério Público, em 7 de Julho de 2005, promover, em suma, o seguinte:

  1. As contas dos partidos do ano de 2001 foram as primeiras a que foi aplicado o regime legal decorrente das alteraçóes introduzidas na Lei n.o 56/98 pela Lei n.o 23/2000, no que respeita à previsáo da responsabilidade pessoal dos dirigentes dos partidos políticos que participem no náo cumprimento das obrigaçóes legalmente impostas àquelas entidades colectivas, em sede de organizaçáo das respectivas contas, colocando-se, no essencial, problemas semelhantes quanto ao ano de 2002; b) A circunstância de os resultados da auditoria e diligências complementares promovidas náo serem inteiramente concludentes quanto à cabal imputaçáo de todas as infracçóes e irregularidades financeiras cometidas - bem como a eventual insuficiência dos estatutos e regulamentos financeiros entáo em vigor nos partidos, quanto à precisa e categórica delimitaçáo dos vários níveis de responsabilidade pelas infracçóes cometidas - náo pode conduzir a uma sistemática e inaceitável diluiçáo das possíveis e plausíveis responsabilidades dos dirigentes partidários nas infracçóes que motivaram a condenaçáo dos partidos, já que tal implicaria a evidente frustraçáo dos objectivos prosseguidos pela Lei n.o 23/2000; c) Os elementos coligidos nos autos náo permitem responsabilizar, a título de dolo, dirigentes partidários determinados, quanto às infracçóes ao dever genérico de os partidos possuírem contabilidade organizada (violado pelo facto de ocorrer falta de suficiente ou adequado suporte ou informaçáo documental, justificativa de receitas, despesas e mapas contabilísticos) e quanto às infracçóes aos deveres específicos consistentes: i) na náo adopçáo do procedimento de depósito integral dos donativos de natureza pecuniária em contas exclusivamente destinadas a esse efeito; ii) na náo adopçáo da prática do pagamento de despesas superiores a dois salários mínimos nacionais por cheque ou outro meio de pagamento que permita a identificaçáo do montante e da entidade destinatária e a náo realizaçáo das necessárias reconciliaçóes bancárias; iii) na náo realizaçáo das necessárias reconciliaçóes bancárias; bem como iv) na náo apresentaçáo da lista de receitas decorrentes das actividades de angariaçáo de fundos; d) O mesmo náo ocorre, porém, com outras infracçóes que, por estarem inquestionavelmente ligadas a aspectos estruturais e essenciais da organizaçáo financeira e contabilística dos partidos, náo poderiam, ao menos numa análise liminar e indiciária, deixar de ter escapado ao controlo dos titulares dos órgáos a quem estava cometido, segundo os estatutos e regulamentos financeiros em vigor, o domínio da gestáo financeira dos partidos, nomeadamente:

  2. A falta de apresentaçáo de contas (verificada quanto ao PSN eao PDA); ii) A ausência de contas abrangendo todo o universo partidário (verificada quanto ao PPD/PSD, ao PS eao CDS-PP); e iii) As deficiências ou insuficiências na organizaçáo e actualizaçáo do inventário do património do partido (verificadas quanto ao CDS-PP);

  3. Relativamente à imputaçáo ao PSN da náo apresentaçáo de contas, trata-se de uma infracçáo que, pela sua essencialidade, relevância e reiteraçáo (já que ocorreu também nos anos de 2000 e 2001), náo poderá deixar de imputar-se - pelo menos - ao presidente do próprio Partido, enquanto preside à direcçáo nacional, órgáo a que está cometida a elaboraçáo do orçamento e contas do Partido [artigos 33.o, n.o 1, alínea a), e 34.o, n.o 7, dos estatutos]. No ano de 2002, a funçáo de presidente era exercida, conforme os registos existentes neste Tribunal Constitucional, por António Barbosa da Costa. Este, presidindo à direcçáo nacional, náo elaborou nem apresentou, nesse ano, a respectiva conta, apesar de bem saber, face ao teor da lei e aos precedentes jurisprudenciais, resultantes de acórdáos já ante-riormente proferidos pelo Tribunal Constitucional, que estava obrigado a apresentá-las, nos termos legais. Participou, pois, com dolo, no cometimento da infracçáo prevista no artigo 14.o, n.o 2, da Lei n.o 56/98 (na redacçáo resultante da Lei n.o 23/2000), decorrente da omissáo de cumprimento, quanto ao ano de 2002, da obrigaçáo consignada no artigo 13.o, n.o 1, da mesma lei, indiciando-se que seja pessoalmente responsável - na qualidade de presidente do Partido e da respectiva direcçáo nacional - por tal infracçáo, pelo que se promove a aplicaçáo da coima prevista no artigo 14.o,n.o 3, da referida lei; f) O mesmo ocorre com a falta de apresentaçáo de contas, em 2002, pelo PDA, afigurando-se que tal infracçáo será de imputar ao presidente da comissáo política nacional, tendo em conta que a comissáo política nacional é o mais elevado órgáo «directivo e executivo do Partido» (artigo 43.o dos estatutos), cabendo ao respectivo presidente, como «chefe supremo do executivo do Partido», a principal responsabilidade pela orientaçáo, disciplina e acçáo partidária, competindo-lhe, nomeadamente, «cumprir e fazer cumprir as normas legais e estatutárias», bem como «a representaçáo suprema do Partido» (artigo 50.o) - e cabendo a tal órgáo a «administraçáo dos fundos» partidários (artigo 70.o). No ano de 2002, a funçáo de presidente da comissáo política nacional era exercida por José Francisco Nunes Ventura, que deixou, nesse ano, de elaborar e apresentar as contas do PDA, apesar de bem saber, face ao teor da lei, às disposiçóes legais e aos precedentes jurisprudenciais, que estava obrigado a apresentá-las. Participou, pois, com dolo, no cometimento da infracçáo prevista no artigo 14.o, n.o 2, da Lei n.o 56/98 (na redacçáo resultante da Lei n.o 23/2000), decorrente da omissáo de cumprimento, quanto ao ano de 2002, da obrigaçáo consignada no artigo 13.o, n.o 1, da mesma lei, indiciando-se que seja pessoalmente responsável - na qualidade de presidente da comissáo política nacional - por tal infracçáo, pelo que se promove a aplicaçáo da coima prevista no artigo 14.o, n.o 3, da referida lei;

  4. Quanto ao CDS-PP, os responsáveis das suas estruturas, organizaçóes e organismos estáo obrigados a prestar informaçáo regular das suas contas aos responsáveis nacionais, bem como a acatar as respectivas instruçóes e inspecçóes, sob pena de responsabilizaçáo individual e pessoal pelas infracçóes ao regulamento financeiro, cumprindo a cada nível organizatório um processo faseado de prestaçáo das contas resultantes da sua actividade financeira ao nível subsequente, de modo a permitir a apresentaçáo de «contas consolidadas» (artigos 10.o, 15.o e 21.o, n.o 1, do regulamento financeiro), sendo ainda as comissóes políticas distritais e regionais responsáveis pela actualizaçáo do inventário das estruturas concelhias, cabendo-lhes remeter o respectivo inventário actualizado ao secretário-geral (artigo 14.o, n.os 1 a 3, do dito regulamento) - e resultando, aliás, idêntico dever expressamente do preceituado no artigo 11.o, n.o 2, da Lei n.o 56/98. Exerciam, em 2002, as funçóes de presidentes das comissóes políticas distritais de Bragança, Castelo Branco e Leiria, respectivamente, António Mário Pegado Lemos Mendonça, Joáo Manuel Próspero dos Santos e Isabel Maria Gonçalves dos Santos. O incumprimento por tais responsáveis dos deveres estatutários que os oneravam, no que respeita às obrigaçóes de execuçáo financeira a que estavam vinculadas segundo o regulamento financeiro do Partido,por parte do órgáo a que presidiam, impossibilitou os órgáos nacionais de apresentarem uma conta consolidada, bem como o inventário devidamente organizado e actualizado. Estes titulares dos órgáos descentralizados do CDS-PP bem sabiam, face ao teor dos preceitos legais e das disposiçóes estatutárias, que estavam vinculados ao cumprimento tempestivo e adequado das obrigaçóes de execuçáo financeira por parte das estruturas a que presidiam, pelo que, náo o tendo feito, participaram, com dolo, no cometimento das infracçóes previstas nos artigos 10.o, n.os 3, alínea a), e 4, conjugados com os n.os 4 e 5 do mesmo preceito legal, promovendo-se a aplicaçáo da coima prevista no artigo 14.o,n.o 3, da citada lei;

  5. Quanto ao PPD/PSD, compete ao secretário-geral elaborar e submeter à comissáo política nacional o orçamento e as contas do Partido, podendo ser coadjuvado por secretários-gerais-adjuntos [artigo 25.o, n.o 1, alíneas c) e e), dos estatutos]. O regulamento financeiro do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT