Acórdão n.º 615/2007, de 08 de Fevereiro de 2008

Acórdáo n. 615/2007

Processo n. 385/07

Acordam, na 3.ª Secçáo, do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - Nos presentes autos de fiscalizaçáo concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal Central Administrativo Norte, em que figura como recorrente Caixa Geral de Aposentaçóes e como recorrido o Sindicato dos Trabalhadores da Administraçáo Local - STAL, foi, pela primeira, interposto recurso, em 07 de Março de 2007, de Acórdáo proferido por aquele Tribunal [cf. requerimento de fls. 163], que confirmou as decisóes anteriormente proferidas pelo 2. Juízo do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, julgando "pela inconstitucionalidade material das normas vertidas no n. 6 do artigo 01. e do artigo 02. da Lei n. 01/04 quando entendidas no sentido de que náo é aplicável o regime do Decreto -Lei n. 116/85 aos processos que se iniciaram antes de 31/12/2003 pelo simples facto de náo terem dado entrada na CGA até à data da entrada em vigor daquela Lei, por violaçáo conjugada do disposto nos artigos 02. e 266. da CRP [princípios da protecçáo da confiança e da segurança jurídica inerentes ao princípio do Estado de Direito]" (fls. 154 -verso).

2 - Notificada para tal, a recorrente veio produzir as seguintes alegaçóes escritas, as quais constam de fls. 185 a 188:

O douto Acórdáo do Tribunal Central Administrativo Norte de 22 de Fevereiro de 2007, proferido nos autos à margem referenciados, após raciocínio formulado ao longo do referido aresto, concluiu pela inconstitucionalidade material das normas vertidas no n. 6 do artigo 1. e do artigo 2. da Lei n. 1/2004, de 15 de Janeiro, quando entendidas no sentido de que náo é aplicável o regime do Decreto -Lei n. 116/85, de 14 de Abril, aos processos que se iniciaram antes de

31.12.2003, pelo simples facto de náo terem dado entrada na CGA até à data da entrada em vigor daquela Lei, por violaçáo conjugada do disposto nos artigos 2. e 266. da CRP [Princípios da protecçáo da confiança e da segurança jurídica inerentes ao princípio do Estado de Direito].

Com a devida vénia, náo pode a Caixa Geral de Aposentaçóes (CGA) conformar -se com tal decisáo.

Na verdade, a questáo em causa cinge -se apenas à verificaçáo, por esse Venerando Tribunal, se existe, ou náo, violaçáo dos princípios que emanam dos artigos 2. e 266. da Constituiçáo da República Portuguesa (CRP), já que a CGA, ao contrário do que se argumenta no aludido Acórdáo, sustenta que os artigos 1., n. 6, e 2., da Lei n. 1/2004, de 15 de Janeiro, por conterem normas de efeitos retroactivos, náo sáo inconstitucionais.

Assim, com fundamento nos argumentos expendidos na douta Sentença de 23 de Fevereiro de 2006, Proc. 2070/04.3BELSB, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, páginas 9 a 11, a Caixa igualmente, sustenta que "Dispóe o artigo 3., n. 3, da CRP, que a validade das leis do Estado depende da sua conformidade com a Constituiçáo, mas apenas a lei criminal náo pode ser retroactiva nos termos definidos no artigo 29., n. 1 a 4, da CRP.

e ainda que (aqui, ao contrário do juízo formulado pelo aludido Acórdáo do TCA Norte):

O princípio da náo retroactividade da lei náo tem actualmente, entre nós (salvo quanto à lei criminal o artigo 29. da CRP), assento na Constituiçáo e, daí; que o preceito do artigo 12. do Código Civil náo se impóe ao legislador. Assim, as disposiçóes do artigo 12. do Código Civil náo têm mais força vinculativa que as de outras leis ordinárias, pelo que elas náo prevalecem sobre o resultado da interpretaçáo destas (Vaz Serra, RLJ, n. 110, página 272).

5134 Seguindo -se mais argumentaçáo sobre a constitucionalidade da norma em causa.

A Caixa sustenta ainda a sua tese nos fundamentos proferidos pelo digníssimo Procurador -Geral Adjunto do Tribunal Central Administrativo Sul na sua douta intervençáo no Processo n. 1486/06, 2. Juízo - 1.ª Secçáo, de que a norma contida no artigo 2. da Lei n. 1/2004, de 15 de Janeiro, por conter comando jurídico com efeitos retroactivos, náo padece da inconstitucionalidade ou da ilegalidade que lhe é imputada, por náo atingir, de forma inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente as legítimas expectativas daqueles que podiam requerer a pensáo de aposentaçáo, de características excepcionais, prevista no regime instituído pelo Decreto -Lei n. 116/85, de 14 de Abril.

Na verdade, tal como faz reparo, tendo em conta que aquele regime anunciava, em primeira linha como medida conjuntural "de descongestionamento da Administraçáo Pública", dependente de náo haver "prejuízo para o serviço" e náo como o reconhecimento incondicional de um direito dos funcionários à aposentaçáo antecipada, era expectável a sua alteraçáo quando se modificassem as circunstâncias da adopçáo da medida legislativa.

Se assim náo fosse entendido, seria um absurdo, já que náo é violado qualquer preceito constitucional - muito menos os princípios da protecçáo da confiança e da segurança jurídica inerentes ao princípio do Estado de Direito -, por náo se atingirem, de forma inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente as legítimas expectativas daqueles que podiam requerer a pensáo de aposentaçáo, de características excepcionais, prevista no regime instituído pelo Decreto-Lei n. 116/85, de 14 de Abril.

Ora, por ser à CGA que compete verificar se estáo reunidas, ou náo, todas as condiçóes para a aposentaçáo antecipada e por entender que as normas que versam sobre retroactividade náo padecem de qualquer inconstitucionalidade, se solicita a esse Venerando Tribunal que se pronuncie sobre se as normas contidas nos artigos 1., n. 6, e 2., da Lei n. 1/2004, de 15 de Janeiro, padecem, ou náo, de inconstitucionalidade material.

Acresce que a revogaçáo do Decreto -Lei n. 116/85, de 14 de Abril, já havia sido anunciada em 2003, com a Lei n. 32 -B/2002, de 30 de Dezembro, posteriormente declarada inconstitucional pelo Acórdáo do TC n. 360/2003, de 8 de Julho de 2003, por razóes formais.

Era público que estava em marcha o processo legislativo tendente à aprovaçáo de medida idêntica o mais rapidamente possível, para entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2004, como é norma neste tipo de diplomas.

O atraso na publicaçáo da lei cuja aprovaçáo foi amplamente noticiada na comunicaçáo social e vivamente contestada pelos sindicatos, náo invalida a produçáo dos seus efeitos, já que a sua vigência náo depende do seu conhecimento efectivo, embora a sua eficácia dependa da sua publicaçáo.

Conclusóes:

  1. Os artigos 1., n. 6, e 2., da Lei n. 1/2004, de 15 de Janeiro, por conterem normas de efeitos retroactivos, náo sáo inconstitucionais, já que náo atingem, de forma inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente as legítimas expectativas daqueles que podiam requerer a pensáo de aposentaçáo, de características excepcionais, pre-vista no regime instituído pelo Decreto -Lei n. 116/85, de 14 de Abril.

  2. O artigo 3., n. 3, da CRP, dispóe que a validade das leis do Estado depende da sua conformidade com a Constituiçáo, mas apenas a lei criminal náo pode ser retroactiva nos termos definidos no artigo 29., n. 1 a 4, da mesma lei.

  3. O princípio da náo retroactividade da lei náo tem actualmente,

    entre nós (salvo quanto à lei criminal o artigo 29. da CRP), assento na Constituiçáo e, daí, que o preceito do artigo 12. do Código Civil náo se impóe ao legislador.

  4. Assim, as disposiçóes do artigo 12. do Código Civil náo têm mais força vinculativa que as de outras leis ordinárias, pelo que elas náo prevalecem sobre o resultado da interpretaçáo destas (Vaz Serra, RLJ, n. 110, página 272).

  5. Por outro lado, o atraso na publicaçáo da lei náo invalida a produçáo dos seus efeitos, já que a sua vigência náo depende do seu conhecimento efectivo, embora a sua eficácia dependa da sua publicaçáo, tanto mais que a sua aprovaçáo foi amplamente noticiada na comunicaçáo social e vivamente contestada pelos sindicatos.

  6. Nesta conformidade, face aos fundamentos acima expostos, a CGA entende que deverá ser declarado que os artigos 1., n. 6, e 2., da Lei n. 1/2004, de 15 de Janeiro, náo sáo, em qualquer circunstância, inconstitucionais, nem, táo pouco, violam quaisquer dos princípios que emanam dos artigos 2. e 266. da CRP.

    Assim, deve proceder o presente recurso, determinando -se a reforma do Acórdáo recorrido quanto ao julgamento da questáo da constitucionalidade.»

    3 - Notificado pela recorrente, nos termos dos artigos 229. -A, 260. -A e 698., n. 2 do CPC (fls. 190), o recorrido náo apresentou as suas contra -alegaçóes, dentro do prazo legalmente fixado.

    II - Fundamentaçáo. - 4 - Nos presentes autos, discute -se a constitucionalidade das seguintes normas, constantes da Lei n. 1/2004, de 15 de Janeiro:

    Artigo 1.

    Caixa Geral de Aposentaçóes

    (...)

    6 - O disposto nos números anteriores náo se aplica aos subscritores da Caixa Geral de Aposentaçóes cujos processos de aposentaçáo sejam enviados a essa Caixa, pelos respectivos serviços ou entidades, até à data de entrada em vigor deste diploma, desde que os interessados reúnam, nessa data, as condiçóes legalmente exigidas para a concessáo da aposentaçáo, incluindo aqueles cuja aposentaçáo depende da incapacidade dos interessados e esta venha a ser declarada pela competente junta médica após aquela data.

    Artigo 2.

    Entrada...

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