Despacho n.º 9727/2017

Data de publicação08 Novembro 2017
SeçãoSerie II
ÓrgãoAmbiente e Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural - Gabinetes dos Ministros do Ambiente e da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural

Despacho n.º 9727/2017

A Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ENCNB), adotada através da Resolução do Conselho de Ministros (RCM) n.º 152/2001, de 11 de outubro, e atualmente em processo de revisão, é o instrumento de referência para a prossecução da política de ambiente, assegurando o cumprimento dos compromissos nacionais e internacionais, no contexto da União Europeia, orientando as políticas de conservação da natureza e biodiversidade e prosseguindo com o desiderato de parar a perda de património natural, em plena consonância com a Estratégia de Desenvolvimento Sustentável, aprovada pela RCM n.º 109/2007, de 20 de agosto. A ENCNB tem como objetivos gerais: (1) conservar a natureza e a diversidade biológica, incluindo os elementos notáveis da geologia, geomorfologia e paleontologia, (2) a utilização sustentável dos recursos biológicos e (3) contribuir para a prossecução dos objetivos visados nos processos de cooperação internacional. Para a concretização desses objetivos é dada prioridade ao desenvolvimento de ações específicas de conservação e gestão de espécies e habitats que visem a melhoria do seu estado de conservação em todo o território nacional.

O lobo-ibérico (Canis lupus signatus, Cabrera 1907) possui em Portugal, desde 1990, o estatuto de ameaça de Em Perigo, de acordo com o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (Queiroz et al. 2005).

Relativamente ao seu estatuto legal de proteção, o lobo é considerado uma espécie prioritária de interesse comunitário pela Diretiva Habitats, transposta para o direito interno pelo Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, com a redação dada pelos Decretos-Leis n.os 49/2005, de 24 de fevereiro, e 156-A/2013, de 8 de novembro. Através deste diploma, e com o objetivo de alcançar o estado de conservação favorável para a espécie em Portugal, é exigida a designação de Sítios de Interesse Comunitário a integrar a Rede Natura 2000 com vista à conservação desta espécie, bem como a sua proteção rigorosa em toda a área de distribuição.

A nível nacional, o lobo é a única espécie da fauna que tem uma legislação específica (Lei n.º 90/88, de 13 de agosto - Lei de Proteção do Lobo-Ibérico - e o Decreto-Lei n.º 54/2016, de 25 de agosto, que a regulamenta), pela qual é protegida.

Com base nos dados disponíveis, relativos ao período 2007-2012, sobre a extensão de ocorrência, população (número de indivíduos maduros) e habitat da espécie, bem como as perspetivas futuras, no que respeita à avaliação da tendência das ameaças e pressões que incidem sobre a mesma, procedeu-se à avaliação do estado de conservação do lobo em Portugal, no âmbito das obrigações decorrentes do exposto no artigo 17.º da Diretiva Habitats. Não obstante as medidas de conservação já adotadas, obteve-se mais uma vez o resultado de desfavorável para a maior parte da área de distribuição da espécie.

Face ao acima mencionado e tendo em conta as recomendações do:

Comité Permanente da Convenção de Berna n.º 17 (1989), n.º 43 (1995), n.º 59 (1997) e n.º 74 (1999);

Conselho da Europa «Action Plan for the conservation of wolves in Europe (Canis lupus)» (2000); e

Plano Setorial da Rede Natura 2000, aprovado pela RCM n.º 115-A/2008, de 21 de julho de 2008,

o Estado Português decidiu elaborar um Plano de Ação Nacional para a Conservação do Lobo-Ibérico (PACLobo), o qual deverá enquadrar e planificar a implementação de ações específicas que visem a conservação da espécie e o alcance efetivo do estado de conservação favorável da mesma em Portugal.

Assim, ao abrigo do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 54/2016, de 25 de agosto, determina-se:

1 - Aprovar o Plano de Ação para a Conservação do Lobo-Ibérico em Portugal (PACLobo), anexo ao presente despacho e que dele faz parte integrante.

2 - As revisões que se justificarem aos anexos do PACLobo são aprovadas por deliberação do Conselho Diretivo do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I. P., e publicitadas na sua plataforma de internet.

31 de outubro de 2017. - O Ministro do Ambiente, João Pedro Soeiro de Matos Fernandes. - O Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Luís Manuel Capoulas Santos.

ANEXO

Plano de Ação para a Conservação do Lobo-Ibérico (Canis lupus signatus) em Portugal

A - Introdução

O Plano de Ação para a Conservação do Lobo-Ibérico (Canis lupus signatus) em Portugal (PACLobo) enquadra e coordena o esforço nacional para a conservação do lobo-ibérico no território continental Português.

B - Diagnóstico da situação do lobo-ibérico em Portugal

Os textos que se seguem integram informação relativa à situação de referência do lobo em Portugal (disponível na página digital do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I. P.), bem como os resultados da análise SWOT, efetuada no âmbito deste plano de ação.

B.1 - Área de ocorrência e caracterização populacional

No início do século xx o lobo-ibérico ocorria em todo o território continental, altura em que se iniciou um progressivo desaparecimento de sul para norte e do litoral para o interior. Estimou-se que, no início de 1990, a espécie ocuparia apenas 20 % da sua área de distribuição original em Portugal, restringindo-se ao Norte e Centro do território (Petrucci-Fonseca, 1990).

Até à data foram realizados dois censos populacionais de lobo com âmbito nacional: o primeiro em 1994/1996 (ICNF, 1997) e o segundo em 2002/2003 (Pimenta et. al, 2005). Apesar de as metodologias utilizadas não serem totalmente comparáveis, os pontos de convergência entre os dois censos, incluindo a mesma malha de amostragem baseada em quadrículas UTM 10 x 10 km, permitem concluir que a presença de lobo se manteve estável entre censos na maior parte da sua área de distribuição (81,2 %), e que fenómenos pontuais de regressão (em 3,5 % da área) ou expansão (em 15,2 %) se deram nos limites da área de ocorrência e não no interior dos núcleos populacionais. De acordo com o último censo nacional (2002/2003), a área de presença de lobo em Portugal é de 20.400 km2 (Pimenta et. al, 2005), havendo adequabilidade do habitat para potencial recolonização de novas áreas em cerca de 8.500 km2, conforme previsto por modelação ecológica. As áreas de potencial recolonização situam-se maioritariamente a sul do rio Douro, nomeadamente nas serras da Estrela, Lousã, Gardunha, Caramulo e S. Mamede (Ferrão da Costa et al., 2013).

Existem duas subpopulações lupinas separadas pelo rio Douro (tabela 1): a norte do Douro o lobo tem uma área de presença de cerca de 13.600 km2 e está em contacto com a população espanhola; a sul do Douro a espécie tem uma área de distribuição mais restrita, de cerca de 6.800 km2, e está aparentemente isolada, tanto da subpopulação a norte do Douro como da população espanhola (Pimenta et al., 2005).

TABELA 1

Área de presença de lobo e número de alcateias detetadas em Portugal segundo o Censo Nacional do Lobo 2002/2003 (Pimenta et al., 2005)

(ver documento original)

No Censo Nacional do Lobo de 2002/2003 foram identificadas 63 alcateias (51 confirmadas e 12 prováveis) e estimado um efetivo populacional entre 220 e 430 indivíduos (tabela 1) (Pimenta et al., 2005).

Face à ausência de um censo populacional atualizado, foi realizada no âmbito do PACLobo uma compilação de informação, disponibilizada por distintas entidades (1), sobre a situação populacional do lobo após o último Censo Nacional, cujos resultados se encontram refletidos no presente documento. De acordo com esta compilação, entre 2003 e 2014:

Foram detetadas 47 alcateias (41 confirmadas e 6 prováveis), das quais 6 (4 confirmadas e 2 prováveis) se localizam em áreas identificadas no Censo Nacional de 2002/2003 como zonas de presença de lobo sem ocorrência de grupos. Não existe informação disponível para 27 % (N=17) das alcateias identificadas no Censo Nacional 2002/2003, localizadas maioritariamente no núcleo populacional de Bragança.

A monitorização contínua de quatro áreas de ocorrência de lobo, designadamente Alto Minho, Alvão-Padrela, Arada-Trancoso e Sabugal, permitiu avaliar, a um nível regional, o grau de estabilidade das alcateias e a tendência populacional do lobo. A estabilidade das alcateias, medida pela taxa de sucesso de deteção de reprodução (razão entre o número de anos com reprodução confirmada na alcateia e o número de anos de prospeção por alcateia), parece apresentar valores mais elevados na área do Alto Minho, onde duas alcateias exibiram grande estabilidade de reprodução. As áreas de Alvão-Padrela, Arada-Trancoso e Sabugal apresentam aparentemente menor estabilidade reprodutora nas alcateias, com taxas de deteção de reprodução inferiores a 50 %. Na área de Sabugal não foi detetada reprodução em qualquer das alcateias identificadas.

A avaliação da tendência populacional mostra uma ligeira variação no número de alcateias ao longo dos anos nas quatro áreas, situação resultante da dinâmica populacional característica desta espécie. As áreas do Alto Minho e de Arada-Trancoso exibem uma grande estabilidade no número de alcateias (manutenção de 4 a 6 alcateias em ambas as áreas), enquanto a área de Alvão-Padrela mostra um aparente decréscimo. O número médio de indivíduos por alcateia (verão/outono) para cada núcleo populacional é de 4,0 adultos e 3,3 crias a norte do rio Douro e de 4,2 adultos e 2,3 crias a sul do rio Douro. O efetivo máximo registado foi de 16 indivíduos por alcateia (8 adultos e 8 crias) na área do Alto Minho.

A altitude parece ser o fator que mais se destaca para explicar a presença de lobo em Portugal (Grilo et al., 2002, Pimenta et. al., 2005; Eggermann et al., 2011; Ferrão da Costa et al., 2013). A sua influência não será direta mas dever-se-á à associação das zonas de maior altitude com outras características da paisagem mais relevantes para a espécie, como a menor densidade populacional humana e a menor densidade de estradas, aliadas a uma maior presença de animais domésticos pastoreados em regime extensivo (Pimenta et al., 2005).

De acordo com Ferrão da Costa et al. (2013), na área de presença de lobo em Portugal...

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