Decreto-Lei n.º 205/96, de 25 de Outubro de 1996

Decreto-Lei n.º 205/96 de 25 de Outubro Doze anos passados sobre a publicação do Decreto-Lei n.º 102/84, de 29 de Março, que criou o sistema de aprendizagem em Portugal, na sequência da acção piloto de formação de jovens que se vinha já desenvolvendo desde 1980, impõe-se reflectir sobre o caminho percorrido por este sistema de formação e acolher na legislação os ensinamentos decorrentes das práticas dos seus actores.

O conjunto de estudos realizados nos últimos anos permitiu evidenciar potencialidades e debilidades da configuração actual da aprendizagem e apontou para a necessidade de uma reforma organizativa e pedagógica.

A aprendizagem distingue-se entre as diversas ofertas de formação profissional inicial pela importância que nela assume a formacão em situação de trabalho, enquanto processo de aquisição de competências, ultrapassando a situação simples de aplicação prática de conhecimentos. É necessário, assim, assegurar as condições para que as empresas possam envolver-se nesta metodologia de formação, contribuindo efectivamente para a realização dos objectivos pretendidos, através do reforço da utilidade da componente de formação em situação de trabalho, o que potenciará, naturalmente, os próprios níveis de empregabilidade do sistema.

A reforma da aprendizagem, que este diploma legal pretende sustentar, parte do pressuposto de que se devem mobilizar todos os operadores para o desenvolvimento do valor formativo da formação em situação de trabalho e intensificar as articulações e a coordenação entre esta componente de formação e as outras componentes e reforçar a função de supervisão pedagógica, vocacionada para a promoção da qualidade da formação.

Esta reforma tem, por outro lado, em conta que nos últimos 12 anos se assistiu a uma grande mudança no sistema de educação e formação profissional, que obriga a repensar o lugar da aprendizagem, já não como um dispositivo de emergência para jovens que não têm alternativas ao mesmo nível, mas como parte integrante de um sistema de formação em que coexistem vias alternativas, com identidade própria, inseridos em diferentes subsistemas de formação. Por outro lado, a formação no âmbito da aprendizagem organiza-se por forma que a qualificação profissional esteja associada à aquisição de competências que implicam uma progressão escolar, reforçando-se, assim, a articulação entre a educação e a formação.

Neste contexto, entende-se que deve poder cobrir a diversidade de situações prioritárias para Portugal, desde a promoção da qualificação de base daqueles que foram excluídos precocemente do sistema escolar até à contribuição para a modernização da economia pela produção de qualificações intermédias, de peso determinante no desenvolvimento das condições necessárias intermédias ao crescimento da competitividade, bem como ao desenvolvimento da qualidade de vida dos portugueses.

Ao assumir estes objectivos, a aprendizagem surge como uma alternativa de formação inicial, com uma identidade pedagógica própria e com um papel específico a desempenhar, com lugar no ordenamento daformação profissional que tem vindo a ser promovido como resultado do consenso entre o Estado e os parceiros sociais, consubstanciado no Acordo de Política de Formação Profissional celebrado em 1991. Em virtude deste Acordo, Portugal dotou-se de um enquadramento legal da formação profissional, inserida no sistema educativo ou no mercado de emprego, bem como de um regime de certificação profissional. Esse enquadramento legal configura, pela conjugação dos Decretos-Leis n.º 401/91, de 16 de Outubro, e 405/91, também de 16 de Outubro, a aprendizagem como uma modalidade de formação profissional inicial inserida no mercado de emprego.

No entanto, deve manter-se a tradição legislativa que consagra a especificidade de um diploma legal com regulamentação especial adequada, que consagre a articulação, dentro da aprendizagem, entre objectivos específicos da formação inserida no mercado de emprego e os objectivos educativos para os quais esta contribui igualmente.

Pelos motivos expostos, procede-se à reformulação global da aprendizagem e consequente revogação dos Decretos-Leis n.º 102/84, de 29 de Março, 436/88, de 23 de Novembro, e 383/91, de 9 de Outubro.

Neste diploma legal de enquadramento são definidos os princípios e as bases orientadoras. Este diploma deverá, por sua vez, ser regulamentado e concretizado, necessariamente, nos aspectos relevantes, por legislação complementar que garanta a qualidade e o controlo necessários ao bom funcionamento da aprendizagem, sem a burocratizar, promovendo garantias de qualidade da formação e incentivos à participação local na promoção de acções inseridas neste sistema de formação.

Assim, o presente decreto-lei cria um conjunto de normas imperativas, caracterizadoras do modelo, deixando espaço na sua concretizarão para a auto-regulação do sistema pelos seus agentes.

O presente decreto-lei beneficiou da sua discussão na Comissão Nacional de Aprendizagem e da discussão e pareceres dos parceiros sociais.

Nos termos constitucionais, foram ouvidas as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.

Assim: Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte: CAPÍTULO I Disposições gerais Artigo 1.º Objecto O presente diploma estabelece o regime jurídico da aprendizagem, que é um sistema de formação profissional inicial em alternância, definida nos termos do n.º 3 do artigo 2.º no quadro da formação profissional inserida no mercado de emprego.

Artigo 2.º Conceitos 1 - A aprendizagem é um sistema de formação dirigido a jovens, desde que tenham ultrapassado a idade limite de escolaridade obrigatória e que não tenham ultrapassado, preferencialmente, o limite etário dos 25 anos, o qual integra uma formação polivalente, preparando para saídas profissionais específicas e conferindo uma qualificação profissional e possibilidade de progressão e certificação escolar.

2 - Os cursos de aprendizagem configuram um processo formativo integrado com componentes de formação sócio-cultural, científico-tecnológica e prática, em proporção e combinação variáveis, consoante as áreas de actividade contempladas e os níveis de qualificação profissional que conferem, salvaguardando sempre a sua flexibilidade, coerência e polivalência.

3 - A alternância, para efeitos deste diploma legal, é caracterizada pela interacção entre as componentes de formação teórica e de formação prática, incluindo esta, obrigatoriamente, formação em situação de trabalho, distribuída, de forma progressiva, ao longo de todo o processo formativo.

4 - A componente de formação prática, que não poderá exceder 50% do tempo total de formação, integra a formação em situação de trabalho, que ocupa, no mínimo, 30% da duração total, sendo complementada com formação prática simulada, para salvaguarda da polivalência da formação.

5 - Por formação em situação de trabalho entende-se a realização de actividades profissionais pelo formando, enquadradas em itinerários de formação estruturados e sob a orientação de um tutor, inseridas em processos reais de trabalho e realizadas junto de pessoas singulares ou colectivas que desenvolvem uma actividade de produção de bens ou de prestação de serviços.

Artigo 3.º Componentes de formação De acordo com os princípios consagrados nos artigos 14.º a 19.º do Decreto-Lei n.º 401/91, de 16 de Outubro, e para efeitos do presente diploma, as diferentes componentes de formação previstas no artigo 2.º visam: a) Formação sócio-cultural - as competências, atitudes e conhecimentos orientados para o desenvolvimento pessoal, profissional e social dos indivíduos e para a sua inserção na vida activa; b) Formação científico-tecnológica - os conhecimentos necessários à compreensão das tecnologias e actividades práticas, bem como à resolução dos problemas que integram o exercício profissional; c) Formação prática - as actividades de formação realizadas sob a forma de ensaio ou experiência de processos, técnicas, equipamentos e materiais, sob orientação do formador ou tutor, quer se integrem em processos de produção de bens ou prestação de serviços, em situação de trabalho, quer simulem esses processos.

Artigo 4.º Unidade coordenadora de aprendizagem 1 - As pessoas singulares ou colectivas que pretendam organizar acções de formação são, para o efeito, credenciadas pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) como unidades coordenadoras de aprendizagem, o que as habilita para o desempenho da função pedagógica da prestação de formação e para a coordenação dos processos de formação profissional, em alternância em regime de aprendizagem.

2 - São consideradas unidades coordenadoras de aprendizagem as estruturas locais de formação do IEFP, os centros de formação profissional de gestão participada e as pessoas singulares ou colectivas credenciadas pelo IEFP que o requeiram e demonstrem ter idoneidade, capacidade pedagógica e meios humanos, administrativos, técnicos e económicos para o completo desempenho das suas funções.

3 - São consideradas como unidades coordenadoras de aprendizagem os estabelecimentos de ensino estatais, sempre que se considere vantajosa tal solução, após a análise das redes e instituições locais de educação e formação.

Artigo 5.º Entidades formadoras 1 - Por entidade formadora entende-se a unidade coordenadora de aprendizagem e qualquer outra pessoa singular ou colectiva que assegure qualquer componente de formação, designadamente a formação em situação de trabalho.

2 - Para efeitos de celebração de contrato de aprendizagem, a unidade coordenadora pode ser considerada entidade formadora única, desde que assegure, pelo menos, 50% da formação em situação de trabalho.

Artigo 6.º Formando, formador, tutor e coordenador Para efeitos do presente diploma, considera-se: a) Formando - aquele que, tendo ultrapassado a idade limite da escolaridade obrigatória e reúna as restantes condições de...

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