Decreto-Lei n.º 376-A/89, de 25 de Outubro de 1989

Decreto-Lei n.º 376-A/89 de 25 de Outubro Não tem sido fácil o processo de reforma do contencioso aduaneiro, podendo dizer-se que nos últimos anos a legislação atinente às infracções fiscais aduaneiras tem conhecido vicissitudes da mais diversa natureza.

Logo em 1976, a entrada em vigor da Constituição da República Portuguesa inviabilizou a existência dos tribunais fiscais aduaneiros como órgãos com competência exclusiva para o julgamento dos crimes aduaneiros.

Esta situação manteve-se até à publicação do Decreto-Lei n.º 173-A/78, de 8 de Julho, pelo qual a competência para a instrução e julgamento dos crimes fiscais aduaneiros passou para a esfera dos tribunais judiciais, restando para os tribunais fiscais aduaneiros o julgamento das transgressões fiscais aduaneiras.

A publicação do Decreto-Lei n.º 187/83, de 13 de Maio, correspondeu, pois, a uma necessidade imperiosa que se fazia sentir, face, por um lado, ao carácter obsoleto do Contencioso Aduaneiro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 31664, de 22 de Novembro de 1941, e, por outro, à entrada em vigor da Constituição da República e consequente necessidade de descriminalização de certos comportamentos sem dignidade penal e sua previsão e punição ao nível do ilícito de mera ordenação social.

Este diploma clarificou muitas dúvidas, adaptou o chamado 'contencioso aduaneiro' ao direito criminal substantivo e adjectivo e sancionou medidas de política legislativa susceptíveis de permitirem um mais eficaz combate contra a criminalidade aduaneira, em crescente expansão e organização.

Posta em causa a validade constituicional deste diploma por dissolução do órgão autorizante e demissão do órgão autorizado, o Governo aprovou o Decreto-Lei n.º 424/86, de 27 de Dezembro, que veio substituir o diploma de 1983 e acabar com as transgressões fiscais aduaneiras, as quais foram convertidas em contra-ordenações.

Acontece que a validade constitucional do Decreto-Lei n.º 424/86 também foi posta em causa pela jurisprudência portuguesa e, finalmente, já declarada inconstitucional a quase totalidade das suas normas.

Daí que se torne urgente a publicação do presente diploma, estabelecendo-se o novo regime jurídico para as infracções fiscais aduaneiras, de molde a substituir-se o Decreto-Lei n.º 424/86, a adaptar-se as suas disposições de conformidade com a experiência da sua aplicação, a tomar-se em consideração as grandes linhas do regime geral das infracções fiscais no âmbito da reforma fiscal, o previsível estabelecimento do mercado interno, até 31 de Dezembro de 1992, como um espaço sem fronteiras ou espaço económico comum, e as exigências da política de defesa nacional. Também não deixou de ter-se em conta a oportunidade para introduzir alterações que se julgam susceptíveis de facilitar a aplicação das normas relativas às infracções fiscais aduaneiras e, consequentemente, aumentar a eficácia da sua repressão, num domínio cujo carácter vital para o Estado e para a economia nacional se torna desnecessário sublinhar.

A par de diversos aperfeiçoamentos de ordem formal e sistemática, sublinha-se a separação dos tipos de crime agora previstos nos artigos da norma incriminadora do contrabando, justificada pelo facto de se entender tratar-se de crimes autónomos, com carácter de crimes de perigo, e que, por isso, não devem ser confundidos com o contrabando em sentido próprio, nesta linha se autonomizando também o chamado 'contrabando de circulação'.

Mas, quanto a este último, no escopo de equilibrar os interesses antagónicos em presença, se se deu azo a que o arguido pudesse demonstrar a nacionalização da mercadoria, também se previu a subsistência, nesse caso, da eventual contra-ordenação pela não apresentação da respectiva documentação em tempo oportuno.

Valorou-se ainda a especial gravidade das infracções aduaneiras sempre que digam respeito a gado, carne ou produtos cárneos.

Em matéria de contra-ordenação, merece relevância a criação de novos tipos de modo a clarificar os comportamentos ilícitos.

De igual forma, no que concerne à matéria de recursos das decisões de aplicação de coimas por autoridades fiscais aduaneiras, atribui-se, inequivocamente, a competência aos tribunais fiscais aduaneiros, bem como aos tribunais tributários de 1.' instância, a competência para a execução de coimas em matéria de contra-ordenações fiscais aduaneiras.

É óbvio que as considerações enunciadas não contemplam todas as alterações produzidas, nem isso sequer seria desejável. Outras normas foram alteradas, de modo a ficarem adaptadas ao novo Código de Processo Penal, e outras houve cuja redacção se procurou tornar mais clara.

Espera-se, pois, que o presente diploma, ao estabelecer em termos globais o regime jurídico aplicável às infracções fiscais aduaneiras, possa, consolidando a evolução do contencioso fiscal aduaneiro anterior, contribuir para uma justiça mais célere no combate eficaz à fraude e evasão fiscais aduaneiras.

Assim: No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 7/89, de 21 de Abril, e nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreto o seguinte: Artigo 1.º Aprovação É aprovado o Regime Jurídico das Infracções Fiscais Aduaneiras, anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante.

Artigo 2.º Equiparação de transgressões a contra-ordenações Todos os factos tipicamente descritos como transgressão fiscal aduaneira que não sejam enquadráveis em nenhuma das contra-ordenações tipificadas no regime jurídico das infracções fiscais aduaneiras passarão a considerar-se como contra-ordenação fiscal aduaneira e a reger-se, em tudo, pelas normas deste diploma e do regime jurídico que aprova.

Artigo 3.º Revogação 1 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, são revogados o livro I do Contencioso Aduaneiro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 31664, de 22 de Novembro de 1941, e os Decretos-Leis n.os 187/83, de 13 de Maio, e 424/86, de 27 de Dezembro.

2 - Os processos pendentes à data da entrada em vigor do presente diploma continuarão a reger-se, até ao trânsito em julgado da decisão que lhes ponha termo, pela legislação que lhes era aplicável.

Artigo 4.º Entrada em vigor O presente diploma entra em vigor 15 dias após a data da sua publicação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 21 de Setembro de 1989. Aníbal António Cavaco Silva - Miguel José Ribeiro Cadilhe - Joaquim Fernando Nogueira.

Promulgado em 24 de Outubro de 1989.

Publique-se.

O Presidente da República, MÁRIO SOARES.

Referendado em 24 de Outubro de 1989.

O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.

REGIME JURÍDICO DAS INFRACÇÕES FISCAIS ADUANEIRAS PARTE I Princípios gerais CAPÍTULO I Disposições gerais comuns Artigo 1.º Âmbito de aplicação 1 - O presente Regime Jurídico aplica-se às infracções às normas reguladoras de prestações tributárias aduaneiras, incluindo as de regimes aduaneiros suspensivos e de benefícios fiscais, de importação ou exportação.

2 - O presente Regime Jurídico aplica-se ainda à disciplina legal dos regimes aduaneiros que, independentemente de regulamentarem ou não a prestação tributária aduaneira, estabeleçam quaisquer facilidades, simplificação de procedimentos, deveres, restrições ou proibições relativos à titularidade, apresentação, descarga e depósito, utilização ou destino, trânsito e circulação de mercadorias nacionais, nacionalizadas, importadas ou destinadas à exportação.

Artigo 2.º Definições 1 - Para efeitos do disposto no presente Regime Jurídico considera-se: a) Leis e regulamentos aduaneiros: os diplomas legislativos e regulamentares emitidos pelo Estado Português e os actos normativos adoptados pelas instituições da Comunidade Europeia, nos termos requeridos para poderem vigorar directamente na ordem interna portuguesa, relativos às receitas tributárias aduaneiras, à importação, exportação e trânsito de mercadorias, bem como a outras matérias com estas directamente conexionadas ou que se relacionem com o desempenho de atribuições da administração aduaneira; b) Infracção fiscal aduaneira: o facto típico, ilícito e culposo declarado punível por lei aduaneira anterior; c) Prestação tributária aduaneira: os direitos aduaneiros e demais imposições, incluindo impostos, taxas e outras receitas fiscais ou de natureza parafiscal cuja cobrança caiba às alfândegas; d) Território aduaneiro: o espaço compreendido entre a fronteira terrestre do continente e a linha ou linhas que constituem o limite exterior do mar territorial da zona contígua portuguesa, acrescido do território das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira e respectivas zonas contíguas; e) Fronteira aduaneira: os limites do território aduaneiro; f) Alfândegas: as estâncias aduaneiras, os postos fiscais, os caminhos que directamente conduzem àquelas e a estes, os depósitos aduaneiros e, em geral, os locais sujeitos a fiscalização permanente onde se efectuem o embarque e desembarque de passageiros ou operações de carga e descarga demercadorias; g) Órgãos de polícia fiscal aduaneira: a Direcção-Geral das Alfândegas, a Guarda Fiscal, os seus agentes e as entidades e agentes policiais a quem caiba levar a cabo quaisquer actos ordenados por uma autoridade judiciária ou determinados por este Regime Jurídico; h) Suspeito: toda a pessoa relativamente à qual exista indício de que cometeu ou se prepara para cometer um crime ou uma contra-ordenação fiscal aduaneira ou que neles participou ou se prepara para participar.

2 - Para os efeitos do disposto no presente Regime Jurídico: a) As mercadorias consideram-se em circulação desde a entrada no País ou saída do local de produção até entrarem na posse do consumidor final, não se considerando na posse deste as mercadorias existentes em explorações agrícolas, estabelecimentos comerciais ou industriais ou suas dependências, quando se destinem a comércio; b) Os meios de transporte, terrestres, fluviais, marítimos e aéreos, consideram-se em circulação sempre que não se encontrem, respectivamente, aparcados em garagens exclusivamente privadas...

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