Decreto-Lei n.º 605/75, de 03 de Novembro de 1975

Decreto-Lei n.º 605/75 de 3 de Novembro 1. O Programa do Movimento das Forças Armadas determina, nas medidas a curto prazo, a dignificação do processo penal em todas as suas fases, havendo o Ministério da Justiça, no seu Plano de Acção, aprovado em Conselho de Ministros de 20 de Setembro de 1974, considerado prioritária, em ordem ao cumprimento daquela directriz, a simplificação e celeridade do processo penal, a fusão num só dos processos correccional e de polícia correccional, bem como a instituição do júri para o julgamento dos crimes mais graves. Entendeu-se também ter carácter prioritário a concessão ao juiz da faculdade de condenar o réu em indemnização cível, mesmo que o absolva da acusação crime, desde que exista ilícito civil ou responsabilidade fundada no risco.

Visa o presente diploma concretizar tais medidas, sem prejuízo de uma ulterior e muito ampla reforma de todo o processo penal português.

  1. No que concerne à aceleração da marcha do processo penal, entende-se dever dispensar a instrução - quer a preparatória, quer a contraditória - nos processos por crimes a julgar em processo correccional. A celeridade, desde que se respeitem as garantias da ordem jurídica e social na averiguação das infracções e defesa dos arguidos, é exigência da própria Justiça, a qual se não compadece com delongas na apreciação dos feitos penais, de que deriva a atenuação ou mesmo a extinção dos efeitos de prevenção geral que às penas cumpre assegurar, e ainda a necessidade de dar pronta satisfação à pressão dos interesses violados. Adopta-se, por isso, a solução de dispensar a instrução preparatória em tais casos.

    Entende-se, porém, na salvaguarda dos direitos dos arguidos, que a instrução preparatória se deverá realizar sempre que estes se encontrem presos. Então, e só neste caso, se mantém a instrução com todo o seu actual ritualismo para os crimes a julgar em processo correccional.

  2. Não se vê razão para a existência de duas formas de processo para julgamento dos crimes puníveis com prisão; daí que se unifiquem os processos de polícia correccional e correccional, pondo-se termo a uma dualidade processual anacrónica, só existente por razões históricas há muito ultrapassadas.

    Impõe-se a alteração dos termos do processo correccional, não só porque sob tal forma processual se julgarão todas as infracções puníveis com prisão, mas ainda pela inexistência da instrução na generalidade dos casos em tal forma de processo abrangidos.

    No processo correccional será a citação directa, independentemente de qualquer outra formalidade, que provocará a actuação judicial; daí que só na fase de acusação se verifique a necessidade da constituição como assistente dos que para tanto possuam legitimidade.

    A celeridade que se pretende imprimir ao processado e à realização do julgamento conduz a só permitir o recurso do despacho que designa dia para julgamento do feito, quando se trate de crime doloso e o Ministério Público não deduza acusação. Por outro lado, a fim de evitar acusações infundamentadas, não visando outra coisa que não seja o vexame e o incómodo do acusado, estabelece-se a condenação do acusador que se reconheça haver actuado como litigante temerário.

  3. A instituição do júri impõe-se como postulado da ordem democrática instaurada pelo Movimento das Forças Armadas. Na verdade, só os regimes totalitários poderão recear a intervenção dos representantes do povo, base e alicerce de toda a ordem democrática, no julgamento dos arguidos. É esta a realidade dos países democráticos, já conhecida da legislação penal portuguesa e afastada em 1927.

    As críticas que normalmente se fazem ao júri bem se podem afastar desde que ele seja composto, tal como sucede em França, por juízes togados e jurados populares.

    O júri apenas intervirá quando a acusação ou a defesa o requeiram, deixando-se assim às partes a possibilidade de o julgamento ser efectuado pelo tribunal colectivo, ficando por outro lado a sua intervenção limitada aos julgamentos a realizar em processo de querela.

    Na medida em que o despacho de pronúncia visa a existência de indícios suficientes, não se vê razão para que do acórdão da Relação que o aprecie se possa recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça, por natureza destinado apenas à apreciação do direito.

  4. Quando o juiz absolve da acusação crime, mas fique provado o ilícito, ou nos casos de mera responsabilidade civil objectiva, não se vê razão para a inutilização de toda a actividade processual desenvolvida, obrigando as partes a um ulterior recurso ao juízo cível, com as consequentes e inevitáveis demoras e prejuízos materiais. Concede-se, assim, ao juiz a faculdade de condenar o réu em indemnização cível, mesmo que o absolva da acusação crime.

    Nestes termos: Usando da faculdade conferida pelo artigo 3.º, n.º 1, alínea 3), da Lei Constitucional n.º 6/75, de 26 de Março, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte: I Inquérito policial Artigo 1.º - 1. Proceder-se-á a inquérito policial, com base no qual poderá o feito ser introduzido em juízo, relativamente aos crimes puníveis com pena correccional, a menos que o arguido tenha sido preso e nessa situação haja sido ouvido em auto, caso em que haverá lugar a instrução preparatória, nos termos do Código de Processo Penal e legislação complementar.

  5. Quando o crime seja punível com prisão maior haverá sempre instrução preparatória.

    Art. 2.º - 1. No inquérito policial são admissíveis todos os meios de prova permitidos emdireito.

  6. As declarações, mesmo dos arguidos, e os depoimentos não serão reduzidos a auto nem assinados, sendo apenas sumariamente anotados.

  7. As buscas domiciliárias, autópsias e exames que possam ofender o pudor das pessoas examinadas dependem de prévia autorização do Ministério Público.

  8. No final do inquérito será elaborado um relatório pela autoridade que o organizou, no qual se fará a descrição sumária das diligências efectuadas e dos resultados obtidos.

    Art. 3.º - 1. Além do Ministério Público, todas as autoridades policiais devem, sempre que seja caso disso, proceder a inquérito policial dos crimes públicos de que tenham conhecimento.

  9. A instauração do inquérito policial quanto aos crimes semipúblicos depende da participação de quem tenha legitimidade para acusar e quanto aos crimes particulares da participação e de declaração de ulterior constituição de assistente.

  10. As autoridades que instaurarem inquérito policial deverão imediatamente dar notícia do facto ao Ministério Público da comarca territorialmente competente, o qual, a todo o tempo, o poderá avocar.

    Art. 4.º - 1. Logo que no inquérito policial se tenham recolhido indícios informatórios bastantes da infracção e dos seus agentes, será o mesmo remetido pela autoridade policial ao Ministério Público junto do tribunal territorialmente competente para o julgamento.

  11. Transcorridos que sejam trinta dias a contar do seu início, as autoridades policiais remeterão ao Ministério Público o inquérito, acompanhado do respectivo relatório, independentemente dos resultados nele obtidos até então.

  12. O Ministério Público poderá completar por si o inquérito ou devolvê-lo à autoridade que o organizou, a fim de esta o completar, indicando para tanto as diligências a efectuar e o prazo de realização.

    Art. 5.º - 1. O Ministério Público poderá proceder às diligências de averiguação no decurso do inquérito policial, directamente ou por intermédio dos funcionários judiciais que o coadjuvem na sua actividade averiguadora.

  13. O Ministério Público presidirá obrigatoriamente às buscas que ordenar.

    Art. 6.º O despacho do Ministério Público...

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