Decreto-Lei n.º 80/2018

Coming into Force14 Dezembro 2018
SeçãoSerie I
Data de publicação15 Outubro 2018
ÓrgãoPresidência do Conselho de Ministros

Decreto-Lei n.º 80/2018

de 15 de outubro

O XXI Governo Constitucional, no seu programa, estabelece como prioridades reforçar o poder do cidadão através da humanização dos serviços e melhorar a qualidade dos cuidados de saúde, através da observância de padrões de ética pelos profissionais, de forma a proteger a dignidade da pessoa humana.

O acelerado desenvolvimento biotecnológico verificado nas últimas décadas criou novos desafios às sociedades, cidadãos e comunidade científica. O aumento da esperança média e qualidade de vida respondeu e ultrapassou as expetativas dos cidadãos e desencadeou novas problemáticas de difícil resolução e dilemas fraturantes de compatibilização e conciliação dos direitos individuais e coletivos.

As comissões de ética para a saúde, reguladas através do Decreto-Lei n.º 97/95, de 10 de maio, têm vindo a desempenhar um papel fulcral na salvaguarda dos padrões de ética no âmbito das ciências da vida, por forma a proteger e garantir a dignidade e integridade humanas. Na perspetiva da defesa da vida humana e da respetiva qualidade, as questões de ética estendem-se a domínios sociais, filosóficos, teológicos, políticos e económicos, de integração frequentemente difícil. Neste âmbito, as comissões de ética para a saúde assinalaram um passo decisivo que permitiu passar da pura reflexão sobre os problemas éticos ao estabelecimento de normas consensuais de defesa da dignidade e integridade humanas.

Por outro lado, a investigação científica, particularmente a de índole clínica, tem vindo a contribuir de forma estratégica para a melhoria da saúde das populações e para o desempenho das unidades de saúde. Neste âmbito, a Lei n.º 21/2014, de 16 de abril, na sua redação atual, criou um novo quadro de referência para a investigação clínica com seres humanos em Portugal, no âmbito do conceito de estudos clínicos, generalizando o regime de apreciação da comissão de ética a todas as áreas da investigação clínica, reconhecendo as respetivas especificidades. No quadro da referida lei, é reforçado o papel da Comissão de Ética para a Investigação Clínica (CEIC) e das comissões de ética para a saúde, criando-se a Rede Nacional das Comissões de Ética para a Saúde (RNCES). A RNCES constitui a concretização da articulação entre as diferentes comissões de ética para a saúde institucionais e a CEIC, tendo em vista o desenvolvimento da ética de investigação em Portugal, reconhecendo também a importância de reforçar esta articulação no âmbito da ética assistencial.

Assim, passados 23 anos da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 97/95, de 10 de maio, que veio regular as comissões de ética para a saúde (CES) nos estabelecimentos de saúde, públicos e privados, importa rever o regime das CES. Esta revisão tem por intuito adaptar o regime jurídico à evolução registada em Portugal, no que respeita à importância e crescente emergência das questões de ética clínica ou assistencial e, bem assim, das exigências da investigação científica no seu primacial desígnio, que se traduz na indispensável reflexão que deverá dedicar-se à proteção devida ao ser humano.

O presente decreto-lei revê a regulação das CES, a sua composição, constituição, competências e modo de funcionamento, dotando-as de um instrumento atualizado e clarificador das suas competências, objetivos, direitos e deveres. Pretende-se assegurar o exercício da ciência médica e a realização de estudos de investigação clínica no estrito respeito pelo princípio da dignidade da pessoa humana e dos seus direitos fundamentais, no âmbito dos diversos níveis de cuidados de saúde. Importa, em particular, dotar as comissões de ética da capacidade de apoiar e incentivar a reflexão sobre as questões éticas, promovendo a formação e divulgação de informação no domínio da ética e bioética, nomeadamente desenvolvendo a capacidade de promover a integridade, a probidade e a transparência destas instituições, fomentando a confiança, a fiabilidade, a segurança e a integridade de todos os procedimentos. É, desta forma, reforçado o papel das comissões de ética no contexto da instituição em que se integram nas diversas vertentes relevantes, nomeadamente, assistencial, institucional, de investigação e de formação.

Assim, o presente decreto-lei desenvolve os aspetos legislativos referentes à ética assistencial e à ética de investigação clínica, dotando as CES de uma estrutura organizacional e agregadora, que exerça a sua influência a nível dos cuidados de saúde primários e hospitalares na esfera da saúde pública e, bem assim, a nível da prestação de cuidados de saúde que envolvam tecnologias avançadas da ciência médica.

Com o presente decreto-lei regulam-se as comissões de ética que funcionam não apenas nas instituições onde se realizam atos de saúde, mas também nas instituições onde se desenvolve investigação clínica, designadamente nas instituições de saúde, instituições de ensino superior e centros de investigação biomédica que desenvolvam investigação clínica, incluindo assim os estudos clínicos no âmbito da Lei n.º 21/2014, de 16 de abril.

No âmbito do presente decreto-lei, entende-se por ética clínica ou assistencial a assessoria e análise de conflitos éticos, decorrentes da prestação de cuidados de saúde aos utentes nas instituições de saúde, sejam elas públicas, privadas ou sociais. A ética clínica ou assistencial está assim ao serviço dos cidadãos e profissionais de saúde e visa aperfeiçoar e refletir sobre a dimensão ética da prática clínica e da qualidade dos serviços prestados.

Por fim, é de destacar a relevância da conceção de um novo regime harmonizado das comissões de ética, que passa a ser também aplicável às instituições de ensino superior e demais instituições onde se realize investigação clínica, nomeadamente nas que se encontrem integradas em centros académicos clínicos, permitindo a constituição, nesses casos, de uma única comissão de ética.

Foram ouvidos o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, a Comissão de Ética para a Investigação Clínica, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, o Conselho Nacional dos Centros Académicos Clínicos, o Grupo Coordenador da Rede Nacional das Comissões de Ética para a Saúde e a Associação Portuguesa de Bioética.

Foi ainda promovida a audição da Associação Redética.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

Artigo 1.º

Objeto e âmbito

1 - O presente decreto-lei estabelece os princípios e regras aplicáveis à composição, constituição, competências e funcionamento das comissões de ética que funcionam integradas em instituições de saúde dos setores público, privado e social, assim como em instituições de ensino superior que realizem investigação clínica e centros de investigação biomédica que desenvolvam investigação clínica.

2 - Para efeitos do presente decreto-lei considera-se investigação clínica a investigação conduzida em seres humanos ou em material de origem humana, tais como tecidos, espécimes e fenómenos cognitivos, para os quais um investigador interage diretamente com seres humanos.

3 - As comissões de ética têm como principal incumbência proceder à análise e reflexão sobre questões relacionadas com a ética e bioética.

Artigo 2.º

Natureza

1 - As comissões de ética são órgãos dotados de independência técnica e científica, de natureza consultiva.

2 - As comissões de ética são obrigatórias em:

a) Instituições de saúde do setor público, privado e social;

b) Instituições de ensino superior que realizem investigação clínica;

c) Centros de investigação biomédica que desenvolvam investigação clínica.

3 - As instituições de saúde, as instituições de ensino superior que realizem investigação clínica e os centros de investigação...

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