Decreto-Lei n.º 64/2016

Data de publicação11 Outubro 2016
SectionSerie I
ÓrgãoFinanças

Decreto-Lei n.º 64/2016

de 11 de outubro

O presente decreto-lei estabelece novas regras sobre o regime de acesso e troca automática de informações financeiras no domínio da fiscalidade, definindo, por um lado, as regras complementares para a implementação dos mecanismos de cooperação internacional e de combate à evasão fiscal estabelecidas no artigo 16.º do Regime de Comunicação de Informações Financeiras (RCIF), aprovado pelo artigo 239.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, considerando o estabelecido no chamado Foreign Account Tax Compliance Act (FATCTA), e, por outro lado, estabelecendo novas regras sobre a obrigatoriedade de cumprimento de normas de comunicação e diligência devida em relação a contas financeiras qualificáveis como sujeitas a comunicação de titulares ou beneficiários residentes noutros Estados-Membros da União Europeia ou em outras jurisdições participantes.

A importância da promoção ativa da troca automática de informações, particularmente as de natureza financeira, esteve subjacente às negociações entre os Estados Unidos da América e diversos outros países, incluindo Portugal, atendendo o disposto no FATCA, que determinaram, ao nível nacional, o estabelecimento de um conjunto de obrigações das instituições financeiras em matéria de identificação de determinadas contas e de comunicação de informações à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), nos termos previstos no RCIF. Ficaram, não obstante, por regulamentar, um conjunto de matérias complementares ao RCIF, designadamente, relacionadas com regimes de exclusão das obrigações aí previstas para determinadas pessoas, entidades ou contas financeiras, o desenvolvimento de regras e procedimentos de diligência devida relacionados com a identificação das contas sujeitas a comunicação e as regras, procedimentos e prazos aplicáveis no âmbito da obtenção e transmissão à AT de informações pelas instituições financeiras e demais aspetos administrativos.

Pretende-se, igualmente, promover um maior alargamento no acesso e troca automática de informações para finalidades fiscais, incidente sobre dados de contas financeiras, tomando como base a norma mundial única desenvolvida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, comummente designada como Common Reporting Standard (Norma Comum de Comunicação), a qual, por sua vez, se constituiu como matriz para as modificações introduzidas nos instrumentos de cooperação administrativa existentes ao nível da União Europeia, mediante a aprovação da Diretiva 2014/107/UE, do Conselho, de 9 de dezembro de 2014, que altera a Diretiva 2011/16/UE, no que respeita à troca automática de informações obrigatória no domínio da fiscalidade.

O estabelecimento de um mecanismo geral de acesso e troca automática de informações financeiras no domínio da fiscalidade e a garantia de uma cooperação administrativa mútua mais ampla, quer com outros Estados-membros da União Europeia, quer com outras jurisdições participantes com as quais Portugal deva efetuar troca automática de informação de contas financeiras no âmbito do Acordo Multilateral das Autoridades Competentes para a Troca Automática de Informações de Contas Financeiras, celebrado ao abrigo da Convenção relativa à Assistência Mútua em Matéria Fiscal, adotada em Estrasburgo, em 25 de janeiro de 1988, conforme revista pelo Protocolo de Revisão à Convenção relativa à Assistência Mútua em Matéria Fiscal, adotado em paris, em 27 de maio de 2010, constitui, portanto, o fundamento essencial da disciplina que se pretende consagrar no presente decreto-lei.

Com este enquadramento legal, consolidado num único ato normativo, estabelece-se uma abordagem coerente, uniforme e abrangente em matéria da troca automática de informações sobre contas financeiras, de modo a minimizar os custos tanto para as instituições financeiras, às quais são impostas obrigações de diligência e comunicação relativa a elementos de contas financeiras por estas mantidas, como para a AT.

Em concreto, consagra-se, em simultâneo, no ordenamento nacional, as normas jurídicas essenciais, quer para a regulamentação complementar do artigo 16.º do RCIF, quer para a transposição da referida Diretiva 2014/107/UE, do Conselho, de 9 de dezembro de 2014, quer para a implementação da Norma Comum de Comunicação.

Neste contexto, as disposições constantes do presente decreto-lei estabelecem, nomeadamente: (i) as categorias de instituições financeiras reportantes e de contas financeiras que ficam abrangidas pela nova disciplina de troca obrigatória e automática de informações, e os dados específicos sobre os quais se impõe a obrigação de comunicação à AT; (ii) as instituições financeiras que devem ser consideradas como não reportantes, bem como as contas que são qualificáveis como excluídas, porque, para além de apresentarem um baixo risco de serem utilizadas para efeitos de evasão fiscal, preenchem os requisitos normativos e/ou passam a estar, enquanto tal, expressamente elencadas numa lista definida a nível nacional pelo membro do Governo responsável pela área das finanças e comunicada à Comissão Europeia para publicação no Jornal Oficial da União Europeia; (iii) as informações financeiras concretas que devem ser objeto de comunicação e de troca, que passam a respeitar não só às categorias de rendimentos relevantes (juros, dividendos e outros rendimentos similares), mas também aos saldos de conta e produtos de venda de ativos financeiros, de modo a identificar situações de ocultação de património representativo de rendimentos ou ativos associada a práticas de evasão fiscal; (iv) o conjunto de procedimentos que devem ser aplicados pelas instituições financeiras reportantes em matéria de comunicação e diligência devida, de modo a que identifiquem, em relação a cada uma das contas financeiras que mantêm, o respetivo titular ou beneficiário, e delimitem o universo das contas e das pessoas que se encontram abrangidas pelo seu dever de comunicação à AT; (v) as regras que devem ser observadas no tratamento dos dados pelas instituições financeiras reportantes, pela AT e pelos Estados-Membros ou outras jurisdições de receção da informação trocada, de modo a salvaguardar os direitos fundamentais e os princípios em matéria de proteção dos dados pessoais.

A consagração desta disciplina jurídica - que é extensa e muito pormenorizada - é concretizada mediante: (i) a criação de regulamentação específica aplicável à implementação do RCIF e das obrigações assumidas no âmbito do FATCA; (ii) a alteração do regime legal que atualmente regula a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, revendo-se e aditando-se um conjunto significativo de disposições legais e um novo anexo ao Decreto-Lei n.º 61/2013, de 10 de maio, e procedendo-se à respetiva republicação; (iii) a introdução de ajustamentos no âmbito do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de dezembro, alterado pelas Leis n.os 32-B/2002, de 30 de dezembro, 50/2005, de 30 de agosto, e 53-A/2006, de 29 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 6/2013, de 17 de janeiro, pela Lei n.º 75-A/2014, de 30 de setembro, e pelo Decreto-Lei n.º 36/2016, de 1 de julho, sendo estes de carácter pontual, já que se entende não ser necessário alterar o âmbito do procedimento de inspeção, que pode comportar os controlos necessários à verificação do cumprimento dos procedimentos de comunicação e diligência devida que são exigíveis às instituições financeiras; (iv) a definição do quadro sancionatório aplicável em caso de incumprimento das obrigações de comunicação ou omissões e inexatidões praticadas pelas instituições financeiras reportantes, mediante a introdução de alterações ao Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho.

Face à devolução, sem promulgação, de um decreto anteriormente aprovado pelo Conselho de Ministros que disciplinava o regime de comunicação e acesso automático a informações financeiras relativas a residentes, o Governo retoma desde já a iniciativa legislativa na parte relativa à aplicação e transposição para a ordem interna das obrigações a que Portugal se obrigou por força de tratados internacionais e da Diretiva 2014/107/UE, do Conselho, de 9 de dezembro de 2014, e que não suscitaram, aliás, reserva quanto à sua promulgação.

Ciente das circunstâncias conjunturais que justificaram um juízo de inoportunidade política por parte do Presidente da República, o Governo concluirá a disciplina desta matéria, essencial ao combate à fraude e evasão fiscal, logo que tais circunstâncias estejam ultrapassadas.

Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas, o Banco de Portugal, a Associação Portuguesa de Seguradores e da Associação Portuguesa de Fundos de Investimentos, Pensões e Patrimónios e a Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Foi promovida a audição da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, da Associação Portuguesa de Bancos, da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões e da AEM - Associação de Empresas Emitentes de Valores Cotados em Mercado.

Assim:

No uso da autorização Legislativa concedida pelo artigo 188.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, e nos termos do artigo 16.º do Regime de Comunicação de Informações Financeiras aprovado pelo artigo 239.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro e das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

1 - O presente decreto-lei:

a) Aprova a regulamentação complementar prevista no artigo 16.º do Regime de Comunicação de Informações Financeiras (RCIF), aprovado pelo artigo 239.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro;

b) Transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva 2014/107/UE do Conselho, de 9 de dezembro de 2014, que altera a Diretiva 2011/16/UE no que respeita à troca automática de informações obrigatória no domínio da fiscalidade.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o presente decreto-lei:

a)...

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