Decreto-Lei n.º 148/2015 - Diário da República n.º 150/2015, Série I de 2015-08-04

Decreto-Lei n.º 148/2015

de 4 de agosto

Nos termos da Constituição, é tarefa fundamental do Estado a proteção e valorização do património cultural do povo português, tendo a Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, estabelecido as bases da política e do regime de proteção e valorização do património cultural, remetendo a respetiva regulamentação para legislação de desenvolvimento.

Aquele dever do Estado de proteção e valorização do património cultural, enquanto alicerce da memória e da entidade coletiva e fator de desenvolvimento económico e social, tem, necessariamente, de atender à diversidade dos bens culturais, tipificados pela Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, em bens imóveis, bens móveis e património imaterial.

De igual modo, no âmbito da salvaguarda e valorização do património cultural, enquanto elemento vivificador da identidade cultural comum, há que encontrar o justo equilíbrio entre o interesse público da prossecução da função social dos bens culturais e o direito, constitucionalmente consagrado, à propriedade privada que ao Estado cumpre, igualmente, assegurar.

Em matéria de bens culturais móveis, dada a sua natureza específica e por, diversamente dos imóveis, serem transacionáveis por mero contrato verbal e não se encon-

trarem sujeitos a registo, esta questão reveste -se de maior acuidade, o que justifica que, no âmbito da regulamentação da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, apenas os bens móveis classificados ou em vias de classificação tenham ficado abrangidos pelo Decreto -Lei n.º 138/2009, de 15 de junho, que criou o Fundo de Salvaguarda do Património Cultural, e pelo Decreto -Lei n.º 140/2009, de 15 de junho, que estabeleceu o regime jurídico dos estudos, projetos, relatórios, obras ou intervenções sobre bens culturais classificados, ou em vias de classificação, de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal.

No entanto, é amplamente reconhecido que importa proceder ao desenvolvimento da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, no que respeita a bens móveis, quanto aos procedimentos de classificação e de inventariação previstos nos artigos 23.º e seguintes, a fim de, à semelhança do estabelecido pelo Decreto -Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos -Leis n.os 115/2011, de 5 de dezembro, e 265/2012, de 28 de dezembro, para os bens imóveis, serem definidas, com clareza, as diversas fases procedimentais.

De igual modo, face ao tempo decorrido desde a entrada em vigor da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, urge estabelecer as regras necessárias à conversão das anteriores formas de proteção de bens culturais móveis, ao abrigo de legislação que remonta às décadas de 30 e 50 do século passado e cujos efeitos se mantêm em vigor nos termos do artigo 112.º, a fim de se determinar se os bens por elas abrangidos devem ser objeto de classificação, identificando-se a respetiva graduação, ou de mera inventariação ou,

5348 ainda, se à luz dos critérios atuais para a proteção e valorização do património cultural já não faz sentido que sobre esses bens persistam os ónus então estabelecidos.

Quanto à exportação, expedição, importação e admissão de bens móveis, é igualmente reconhecida a necessidade de clarificação dos respetivos condicionalismos e de simplificação dos procedimentos aplicáveis, designadamente no que se refere à circulação internacional de obras de autor vivo e que sejam propriedade do autor, bem como, sem prejuízo das regras comunitárias em vigor para a exportação de bens culturais para fora da União Europeia e das convenções internacionais de que é parte o Estado Português, no que concerne à saída do território nacional de bens cuja antiguidade, à partida, não justifica a imposição de restrições, as quais podem, sempre que fundamentadamente necessário, verificar -se mediante a classificação dos bens.

Neste contexto, o presente decreto -lei estabelece o regime da classificação e da inventariação dos bens móveis de interesse cultural, bem como as regras aplicáveis à exportação, expedição, importação e admissão dos bens culturais móveis.

Foram ouvidos o Conselho Nacional de Cultura, a Conferência Episcopal Portuguesa e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.

Assim:

No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, e nos termos das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

O presente decreto -lei estabelece o regime da classificação e da inventariação dos bens móveis de interesse cultural, bem como as regras aplicáveis à exportação, expedição, importação e admissão dos bens culturais móveis.

Artigo 2.º

Definições

1 - Para efeitos do disposto no presente decreto -lei, entende-sepor:

  1. «Administração patrimonial competente»:

  2. A Biblioteca Nacional de Portugal, quanto a bens do património bibliográfico;

    ii) A Direção -Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, quanto a bens do património arquivístico e fotográfico;

    iii) A Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema, I. P., quanto a bens do património audiovisual;

    iv) A Direção -Geral do Património Cultural, relativamente aos demais bens culturais móveis;

  3. «Admissão», a entrada no território nacional de bens culturais móveis provenientes de um Estado -membro da União Europeia;

  4. «Bens culturais móveis», os bens móveis elencados no artigo 55.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro;

  5. «Expedição», a saída do território nacional de bens culturais móveis com destino a outro Estado -membro da União Europeia;

  6. «Exportação», a saída do território nacional de bens culturais móveis com destino a país terceiro;

  7. «Importação», a entrada em território nacional de bens culturais móveis provenientes de um país terceiro;

  8. «Procedimento de classificação», o procedimento administrativo que culmina no ato final de classificação através do qual se reconhece que certo bem móvel, ou conjunto de bens móveis, possui um inestimável valor cultural, dando lugar ao registo patrimonial de classificação;

  9. «Procedimento de inventariação», o procedimento administrativo que culmina no ato final de inventariação através do qual se reconhece que certo bem móvel, ou conjunto de bens móveis, possui interesse cultural relevante mas em relação ao qual o regime inerente à classificação se mostra desproporcionado, dando lugar ao registo patrimonial de inventário.

    2 - O disposto na alínea a) do número anterior não se aplica aos bens móveis de interesse municipal, nem ao respetivo procedimento de classificação.

    3 - A expedição e a exportação podem ser definitivas ou temporárias ou, ainda, temporárias com possibilidade de venda.

    4 - A admissão e a importação podem ser definitivas ou temporárias.

    Artigo 3.º

    Classificação e graduação do interesse cultural

    1 - Um bem móvel ou um conjunto de bens móveis pode ser classificado como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal.

    2 - A graduação do interesse cultural, para efeitos do disposto no número anterior, obedece aos seguintes critérios:

  10. Um bem, ou um conjunto de bens, considera -se de interesse nacional quando a respetiva proteção e valorização, no todo ou em parte, represente um valor cultural de significado relevante para a Nação;

  11. Um bem, ou um conjunto de bens, considera -se de interesse público quando a respetiva proteção e valorização represente um valor cultural de importância nacional, mas para o qual o regime de proteção inerente à classificação como de interesse nacional se mostre desproporcionado; c) Consideram -se de interesse municipal os bens, ou os conjuntos de bens, cuja proteção e valorização, no todo ou em parte, representem um valor cultural de significado predominante para um determinado município.

    3 - A designação de «tesouro nacional» é atribuída aos bens móveis, ou conjuntos de bens móveis, classificados como de interesse nacional.

    4 - A graduação do interesse cultural de bens arquivísticos, audiovisuais, bibliográficos e fotográficos obedece ainda ao disposto, respetivamente, nos n.os 1 e 2 do artigo 83.º, n.º 3 do artigo 84.º, nos artigos 86.º e 87.º e nos n.os 3 e 4 do artigo 90.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro.

    5 - Nos termos do artigo 26.º da Lei n.º 47/2004, de 19 de agosto, os inventários museológicos e outros registos que identificam bens culturais elaborados pelos museus públicos e privados consideram -se património arquivístico de interesse nacional.6 - Consideram -se igualmente património arquivístico de interesse nacional os inventários e outros registos que identificam bens culturais elaborados por entidades integradas na Rede Portuguesa de Arquivos e na Rede Nacional de Bibliotecas Públicas.

    7 - Nos termos do artigo 18.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, os bens móveis pertencentes a particulares só são passíveis de classificação:

  12. Como de interesse nacional, quando a sua degradação ou o seu extravio constituam perda irreparável para o património cultural;

  13. Como de interesse público, os que sejam de elevado apreço e cuja exportação definitiva do território nacional possa constituir dano grave para o património cultural;

  14. Como de interesse municipal, apenas com o consentimento dos respetivos proprietários.

    8 - A classificação de bens culturais de autor vivo depende do consentimento do respetivo proprietário, salvo no caso de classificação dos elementos matriciais de bens audiovisuais ou fonográficos, ou na sua falta, de uma das respetivas cópias, bem como em situações excecionais devidamente justificadas por despacho do membro do Governo responsável pela área da cultura.

    9 - A identidade do proprietário, do possuidor ou do titular de outro direito real sobre os bens móveis, assim como quaisquer elementos que permitam identificar a localização dos bens, não podem ser objeto de divulgação no ato de classificação, nem em qualquer fase do procedimento de classificação, sem o consentimento expresso daqueles.

    10 - Não podem ser classificados os bens móveis que se...

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