Decreto-Lei n.º 122/2017

Coming into Force22 Setembro 2017
SeçãoSerie I
Data de publicação21 Setembro 2017
ÓrgãoAmbiente

Decreto-Lei n.º 122/2017

de 21 de setembro

A Convenção sobre a Diversidade Biológica, ratificada por Portugal através do Decreto n.º 21/93, de 21 de junho, é o principal instrumento internacional sobre a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável das suas componentes e a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da utilização dos recursos genéticos.

A referida Convenção reconhece os direitos soberanos dos Estados sobre os recursos genéticos sob sua jurisdição, e a sua autoridade para determinar o acesso a esses recursos. Contudo, dá escassa orientação sobre a forma como, na prática, deve funcionar o processo de acesso aos recursos genéticos e da partilha dos benefícios resultantes da utilização desses recursos e dos conhecimentos tradicionais a eles associados.

Tornou-se, pois, necessário estabelecer um quadro de obrigações claro, aplicável à utilização de recursos genéticos ao longo da cadeia de valor, para criar um contexto de transparência que facilite o acesso a amostras de recursos genéticos de qualidade, com um nível elevado de segurança jurídica, e garanta a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da sua utilização.

Assim, no âmbito da 10.ª Conferência das Partes da Convenção sobre a Diversidade Biológica, realizada em 2010 em Nagoya, no Japão, foi adotado o Protocolo sobre o acesso a recursos genéticos e a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da sua utilização (doravante, Protocolo de Nagoya).

O Protocolo de Nagoya, também designado por Protocolo ABS (Access and Benefit Sharing), estabelece um quadro legal transparente essencial para a efetiva implementação do terceiro objetivo da Convenção sobre a Diversidade Biológica: a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da utilização dos recursos genéticos, através do estabelecimento de condições previsíveis de acesso aos mesmos e da promoção da partilha justa e equitativa dos benefícios quando os recursos genéticos que lhes dão origem são utilizados fora da jurisdição da Parte que os forneceu.

Através do Decreto n.º 7/2017, de 13 de março, Portugal aprovou o Protocolo de Nagoya, que já havia sido ratificado pela União Europeia a 16 de maio de 2014, estando em vigor desde 12 de outubro do mesmo ano.

A Península Ibérica é uma das zonas da Europa com maior biodiversidade. A localização geográfica e as características geofísicas e edafoclimáticas do território português, modeladas pela intervenção humana com intensidade e significado variáveis consoante as regiões e as épocas, deram origem a uma grande variedade de biótopos, ecossistemas e paisagens, mais ou menos humanizadas, que propiciam a existência de um elevado número de habitats que albergam uma grande diversidade de espécies com os seus múltiplos genótipos. Portugal possui uma extensa linha de costa com níveis de poluição relativamente reduzidos, mantendo os ecossistemas costeiros e marinhos grande riqueza em termos de valores faunísticos e florísticos. Também a Zona Económica Exclusiva e a Plataforma Continental nacionais, pelas suas extensões e características, encerram um considerável potencial em termos de investigação, bioprospeção e exploração de recursos genéticos.

Neste contexto, importa não esquecer que os recursos genéticos - o património genético constituído pelos recursos tanto selvagens como cultivados ou domesticados - desempenham um papel significativo e crescente em muitos setores económicos. Um conjunto alargado de intervenientes, incluindo investigadores do mundo académico e empresas de diferentes setores da indústria, como as da seleção e melhoramento vegetal, horticultura e criação de animais, controlo biológico, cosmética, alimentação e bebidas, biotecnologia e indústria farmacêutica, utilizam recursos genéticos para fins de investigação e desenvolvimento.

Tendo em vista apoiar a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da utilização de recursos genéticos em conformidade com o Protocolo de Nagoya, foi adotado o Regulamento (UE) n.º 511/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, que estipula as obrigações aplicáveis aos utilizadores de recursos genéticos. Posteriormente, foi também aprovado o Regulamento de Execução (UE) 2015/1866, da Comissão, de 13 de outubro de 2015, que estabelece as suas normas de execução no que respeita ao registo de coleções, à monitorização do cumprimento pelos utilizadores e às boas práticas. Estes instrumentos impõem o exercício da devida diligência, de modo que o acesso aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais a eles associados se encontre em conformidade com as disposições aplicáveis, e para que os benefícios decorrentes da sua utilização sejam partilhados justa e equitativamente.

Deste modo, o presente decreto-lei concretiza as medidas tendentes à aplicação nacional do regime europeu, que embora diretamente aplicável na ordem jurídica interna, carece de definição das autoridades competentes, dos procedimentos internos de controlo e do estabelecimento do regime sancionatório aplicável, por determinação expressa do n.º 1 do artigo 6.º e do n.º 1 do artigo 11.º do Regulamento (UE) n.º 511/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014.

Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

1 - O presente decreto-lei visa assegurar a aplicação no ordenamento jurídico nacional do disposto:

a) No Regulamento (UE) n.º 511/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativo às medidas respeitantes ao cumprimento pelo utilizador do Protocolo de Nagoya relativo ao acesso aos recursos genéticos e à partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da sua utilização na União, doravante designado por Regulamento;

b) No Regulamento de Execução (UE) 2015/1866, da Comissão, de 13 de outubro de 2015, que estabelece as suas normas de execução no que respeita ao registo de coleções, à monitorização do cumprimento pelos utilizadores e às boas práticas, doravante designado por Regulamento de Execução.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, identificam-se as autoridades competentes, fixam-se as medidas de monitorização e de controlo no território nacional, estabelecem-se os procedimentos para o registo de coleções e determina-se o regime sancionatório aplicável ao incumprimento do Regulamento e do Regulamento de Execução.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

O presente decreto-lei é aplicável aos utilizadores de recursos genéticos e aos utilizadores de conhecimentos tradicionais associados aos recursos genéticos na aceção do Regulamento, sem prejuízo da legislação específica aplicável, nomeadamente do disposto no Decreto-Lei n.º 118/2002, de 20 de abril, que estabelece o regime jurídico do registo, conservação, salvaguarda legal e transferência do material vegetal autóctone com interesse actual ou potencial para a actividade agrária, agroflorestal e paisagística.

Artigo 3.º

Definições

Aplicam-se ao presente decreto-lei as as definições do Regulamento, entendendo-se ainda por:

a) «Colocação no mercado da União», a primeira disponibilização no mercado da União de um produto desenvolvido com base na utilização de recursos genéticos e de conhecimentos tradicionais a eles associados, entendendo-se por «disponibilização» o fornecimento por quaisquer meios, para distribuição, consumo ou utilização no mercado da União no decurso de uma atividade comercial, a título oneroso ou gratuito. A colocação no mercado não abrange ensaios pré-comerciais, incluindo ensaios clínicos, de campo ou de resistência a pragas, nem a disponibilização de medicamentos não autorizados, a fim de fornecer opções de tratamento para pacientes individuais ou grupos de pacientes;

b) «Financiamento de investigação», qualquer contribuição financeira sob a forma de subvenção para efeitos de investigação, quer de origem comercial ou não comercial, não abrangendo recursos orçamentais internos de entidades públicas ou privadas;

c) «Resultado da utilização», os produtos, incluindo precursores, predecessores e partes de produto a incorporar em produtos finais, bem como modelos ou esboços com base nos quais seja possível realizar a fabricação/produção sem nenhuma outra utilização de recursos genéticos e de conhecimentos tradicionais a eles associados.

CAPÍTULO II

Autoridades competentes e Grupo Consultivo

Artigo 4.º

Autoridades competentes

1 - O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I. P. (ICNF, I. P.), é a autoridade nacional competente para efeitos da aplicação do presente decreto-lei e do Regulamento, sem prejuízo do disposto no artigo 9.º

2 - Os órgãos próprios da Região Autónoma dos Açores e da Região Autónoma da Madeira procedem à designação das respetivas autoridades regionais competentes.

Artigo 5.º

Grupo Consultivo ABS

1 - É criado o Grupo Consultivo sobre o acesso aos recursos genéticos e a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da sua utilização (adiante...

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