Decreto-Lei n.º 175/80, de 29 de Maio de 1980

Decreto-Lei n.º 175/80 de 29 de Maio A transformação operada nas últimas décadas nos sectores de produção e distribuição reflectiu-se significativamente sobre o funcionamento do sistema de transportes de mercadorias chamado a servir uma procura constantemente modificada, quer nos aspectos quantitativos de volume e orientação das relações de tráfego, quer nos aspectos qualitativos inerentes à progressiva valorização do factor tempo.

Não foi, todavia, essa transformação acompanhada das necessárias adaptações legislativas, conformando-se o subsector dos transportes rodoviários de mercadorias por um quadro normativo que é hoje, no essencial, idêntico ao estabelecido em 1948 através do Decreto n.º 37272, de 31 de Dezembro.

O presente diploma constitui um esforço de criação de um novo quadro regulador do acesso e funcionamento do mercado dos transportes públicos ocasionais de mercadorias mais adequado às realidades dos nossos dias e às solicitações decorrentes da futura integração europeia, ao mesmo tempo que tem por finalidade corrigir várias deficiências que se manifestam no exercício da actividade transportadora.

Procurou-se dar o adequado enquadramento jurídico aos aspectos fundamentais do acesso à profissão e ao mercado dos transportes públicos ocasionais de mercadorias, bem como à organização e funcionamento desse mercado.

Assim, enquanto no respeitante ao acesso à profissão se pretende garantir que a actividade transportadora seja exercida por empresas idóneas, tendo em vista uma melhoria de qualidade dos serviços prestados, procurou-se também, através das regras que ora se estabelecem para o acesso ao mercado dos transportes rodoviários e sua organização, acautelar os interesses da coordenação global do sistema de transportes e do funcionamento harmónico daquele mercado.

Processualmente, a observância dos requisitos de acesso à profissão precede de modo geral o acesso ao mercado, independentemente da espécie de transportes a que respeite, fixando-se, para cada uma, requisitos próprios de acesso, cujos critérios de definição tiverem em conta os objectivos de coordenação intermodal dos transportesterrestres.

Deste modo, nos casos em que para as acções dessa coordenação relevam os aspectos de complementaridade - transporte de mercadorias em geral a curtas distâncias -, permite-se o acesso ao mercado de forma livre a quantos previamente hajam demonstrado possuir condições para o exercício da indústria.

Já o mesmo não sucede quando aquela coordenação se colocam situações de concorrência e suas influências sobre a repartição do tráfego entre os diferentes modos de transporte terrestre, nomeadamente rodovia-ferrovia. Neste caso, impõem-se mecanismos condicionantes do acesso ao mercado que se traduzem por um contrôle de capacidade de transporte ou pela subordinação a programas estabelecidos.

No que concerne à organização do mercado, dois pontos merecem destaque pela forma como poderão alterar as condições actuais do exercício da actividade transportadora. Trata-se, por um lado, da fixação dos contingentes em termos de capacidade de carga e sua repartição pelas empresas sob a forma de dotações, deixando-lhes a iniciativa de gerir essas dotações do modo que melhor se adapte às exigências da procura. Por outro lado, com a finalidade de obter uma maior ligação das empresas às regiões que devem servir, estabelece-se uma forma de afectação dos veículos ao espaço, que abandona o actual rigor pontual - afectação dos veículos a locais de estacionamento -, que na prática se tem traduzido por um quase completo desinteresse pela garantia de satisfação das necessidades regionais de transportes.

Com este propósito é criado o conceito de área de prestação predominante de serviços, no âmbito da qual as respectivas empresas são obrigadas a manter a sua organização comercial e cujas necessidades devem satisfazer primordialmente.

Tanto o conceito de dotações de carga como o de área de prestação predominante de serviços encontram-se referenciados ao concelho. Admite-se, no entanto, a criação de agrupamentos de concelhos, permitindo, assim, o alargamento daquela área e, consequentemente, um melhor dimensionamento das dotações de carga que se lhe reportam, bem como uma gradual caracterização de regiões homogéneas sob o ponto de vista dos transportes de carga, que possibilite uma futura redefinição da tipologia de serviços por áreas geográficas.

No domínio do funcionamento do mercado importa ainda referir as medidas destinadas a facilitar a constituição de unidades empresariais de maior dimensão. Não cabendo no âmbito do presente diploma a criação de incentivos, de ordem fiscal ou financeira, ao redimensionamento da indústria, inserem-se, contudo, algumas soluções susceptíveis de apoiar medidas mais eficazes nesta matéria. Estão neste caso a eliminação de exigências quanto a limites mínimos de carga, no que respeita a operações de concentração, e a possibilidade de transformação de empresas singulares em colectivas.

De entre as medidas destinadas a regularizar as actuais condições de funcionamento do mercado salienta-se, por um lado, a possibilidade de alargamento do campo de actuação dos industriais já estabelecidos - muitos dos quais se têm visto impedidos, há longos anos, de aumentar as suas frotas ou de alargar os raios de acção dos seus veículos - e, por outro lado, a legalização das situações de realização sistemática e dominante de transportes por conta de outrem a coberto de licenças para o transporte por conta própria, aproveitando, tanto quanto possível, a maior abertura nas condições de acesso ao mercado que se estabelecem nas curtas distâncias, mas permitindo-se ainda o acesso à média distância, de forma gradual e em certas proporções.

Refere-se, finalmente, que o presente decreto-lei, com o intuito de sistematizar, concentra uma parcela muito substancial das disposições respeitantes a transportes públicos ocasionais de mercadorias, que até ao presente se encontravam dispersas por legislação vária.

Assim: O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte: CAPÍTULO I Conceito de transporte público ocasional de mercadorias ARTIGO 1.º 1 - Considera-se transporte público ocasional de mercadorias o transporte remunerado, por conta de outrem, não regular, efectuado com viaturas automóveis, mediante a utilização do veículo no conjunto ou por fracção da sua capacidade de carga.

2 - Consideram-se regulares os transportes de mercadorias em que os veículos são utilizados por fracção da sua capacidade de carga, segundo itinerários e frequências previamente aprovados, e explorados em regime de concessão.

CAPÍTULO II Acesso à actividade ARTIGO 2.º (Idoneidade) 1 - As pessoas singulares que se dediquem ou pretendam dedicar-se ao transporte público ocasional de mercadorias deverão comprovar documentalmente a inexistência dos seguintes factos: a) Inibição do exercício do comércio por ter sido declarada falência ou insolvência; b) Condenação, com trânsito em julgado, em pena de prisão superior a um ano, não suspensa nem convertida em multa, por crime doloso contra a propriedade; c) Condenação, com trânsito em julgado, em pena superior a seis meses de prisão, por crime doloso contra a saúde pública ou economia nacional; d) Condenação pela prática de concorrência ilícita ou desleal.

2 - Idêntica comprovação deve ser exigida aos administradores, directores ou gerentes das pessoas colectivas.

ARTIGO 3.º (Capacidade profissional) 1 - É condição necessária para a exploração da actividade de transportes públicos ocasionais de mercadorias por parte de pessoas colectivas que, pelo menos, um dos seus administradores, directores ou gerentes reúna as condições de capacidade profissional e as coloque ao serviço exclusivo de uma só empresa com permanência eefectividade.

2 - As condições de capacidade profissional referidas no número anterior são igualmente exigíveis às pessoas singulares.

3 - As condições de capacidade profissional, bem como os casos em que pode ser limitada, serão estabelecidas através de portaria.

ARTIGO 4.º (Capacidade financeira) As pessoas singulares ou colectivas não podem exercer a actividade de transportes públicos ocasionais de mercadorias...

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