Decreto-Lei n.º 282/77, de 05 de Julho de 1977

Decreto-Lei n.º 282/77 de 5 de Julho 1. A organização do exercício da medicina iniciou-se em Portugal com a criação, em 1898, da Associação dos Médicos Portugueses.

  1. Em 24 de Novembro de 1938, pelo Decreto-Lei n.º 29171, foi criada a Ordem dos Médicos, abrangendo fundamentalmente aqueles médicos que exerciam a medicina como profissão liberal.

  2. Factores como a necessidade de separar a acção disciplinar da acção directiva ou administrativa e a necessidade de dar a um conjunto de importantes princípios de carácter deontológico adequada expressão jurídica, bem assim como a evolução social, levaram à revogação dos estatutos aprovados pelo decreto-lei atrás referido e à sua substituição por um estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 40651, de 21 de Junho de1956.

    Este Estatuto, integrado na ordem política então vigente, ainda que respeitando integralmente a defesa da deontologia e da técnica pelo órgão associativo dos médicos, a quem conferia também acção disciplinar, não fora, no entanto, aprovado pelos médicos, mas resultara tão-somente de decisão governamental, no uso dos poderes que a Constituição de 1933 permitia.

  3. A evolução da sociedade portuguesa e as alterações que se foram estabelecendo ao longo dos tempos no sentido de uma maior interferência dos serviços estatais na prestação de cuidados médicos às populações como meio de garantir de forma organizada o direito à saúde, e do qual foi exemplo a criação dos Serviços Médico-Sociais da Previdência, vieram dar progressivo relevo à medicina exercida por conta de outrem e mostrar incapaz e desactualizada a regulamentação existente.

  4. Os acontecimentos que se sucederam após 25 de Abril de 1974 e as transformações sociais surgidas acentuaram a necessidade de adequar o Estatuto da Ordem aos novos condicionalismos e filosofia sociais.

  5. Em resultado dos trabalhos desenvolvidos foi elaborado novo projecto de estatuto, culminando todo o processo com a consulta aos médicos e votação democrática, levando à sua aprovação por esmagadora percentagem de votos favoráveis.

  6. Este Estatuto, além de abranger todos os médicos no exercício da sua profissão, mostra feição marcadamente descentralizadora e respeito integral das liberdades democráticas.

    Exigindo que a Ordem dos Médicos, agora renovada, exerça a sua actividade com total independência em relação ao Estado, formações políticas ou outras organizações, o estatuto reconhece e defende que a defesa dos legítimos interesses dos médicos passe em primeiro lugar pelo exercício de uma medicina humanizada que respeite o direito à saúde de todos os cidadãos, nele se consagrando ainda o princípio da criação de um Serviço Nacional de Saúde, no qual os médicos terão necessariamente papel preponderante e fundamental.

  7. Não pode deixar de caber ao Governo, no uso dos poderes legislativos que lhe são próprios, a aprovação do Estatuto da Ordem dos Médicos, dados os importantes fins públicos que esta prossegue, a necessidade de ser conferida à inscrição na Ordem carácter obrigatório, a atribuição de funções deontológicas e de poder disciplinar. De resto, a revogação do anterior estatuto, aprovado por decreto-lei, teria sempre de ser feita por via legislativa.

    Assim, o Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte: Artigo 1.º A Ordem dos Médicos, instituída pelo Decreto-Lei n.º 29171, de 24 de Novembro de 1938, passa a reger-se pelo estatuto anexo ao presente diploma.

    Art. 2.º Fica revogado o Estatuto da Ordem dos Médicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 40651, de 21 de Junho de 1956.

    Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Mário Soares - Armando Bacelar.

    Promulgado em 18 de Junho de 1977.

    Publique-se.

    O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.

    ESTATUTO DA ORDEM DOS MÉDICOS CAPÍTULO I Da denominação, sede e âmbito Artigo 1.º A Ordem dos Médicos abrange os licenciados em Medicina que exerçam ou tenham exercido em qualquer regime de trabalho a profissão médica.

    Art. 2.º - 1. A Ordem dos Médicos é de âmbito nacional, tem a sua sede em Lisboa e é constituída por três secções regionais - Norte, Centro e Sul - com sede, respectivamente, no Porto, Coimbra e Lisboa.

  8. A Ordem poderá criar, sempre que o entenda necessário à prossecução dos seus fins, secções, delegações ou outras formas de representação, nomeadamente nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.

    Art. 3.º A área geográfica de cada secção será definida tendo em atenção a regionalização dos serviços de saúde, a divisão administrativa do território e a vontade expressa e fundamentada dos médicos nas assembleias regionais.

    CAPÍTULO II Dos princípios fundamentais e fins Art. 4.º - 1. A Ordem dos Médicos reconhece que a defesa dos Legítimos interesses dos médicos pressupõe o exercício de uma medicina humanizada que respeite o direito à saúde de todos os cidadãos.

  9. A Ordem dos Médicos exerce a sua acção com total independência em relação ao Estado, formações políticas, religiosas ou outras organizações.

  10. O sistema democrático regula a orgânica e vida interna da Ordem dos Médicos, constituindo-se o seu contrôle um dever e um direito de todos os seus associados, nomeadamente no que respeita à eleição e destituição de todos os seus dirigentes e à livre discussão de todas as questões da sua vida associativa.

  11. A liberdade de opiniões e o livre jogo democrático previstos no número anterior e garantidos no presente Estatuto não justificam a constituição de quaisquer organismos autónomos dentro da Ordem dos Médicos que possam falsear ou influenciar as regras normais da democracia e possam conduzir à divisão entre os seus membros.

    Art. 5.º A Ordem dos Médicos poderá aderir a quaisquer uniões ou federações de associações médicas e deverá colaborar com os demais técnicos de saúde, através das respectivas organizações profissionais, no interesse da defesa e promoção da saúde.

    Art. 6. A Ordem dos Médicos tem por finalidades essenciais: a) Defender a ética, a deontologia e a qualificação profissional médicas, a fim de assegurar e fazer respeitar o direito dos utentes a uma medicina qualificada; b) Fomentar e defender os interesses da profissão médica a todos os níveis, nomeadamente no respeitante à promoção sócio-profissional, à segurança social e às relações de trabalho; c) Promover o desenvolvimento da cultura médica e concorrer para o estabelecimento e aperfeiçoamento constante do Serviço Nacional de Saúde, colaborando na política nacional de saúde em todos os aspectos, nomeadamente no ensino médico e carreirasmédicas; d) Dar parecer sobre todos os assuntos relacionados com o ensino, com o exercício da medicina e com a organização dos serviços que se ocupem da saúde, sempre que julgue conveniente fazê-lo, junto das entidades oficiais competentes ou quando por estas for consultada; e) Velar pelo exacto cumprimento da lei, do presente Estatuto e respectivos regulamentos, nomeadamente no que se refere ao título e à profissão de médico, promovendo procedimento judicial contra quem o use ou a exerça ilegalmente; f) Emitir a cédula profissional e promover a qualificação profissional dos médicos pela concessão de títulos de diferenciação e pela participação activa no ensino pós-graduado.

    Art. 7.º Para a prossecução dos seus fins a Ordem dos Médicos deve: a) Informar os médicos de tudo quanto diga respeito às necessidades e aos interesses das populações no campo da saúde; b) Criar e dinamizar estruturas que velem pela ética, pela deontologia e pela qualificação profissional médicas; c) Criar e dinamizar departamentos que directa ou indirectamente possam interessar aosmédicos; d) Assegurar uma gestão correcta dos seus fundos.

    CAPÍTULO III Da inscrição, deveres e direitos SECÇÃO I Da inscrição Art. 8.º O exercício da medicina depende da inscrição na Ordem dos Médicos.

    Art. 9.º Só podem inscrever-se na Ordem dos Médicos os portugueses e estrangeiros licenciados em Medicina por escola superior portuguesa ou estrangeira, desde que, neste último caso, tenham obtido equivalência oficial de curso devidamente reconhecida pela Ordem dos Médicos.

    Art. 10.º - 1. A inscrição será requerida pelo interessado ao conselho regional em cuja área o requerente tiver o seu domicílio fiscal.

  12. A recusa da inscrição deve ser notificada ao requerente, podendo este recorrer da decisão para o Conselho Nacional Executivo.

    Art. 11.º Será anulada a inscrição na Ordem dos Médicos: a) Aos que hajam sido punidos com pena de expulsão; b) Aos que a solicitarem, por terem deixado, voluntariamente, de exercer a actividade profissional; c) Aos que deixarem de pagar as quotas durante um período de seis meses e que, depois de avisados para as pagar, o não fizerem no prazo de um mês após a recepção do aviso.

    Art. 12.º - 1. Por deliberação unânime do Conselho Nacional Executivo, mediante parecer de uma comissão de peritos especialmente nomeada para o efeito, poderão ser impedidos de exercer, total ou parcialmente, a sua profissão os médicos para ela inabilitados física ou mentalmente.

  13. A comissão de peritos será constituída por cinco membros, sendo dois nomeados pelo conselho regional da secção a que o médico pertença, dois pelo interessado e um pelo Conselho Nacional Executivo.

  14. Se o interessado não estiver em condições de fazer a nomeação a que se refere o número anterior, deverá a mesma ser feita pela pessoa a quem legalmente caberia a tutela ou curatela nos casos de interdição ou inabilitação judicialmente declaradas.

  15. Da deliberação do Conselho Nacional Executivo cabe recurso para os tribunais administrativos.

    SECÇÃO II Dos deveres e direitos Art. 13.º São deveres dos médicos: a) Cumprir o presente Estatuto e respectivos regulamentos; b) Cumprir as normas deontológicas que regem o exercício da profissão médica; c) Guardar segredo profissional; d) Participar nas actividades da Ordem e manter-se delas informado, nomeadamente tomando parte nas assembleias ou grupos de trabalho; e) Desempenhar as funções para que cada um for eleito ou designado; f) Cumprir e fazer...

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