Decreto-Lei n.º 257/96, de 31 de Dezembro de 1996

Decreto-Lei n.º 257/96 de 31 de Dezembro 1 - A dinâmica que caracteriza a economia nacional e internacional dos últimos anos induz a actualizações sucessivas do Código das Sociedades Comerciais, como tem acontecido na generalidade dos países europeus.

E isto apesar de a nossa legislação básica de sociedades comerciais ser relativamente recente e ter incorporado as directivas comunitárias existentes na altura.

Persistem, no entanto, na nossa legislação disposições ultrapassadas e procedimentos desconformes com a realidade quotidiana do mundo empresarial.

Nesta ocasião, julga-se conveniente alterar cinco aspectos fundamentais do direito societário: a criação da sociedade unipessoal por quotas; o regime de fiscalização das sociedades; a criação da figura do secretário da sociedade; a simplificação dos dispositivos normais sobre adopção de firmas, e a feitura e a corporização das actas da sociedade. Para além destes aspectos fundamentais, alteram-se dois outros de grande importância prática: simplifica-se, quer a determinação do valor das quotas, quer o critério para a contagem dos votos no regime das sociedades comerciais por quotas, e passa a admitir-se um valor mais elevado para o capital social das sociedades anónimas com um só administrador. Acessoriamente, acolhem-se alterações no Código do Notariado e no Código do Registo Comercial. Igualmente se procede à rectificação de um conjunto de disposições que dela carecem desde a publicação do Código das Sociedades Comerciais.

2 - As sociedades de responsabilidade limitada são a forma por excelência escolhida pelas pequenas e médias empresas. É clara entre nós a propensão dos empresários para a utilização deste tipo de sociedades como forma de enquadramento jurídico das suas empresas. As sociedades unipessoais por quotas existem em quase todos os Estados membros da Comunidade Europeia, já por razões jurídicas, já por razões económicas. Importa introduzi-las no nosso direito das sociedades.

Na verdade, estas sociedades podem facilitar o aparecimento e, sobretudo, o são desenvolvimento de pequenas empresas, que, como é reconhecido, constituem, principalmente em épocas de crise, um factor não só de estabilidade e de criação de emprego mas também de revitalização da iniciativa privada e da actividade económica em geral. Permitem, efectivamente, que os empreendedores se dediquem, sem recurso a sociedades fictícias indesejáveis, à actividade comercial, beneficiando do regime da responsabilidade limitada.

A criação do estabelecimento individual de responsabilidade limitada pelo Decreto-Lei n.º 248/86, de 25 de Agosto, não atingiu esses resultados. Fiel à doutrina tradicional, o legislador de então não conseguiu ultrapassar a concepção contratualista da sociedade e por isso rejeitou qualquer concessão à sua concepção institucional. Quedou-se pela constituição de um património autónomo afectado a um fim determinado, mas desprovido dos benefícios da personalidade jurídica. Afastou-se expressamente das soluções já nessa altura adoptadas pela Alemanha e pela França. Portugal tornou-se o único Estado membro da Comunidade Europeia a optar pela via do estabelecimento individual de responsabilidade limitada. Teve-se como indiscutível que a sociedade unipessoal não era instrumento apropriado à realidade do nosso país e daí enveredar-se por uma pretensa e difícil inovação. Negou-se a personalização a algo que a reclamava.

É certo que a instituição das sociedades unipessoais por quotas levantou inicialmente delicados problemas doutrinais. Não faltou quem considerasse um 'absurdo' a existência legal de sociedades unipessoais. Essa dificuldade recebeu uma resposta teórica, em que a sociedade unipessoal constituiria a excepção à regra das sociedades pluripessoais. Mas importa sobretudo facultar às pessoas uma forma de limitação da sua responsabilidade que não passe pela constituição de sociedades fictícias, com 'sócios de favor', dando azo a situações pouco claras no tecido empresarial.

Foi esta realidade que justificou a Directiva n.º 89/667/CE, bem como as alterações legislativas ocorridas, designadamente em Espanha com a Lei 2/1995, de 23 de Março, em França com a Lei n.º 85/697, de 11 de Julho, na Itália com o Decreto Legislativo n.º 88, de 3 de Março de 1993, e na Bélgica com a Lei de 14 de Julho de 1987.

É ainda o reconhecimento dessa realidade que serve de primacial fundamento à presente institucionalização. Impõe-se, pois, sem abjurar, de momento, nenhuma das figuras legalmente estabelecidas, criar um novo tipo de sociedade, em que a responsabilidade do sócio único seja limitada. Sobretudo em relação às pequenas e médias empresas, espera-se que este novo tipo de sociedade constitua mais uma escolha que facilite a sua legalização e uma adaptação maior ao importante papel que desempenham no tecido económico nacional.

Daí que a criação de sociedades unipessoais por quotas possa ser originária ou superveniente. Não se acolhe, nesta fase inicial, a possibilidade, que a prática imporá ou não, da criação autónoma e por tempo indeterminado da sociedade anónima unipessoal.

Para a cabal prossecução dos objectivos enunciados, foram consagrados alguns princípios de segurança, tanto do sócio único como de terceiros.

Foram também tidas em conta as injunções da referida directiva e a necessidade de prosseguir na via da harmonização das legislações dos Estados membros da União Europeia.

3 - Elaboradas as contas do exercício anual pelos administradores ou gerentes das sociedades comerciais, mostrou-se necessário, desde há muito, que as mesmas fossem examinadas por um órgão que comprovasse a sua conformidade com os preceitos legais, os princípios contabilísticos legalmente definidos e o contrato social antes de serem submetidas à aprovação dos sócios em assembleia geral. Foi esta missão confiada, entre nós, ao conselho fiscal.

Para preservar o segredo comercial, começou o conselho fiscal por ser composto por sócios da sociedade, cujas contas lhe cabia controlar. A superveniência da necessidade de reforçar a confiança dos sócios, dos credores sociais e até de eventuais investidores forçou a que o conselho fiscal fosse constituído por pessoas estranhas à sociedade, imparciais e independentes em relação à maioria da assembleia geral.

Nos tempos actuais, tem-se entendido que a única forma de manter a imprescindível confiança consiste em atribuir a fiscalização das contas das sociedades comerciais a peritos profissionais e independentes, que são, em Portugal, os revisores oficiais de contas. Facto este, de resto, já reconhecido pelo Decreto-Lei n.º 289/91, de 10 de Agosto, e pela Directiva do Conselho n.º 84/253/CEE (8.' Directiva).

O Código das Sociedades Comerciais consagra a obrigatoriedade da existência de um conselho para as sociedades anónimas segundo um sistema misto para a sua composição: três ou cinco membros de que apenas um é revisor oficial de contas. Entretanto, a composição generalizada do órgão de fiscalizacão das contas das sociedades comerciais nos países europeus encaminhou-se para a figura do fiscal único, profissional dotado de qualificação técnica superior. Dos países da União Europeia só a Itália mantém uma estrutura idêntica à do conselho fiscal. O Decreto-Lei n.º 328/95, de 9 de Dezembro, sem abandonar a concepção adoptada pelo Código das Sociedades Comerciais, não deixa de destacar o papel essencial do revisor oficial de contas no tocante à certificação legal das contas.

Pelas razões expostas, impõe-se rever a natureza do conselho fiscal e a própria obrigatoriedade da sua existência, substituindo-a pela regra geral da existência do revisor oficial de contas.

É ao revisor oficial de contas que passa a ser atribuída, em regra, a competência para a fiscalização. Além disso, é-lhe atribuída uma nova competência, que se traduz no poder de desencadear procedimentos de alerta quando entenda que na prossecução do interesse da sociedade surgem dificuldades que a ponham em causa. Estes procedimentos são meramente internos e ocorrem dentro das estruturas sociais. Porém, sob outro ponto de vista, não poderão deixar de ser encarados como meios preliminares de aviso para que sejam tomadas medidas recuperadoras da empresa.

4 - Com a instituição da figura do secretário da sociedade anónima, ou por quotas, perseguem-se dois objectivos primaciais: o de valorar uma realidade de facto já existente nas sociedades de maior dimensão e o de aumentar a eficácia da vida societária ao evitar a contínua sobrecarga dos cartórios notariais e das conservatórias do registo comercial com a emissão reiterada e sistemática de certidões de mera repetição de elementos que entretanto não sofreram qualquer alteração.

Por isso se cria o cargo de secretário das sociedades, vinculativo para as que estejam cotadas em bolsa e facultativo para as demais. Entende-se dever abrir um período de experimentação da figura, findo o qual se poderá justificar a obrigatoriedade para outro tipo de sociedades.

Na competência do secretário destacam-se, entre outras, as funções de secretariado dos órgãos sociais (assembleia geral, administração, direcção e conselho geral), de redacção das actas, de conservação e guarda dos respectivos livros da sociedade, de certificação de certos eventos sociais, de garantia do exercício do direito de informação dos accionistas, de contactos com as conservatórias do registo comercial.

5 - Introduzem-se modificações no regime dos requisitos das firmas das sociedades com o principal objectivo de facilitar a escolha dos dizeres que integram a sua composição.

Pretende-se simplificar o sistema de molde a aligeirar o correspondente procedimento burocrático e a ultrapassar dificuldades, designadamente no momento da constituição da sociedade.

As facilidades ora propostas tiveram também em consideração, por um lado, a vocação universalista ínsita na cultura e na língua portuguesas, aliás já bem visíveis no quotidiano nacional transcontinental, bem como a iminente e necessária...

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