Acórdão n.º 569/2016

Data de publicação25 Novembro 2016
SectionParte D - Tribunais e Ministério Público
ÓrgãoTribunal Constitucional

Acórdão n.º 569/2016

Processo n.º 238/16

Acordam na 2.ª secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1 - Por acórdão de 19 de novembro de 2015, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso interposto por CPC DI - COMPANHIA PORTUGUESA DE COMPUTADORES E DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS INFORMÁTICOS, S. A., no processo contraordenacional em que é arguida, e julgou procedente o recurso interposto pela AUTORIDADE NACIONAL DE COMUNICAÇÕES (ICP-ANACOM), revogando a suspensão de execução da coima unitária imposta, no montante de (euro)8.000,00. Invocada a nulidade dessa decisão, por via de requerimento apresentado pela arguida, foi tal pretensão indeferida, por acórdão de 28 de janeiro de 2016.

2 - A arguida interpôs de seguida recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo no Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, doravante LTC), através de requerimento onde refere o que segue:

«(...)

6 - No que releva para o presente recurso de constitucionalidade, a ora recorrente sustentou, nas suas motivações e conclusões de recurso, não deter a qualidade de «responsável pela colocação no mercado» de que o Decreto-Lei n.º 192/2000, de 18 de agosto, faz depender a responsabilidade pela violação do disposto no artigo 8.º, alínea b) deste diploma, razão pela qual se impunha a sua absolvição.

7 - À semelhança do que dissera na impugnação judicial da decisão administrativa condenatória, a ora recorrente defendeu que, nesta categoria de agente - «responsável pela colocação no mercado» -, só se inclui o agente (económico) que introduz, pela primeira vez, no mercado da União Europeia (mercado único europeu) os equipamentos de rádio objeto dos presente autos - sendo esta a interpretação da norma que se revela conforme ao Direito da União Europeia e, por isso, respeita o princípio do primado do Direito da União Europeia na ordem jurídica interna.

(...)

11. (...) [R]esulta do Acórdão recorrido que o Tribunal a quo criou e aplicou uma norma, por interpretação do artigo 8.º, alínea b), e 33.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 192/2000, de 18 de agosto, de acordo com a qual «o conceito de responsável pela colocação no mercado inclui não só o importador do produto para o mercado comunitário, mas também o importador/distribuidor para e dentro do território nacional e o retalhista que coloca o produto à venda ao consumidor final».

12 - A norma criada e aplicada pelo Acórdão recorrido é inconstitucional por violação do disposto no artigo 8.º, n.º 4, da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA.

13 - Inconstitucionalidade que a ora recorrente pretende que o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL aprecie.

14 - A criação e aplicação da sobredita norma naqueles termos constitui "ratio decidendi" da decisão proferida, «isto é, fundamento jurídico determinante da solução dada ao pleito pelo tribunal "a quo"» (cf. CARLOS LOPES DO REGO, Ob. cit. p. 109), porquanto foi com base nessa mesma norma que o Tribunal a quo fundou - mediante o reconhecimento da qualidade de «responsável pela colocação no mercado» da arguida - a condenação da ora recorrente, determinando, para além do mais, a suspensão da execução da coima anteriormente determinada pelo Tribunal de 1.ª instância.

15 - A ora recorrente suscitou a questão de inconstitucionalidade no parágrafo 40.º das suas alegações de recurso e, bem assim, no artigo 7.º das respetivas conclusões e o Tribunal a quo pronunciou-se sobre essa questão de inconstitucionalidade, essencialmente, nos pontos supra transcritos (cf. pp. 68 e ss. do Acórdão recorrido).

16 - Acresce que, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 70.º, n.º 2, da LTC, mostram-se esgotados os recursos ordinários possíveis, na aceção do preceituado no n.º 4 do mesmo artigo, o que determina a admissibilidade do presente recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade.»

3 - O relator no Tribunal da Relação de Lisboa, decidiu não admitir o recurso, com a seguinte fundamentação:

«Por referência ao interposto recurso que antecede, cumpre dizer: A questão de constitucionalidade normativa só se poderia considerar suscitada, de modo processualmente adequado, se a recorrente, para além de identificar as normas que considera inconstitucionais, e indicar os princípios ou as normas constitucionais que considera violados, apresentasse, igualmente, como não se verifica, uma fundamentação, ainda que sucinta, da inconstitucionalidade arguida (requisito com sentido funcional) - cf. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 38/97, e n.º 429/2011, de 29 de setembro, no processo n.º 522/11, da 2.ª Secção.

A recorrente limita-se a afirmar, em abstrato, que uma dada "interpretação", em sede do acórdão proferido neste Tribunal da Relação de Lisboa se lhe afigura inconstitucional.

Ora, (e para além de a questão de constitucionalidade ter de ser suscitada antes da prolação da decisão recorrida, de modo a permitir ao tribunal "a quo" pronunciar-se sobre ela, e, como se explanou no acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 2016.01.28, proferido na sequência do requerimento de fls. 2.455 a 2.474, com referência a alegadas "invalidades" do acórdão aqui proferido datado de 2015.11.19., tal não foi, sequer o caso - cf., entre muitos outros, o Acórdão n.º 155/95, Diário da República, 2.ª série,, de 20 de junho de 1995 -) a recorrente não suscitou, em rigor, questão de constitucionalidade normativa, suscetível, eventualmente, de constituir objeto de um recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei do Tribunal Constitucional.

Ali, de resto, já se escrevia, no relativo à invocada "nulidade insanável do Acórdão" e, por aí, à alegada "inconstitucionalidade da norma criada e aplicada por interpretação do disposto no artigo 73.º, n.os 1 e 2, do RGCO, por violação do disposto no artigo 219.º, n.º 1, da Constituição)", deduzindo-se, a final, a pretensão de se declarar "nulo o Acórdão proferido, de acordo com o disposto no artigo 119.º, alínea b), do CPP, por violação do disposto no artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, e nos artigos 48.º e 53.º, n.º 2, alínea d), do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e ainda do artigo 219.º, n.º 1, da Constituição", o seguinte:

"Independentemente de o presente requerimento, aferindo "invalidades" ao acórdão proferido por esta Conferência na sessão de 2015.11.19., poder configurar, ou não, eventual dilação no trânsito em julgado da decisão, refira-se, desde já, a sem razão do requerente no relativo ao constante do articulado "in judice", notando-se que se invoca, por um lado, "manifesto erro de julgamento", bem como, genérica, alegação de "vício de nulidade insanável" e, por outro, com as características processuais que dali ressaltam, a alegação de que "o Acórdão cria e aplica uma norma por interpretação do artigo 73.º, n.os 1 e 2 do RGCO que é inconstitucional".

Mais se acrescentou:

"É que foi na sequência do suscitado, no apontado segmento, pelo recurso e pela resposta que a ora requerente deduziu ao recurso da autoridade administrativa, que se proferiu a decisão de que se discorda, em sede do acórdão de que se arguiu tal "nulidade",

Como se observa, o acórdão proferido mais do que reproduzir a alegação da recorrente (cf. ponto 83 do requerimento "in judice"), pronuncia-se sobre a questão em apreço, expressamente se aferindo a interpretação conforme não só à Constituição da Republica Portuguesa, como ao Direito da União Europeia e à jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia.

Não se configurando, como se escreveu, e aqui se reafirma, qualquer inconstitucionalidade, naquele ou em qualquer outro segmento da sentença recorrida, se interpretadas como o foram as normas invocadas da Constituição da República Portuguesa, e/ou dos princípios nesta consignados, mais não se poderia ter apreciado pois, para lá do que se consignou a recorrente, ora requerente, e independentemente da generalidade que, de novo, se observa, nada mais especificou, "v.g." quanto a norma jurídico-constitucional que, por ali, se pudesse ter como violada e/ou ao sentido em que, naquele entendimento, o tribunal recorrido interpretou cada norma e o sentido em que ela deveria ter sido interpretada e/ou com que deveria ter sido aplicada, nem, ainda, concretizou eventuais factos não apreciados em que poderia assentar tal formulação.

Independentemente da natureza, e conteúdo, do que, nesta medida, se escreve, a ora requerente não configurou, de resto, outras questões relevantes para a pretensão formulada que pudessem, eventualmente, derivar da inconstitucionalidade por ali arguida (alusiva, relembre-se, à alegada "violação do disposto no artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa").

Deste modo, e como se sublinha, o Tribunal pronunciou-se sobre a questão em apreço, sendo matéria diversa, como parece evidenciar-se uma vez mais, a discordância pela requerente quanto ao sentido decisório do acórdão proferido, sendo, como já se salientou, que não se pode visar, por aqui, a "reapreciação" dos fundamentos invocados mas já decididos no acórdão proferido em 2015.11.19.

É, pois, nesta medida, de indeferir o requerido, não se verificando, como se sublinha "supra", qualquer nulidade, inconstitucionalidade e/ou questão a esclarecer, não se indicando, nem observando, também, fundamento algum que permita, nos termos do artigo 669.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a reforma do acórdão "in judice".

Neste circunstancialismo processual, constando do artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa, em sede de garantias de processo criminal, no seu n.º 1, que o processo assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso, e no seu n.º 5, que a audiência de julgamento e os atos instrutórios que a lei determinar estão subordinados ao princípio do contraditório, como sucedeu "in casu", não sendo suscitada qualquer questão de constitucionalidade normativa, e não se verificando os respetivos pressupostos, não se admite o interposto recurso para...

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