Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 280/2017

Data de publicação03 Julho 2017
SeçãoSerie I
ÓrgãoTribunal Constitucional

Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 280/2017

Processo n.º 108/17

Acordam em Plenário do Tribunal Constitucional,

I - Relatório

1 - O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional promoveu, em conformidade com o disposto no artigo 82.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro [doravante LTC]), a abertura de um processo de fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade, com vista à apreciação e à declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da norma que estabelece que a «reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota», constante do n.º 2, do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março.

Por forma a legitimar o seu pedido, o requerente alega que o Acórdão n.º 189/2016, da 2.ª Secção, julgou inconstitucional a norma supra citada, juízo reafirmado pelo Acórdão n.º 653/2016, da 1.ª Secção, bem como pelas Decisões Sumárias n.º 806/2016, n.º 16/2017 e n.º 17/2017 - as três tiradas pela 1.ª Secção.

De acordo com o requerente, todas as decisões citadas transitaram em julgado.

2 - No Acórdão n.º 189/2016, a 2.ª Secção do Tribunal Constitucional julgou «inconstitucional a norma constante do n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, por violação da reserva de competência da Assembleia da República em matéria de direitos, liberdades e garantias, constante do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), em conjugação com o artigo 20.º, n.º 1, ambos da CRP». Este entendimento foi renovado no Acórdão n.º 653/2016, da 1.ª Secção, que julgou inconstitucional «a norma que determina que a reclamação da nota justificativa da conta de custas de parte está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota, constante do n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, por violação da reserva de competência da Assembleia da República em matéria de direitos, liberdades e garantias, constante do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), em conjugação com o artigo 20.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa». Este juízo foi renovado nas Decisões Sumárias n.º 806/2016, n.º 16/2017 e n.º 17/2017.

Numa decisão anterior, a 2.ª Secção do Tribunal Constitucional tinha decidido não julgar materialmente inconstitucional a mesma norma (Acórdão n.º 678/2014).

3 - Notificado para se pronunciar sobre o pedido, nos termos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da LTC, na qualidade de emissor da norma, o Ministério da Justiça veio referir que «com uma eventual declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral» não se prefigura «qualquer inoperacionalidade do sistema, dada a previsão de remissão do artigo 33.º n.º 4 da Portaria 419-A/2009 para o regime do art. 31.º do RCP», não havendo tão-pouco «qualquer impacto financeiro/orçamental previsível, dado que se trata tão só de um depósito que garante o pagamento ou é devolvido, de acordo com a decisão da reclamação que assegura». Conclui que, tendo em conta «que se trata (apenas) do reembolso de custas de parte [...] e de inconstitucionalidade orgânica [...], somos de parecer que não deverá ser apresentada qualquer pronúncia, por parte do Ministério da Justiça, na qualidade de emissor da norma cuja declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral se mostra requerida».

4 - Discutido o memorando, apresentado pelo Presidente do Tribunal, a que se refere o artigo 63.º, n.º 1, da LTC, cumpre elaborar o acórdão nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, em conformidade com o entendimento que prevaleceu.

II - Fundamentação

a) Verificação dos pressupostos do processo

5 - A fiscalização abstrata da inconstitucionalidade de uma norma pode ser requerida sempre que a mesma tiver sido julgada inconstitucional em três casos concretos pelo Tribunal Constitucional. Trata-se de um processo de generalização, com fundamento na repetição do julgado (artigo 281.º, n.º 3, da Constituição, e artigo 82.º da LTC).

No presente processo de fiscalização abstrata, verifica-se que a norma objeto do pedido foi, na realidade, julgada inconstitucional em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade, em mais do que três casos concretos (conforme referido no ponto 2), pelo que se considera preenchido o pressuposto previsto no artigo 281.º, n.º 3, da Constituição. O presente processo foi promovido pelo Ministério Público, que tem legitimidade para tal, nos termos do artigo 82.º da LTC.

Cumpre avançar para a análise da questão de constitucionalidade colocada.

b) Enquadramento da questão objeto de fiscalização

6 - O pedido de declaração de inconstitucionalidade incide sobre a norma segundo a qual a «reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota», constante do n.º 2, do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março.

A norma em análise integra-se na matéria de custas de parte. Nesse aspeto, refere o Acórdão n.º 653/2016, ponto 7:

«quanto à matéria das custas de parte, o Código de Processo Civil (CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, dispõe que estas são abrangidas pelas custas processuais e compreendem "o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do Regulamento das Custas Processuais" (artigo 529.º, n.º 1 e 4, CPC). De acordo com o artigo 533.º, n.º 1, do CPC, "as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, na proporção do seu decaimento e nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais", estabelecendo o n.º 2 do mesmo preceito que as "custas de parte" abrangem, designadamente, as taxas de justiça pagas, os encargos efetivamente suportados pela parte, as remunerações pagas ao agente de execução e as despesas por este efetuadas, e os honorários do mandatário e as despesas por este efetuadas. Existe, assim, nesta matéria, uma remissão do CPC para o Regulamento das Custas...

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