Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 3/2020

ELIhttps://data.dre.pt/eli/acsta/3/2020/10/06/p/dre
Data de publicação06 Outubro 2020
SeçãoSerie I
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 3/2020

Sumário: Uniformiza a Jurisprudência nos seguintes termos: «O conceito de 'residência por dependência', acolhido no artigo 16, n.º 2, do CIRS, não pode sobrepor-se ao conceito convencional de residência constante do artigo 4.º da Convenção contra a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Itália (aprovada para ratificação pela Lei n.º 10/82, de 1 de Junho), dada a supremacia do direito internacional sobre o direito interno ordinário consagrada nos artigos 8.º da CRP e 1.º, n.º 1, da LGT».

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 04 de março de 2020

Processo n.º 1679/13.9BALSB

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 - Z..., por si e na qualidade de representante fiscal de X..., melhor identificados nos autos vêm ao abrigo do disposto no artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) no processo n.º 41/2013-T, que julgou improcedente a anulação dos actos de liquidação de IRS referentes aos anos de 2008 e 2010, respectivamente nos montantes de (euro)30.208,21 e (euro)21.100,18, por considerarem que a referida decisão arbitral está em oposição com os seguintes acórdãos fundamento:

- Com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 20.12.2005, proferido no processo n.º 2/03, quanto à questão da interpretação do artigo 59.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

- Com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 07/04/2011, proferido no processo n.º 4550/11, no que concerne à obrigatoriedade de a Autoridade Tributária corrigir oficiosamente os elementos cadastrais dos contribuintes, quando disponha de elementos para o efeito;

- Com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 22/05/2013, proferido no processo n.º 1041/11, quanto à questão da interpretação da natureza das declarações de rendimentos e sua sindicância judicial;

- Com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 16/06/2010, proferido no processo n.º 46/10, no que respeita ao não cumprimento do princípio do inquisitório a que os tribunais se encontram adstritos;

- Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 16/06/2010, proferido no processo n.º 462/10, no que concerne ao princípio da supremacia do direito internacional convencional sobre as normas nacionais.

Os recorrentes apresentaram alegações de recurso, com o seguinte quadro conclusivo:

«a. Nos termos do artigo 25.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, é admissível recurso do mérito da decisão arbitral para o Supremo Tribunal Administrativo, quando a mesma esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo;

b. No caso em apreço, verifica-se que a decisão arbitral encontra-se em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com i) o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no processo n.º 2/03-Braga, datado de 20.12.2005, no que concerne à interpretação do artigo 59.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário; ii) o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n.º 1041/11, datado de 22.05.2013, no que concerne à interpretação da natureza das declarações de rendimentos e sua sindicabilidade judicial; iii) o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n.º 4550/11, datado de 07.04.2011, no que concerne à obrigatoriedade de a Administração Tributária corrigir oficiosamente os elementos cadastrais dos contribuintes, quando disponha de elementos para o efeito; iv) o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 46/10, datado de 16.06.2010, no que respeita ao não cumprimento do princípio do inquisitório a que os tribunais se encontram adstritos; e, ainda, v) o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 462/10, datado de 16.06.2010, no que concerne à sobreposição das normas de direito internacional sobre as normas nacionais, pelo que deverá o mesmo ser admitido, conhecendo-se do seu mérito (vide in www.dgsi.pt);

c. A decisão recorrida, ao não conhecer da (i)legalidade das liquidações de imposto, por não terem considerado o teor e a factualidade constante das declarações de substituição apresentadas pela Recorrente em 9.11.2011, é oposta ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n.º 1041/11, datado de 22.05.2013, em que se perfilhou a tese de que o sujeito passivo pode atacar a legalidade da liquidação através da apresentação da declaração de substituição que, a ser apresentada antes da emanação da liquidação, deverá ser atendida na liquidação que vier a ser emanada;

d. Constata-se, portanto, que nos termos do Acórdão-fundamento, a Reclamante podia (como fez) atacar a legalidade da liquidação através da apresentação das declarações de substituição (2008 e 2010) que, por terem sido apresentadas antes da emanação das liquidações de imposto aqui contestadas, deveriam ter sido atendidas, quanto aos elementos jurídicos e factuais nela declarados, aquando da emissão das referidas liquidações;

e. A decisão do Tribunal Arbitral, ao entender que a declaração de rendimentos tem efeitos constitutivos - ao concluir que a não indicação, ab initio aquando apresentação da declaração de rendimentos, da opção do sujeito passivo pela tributação como não residente (nos termos artigo 16.º, n.º 3 do Código do IRS) não pode, posteriormente, ser alterada - é oposta à posição assumida pelo Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no processo n.º 35/02-Porto, datado de 15.10.2009 em que se perfilhou a tese de que a declaração de rendimentos não tem efeitos constitutivos, podendo a sua ilegalidade, designadamente com base no erro de facto, ser atacada graciosa ou judicialmente;

f. Verifica-se, portanto, que o facto de nas primeiras declarações entregues se ter declarado o marido da Recorrente como sendo residente em território nacional, não implica que, posteriormente, o erro de facto declarado não pudesse ser corrigido - o que se fez, quer através da apresentação das Reclamações Graciosas com vista à anulação dos actos tributários de IRS referentes aos anos de 2008 e 2010, quer no âmbito do presente processo arbitral, uma vez que, como postula o Acórdão citado, as declarações não têm, por si só, a virtualidade constitutiva sobre os factos tributários;

g. A decisão recorrida, ao entender que a comunicação da alteração do domicílio fiscal do marido da Recorrente, com efeitos a 1.01.2007, não deverá relevar para efeitos de tributação em sede de IRS, é frontalmente oposta ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito do processo n.º 4550/11, datado de 07.04.2011, no qual se perfilhou a tese de que a Administração Tributária está adstrita à rectificação oficiosa do domicílio fiscal dos sujeitos passivos se dispuser de elementos para o efeito;

h. Uma vez que à data da emanação das liquidações de imposto, não só a Administração Tributária detinha todos os elementos necessários para proceder à rectificação oficiosa do domicílio fiscal do marido da Recorrente (como não residente em território nacional) - o que não fez, em manifesta violação do n.º 6 do artigo 19.º da lei geral tributária - como, ainda, se constata que o marido da Recorrente já tinha procedido à comunicação da alteração do domicílio fiscal com efeitos a 1.01.2007 e a própria Recorrente tinha logrado substituir as declarações de rendimentos indicando o referido domicílio, em consonância com a referida alteração de domicílio fiscal, verifica-se que a Administração Tributária não poderia ter ignorado, nas liquidações emanadas, a alteração do domicílio fiscal do marido da Recorrente para efeitos de tributação nos anos de 2008 e 2010;

i. A decisão recorrida, ao não conhecer de todos os factos com vista ao apuramento da situação a que foi chamado a julgar, designadamente o facto de o marido da Recorrente residir em Itália e ter declarado essa residência (com efeitos retroactivos a 1.01.2007), está em manifesta oposição com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo n.º 46/10, datado de 16.06.2010, no qual se entendeu que incumbe ao juiz a direcção do processo e a realização de todas as diligências que, num critério objectivo, considere úteis ao apuramento da verdade material subjacente à situação que lhe é colocada a julgar;

j. A decisão do Tribunal Arbitral, ao não apreciar a aplicação ao caso sub judice das normas de direito internacional abstractamente aplicáveis na determinação da categoria de residente, designadamente o artigo 4.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e Itália, está em manifesta oposição com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 462/10, datado de 27.10.2010, no qual se perfilhou a tese de que o princípio de residência por dependência, acolhido no artigo 16.º, n.º 2 do Código do IRS, não pode sobrepor-se ao conceito convencional de residência constante nas Convenções para Evitar a Dupla Tributação celebradas por Portugal;

k. De facto, analisando a situação familiar do marido da Recorrente e, ainda, dos seus interesses vitais, pessoais e económicos, verifica-se que, em relação ao ano de 2010, o marido da Recorrente deveria ter sido considerado como residente fiscal em Itália, à luz do artigo 4.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e aquele país e em estrito cumprimento do princípio do primado do direito internacional a que alude o artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa e, como tal, o princípio da residência por dependência, previsto no artigo 16.º, n.º 2 do Código do IRS não poderá...

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