Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 4/2017

Data de publicação18 Setembro 2017
SectionSerie I
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 4/2017

Acórdão do STA de 07-06-2017, no Processo n.º 279/17 - Pleno da 2.ª Secção

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada, recorre do acórdão proferido pelo TCA Sul, datado de 27.10.2016, que concedeu provimento ao recurso que havia sido interposto por "A..., CRL", ao abrigo do disposto no artigo 152.º do CPTA, por o mesmo se encontrar em evidente oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com o acórdão proferido pelo mesmo Tribunal Central Administrativo, datado de 28.04.2016, recurso n.º 08784/15.

Alegou, tendo concluído:

I. O presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência vem interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em 27 de Outubro de 2016 no Proc. n.º 095549/16, o qual reconheceu o direito à então Recorrente a juros de mora, contados desde 01.01.2012, até à emissão da nota de crédito em 24.07.2012, nos termos do disposto no n.º 5 do art. 43 º da LGT, a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas do Estado e outras entidades públicas.

II. Todavia, o entendimento perfilhado no acórdão recorrido colide frontalmente com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul prolatado em 28 de Abril de 2016, no âmbito do Proc. n.º 08784/15, já transitado em julgado, bem como da jurisprudência emanada em acórdãos proferidos por aquele TCA Sul, entre os quais nos permitimos destacar o Acórdão proferido no Proc. n.º 08311/14 de 23.04.2015, mais recentemente o Acórdão do TCAS proferido no âmbito do Proc. n.º 09624/16 de 13.07.2016 e de jurisprudência emanada por esse Colendo Tribunal.

III. Ou seja, o acórdão sob escrutínio (acórdão do TCAS proferido no Proc. n.º 09549/16 de 27.10.2016), encontra-se em manifesta contradição com o acórdão fundamento proferido por aquele Colendo Tribunal no âmbito do Proc. n.º 08784/15 em 28 de Abril de 2016, pois, enquanto que o acórdão recorrido reconhece o direito a juros moratórios e indemnizatórios de forma cumulativa e no que respeita ao mesmo período de tempo (entre 01.01.2012 a 24.07.2012), em sentido diametralmente oposto se pronunciou o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em 28 de Abril de 2016, no âmbito do Proc. n.º 08784/15, o qual reitera peremptoriamente, ser legalmente inadmissível a condenação de juros indemnizatórios e moratórios sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo.

IV. Antes de mais atente-se que, no caso vertente, se encontram reunidos os supra elencados requisitos para que se tenha por verificado o recurso por uniformização de jurisprudência, pois existe identidade entre as situações de facto, entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, tendo em conta que em ambos os arestos estava em causa a apreciação no mesmo período temporal do direito a juros indemnizatórios e moratórios, estando ainda em causa situações idênticas relativamente ao pagamento da quantia em dívida acrescida de juros indemnizatórios, e a apreciação, no mesmo período temporal, do direito a juros de mora.

V. Donde, entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento há uma identidade de situações de facto, na medida que em ambos os casos, é apreciada a condenação da Recorrente ao pagamento de juros indemnizatórios e moratórios sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo.

VI. A questão fundamental de direito apreciada, quer no acórdão recorrido quer no acórdão fundamento é ainda idêntica, - ou seja, saber se face ao preceituado no n.º 5 do Art. 43.º da LGT, na redacção dada pela Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, é admissível a atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e juros moratórios sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo, entendendo acórdão recorrido - secundado por alguma doutrina - que a norma constante do n.º 5 do Art. 43.º da LGT, é uma norma de carácter excepcional e de natureza sancionatória, e por esse facto são cumuláveis juros moratórios com juros indemnizatórios, enquanto que o acórdão fundamento entendeu em sentido diametralmente oposto, ou seja, ser legalmente inadmissível a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios e juros de mora sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo.

VII. Resulta assim que, entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir no presente recurso, devendo, consequentemente, ser anulada a decisão recorrida, que deve ser substituída por novo acórdão que, no sentido aqui defendido pela Recorrente, definitivamente, decida a questão controvertida.

VIII. Tendo a fundamentação vertida quer em decisões proferidas anteriormente por esse Colendo Tribunal quer em acórdão do TCAS, é inequívoca a conclusão de que é legalmente inadmissível a cumulação de juros indemnizatórios com juros moratórios relativamente ao mesmo período de tempo.

IX. Pois, o acórdão recorrido ao pugnar pela cumulação de juros indemnizatórios e moratórios relativamente ao mesmo período de tempo contrariou a jurisprudência desse STA cuja pronúncia uniformemente tem vindo a ser no sentido de que não há cumulação de juros indemnizatórios e juros de mora relativamente ao mesmo período temporal, pois ambos destinam-se a compensar o contribuinte pela mesma privação da disponibilidade da prestação tributária indevidamente paga, pelo que não são cumuláveis relativamente ao mesmo período de tempo por não se poder justificar uma dupla compensação pela mesma privação de disponibilidade da quantia indevidamente paga (v.d. a título de exemplo o acórdão de 19.12.2001, Proc. n.º 26608, de 20.10.2004, Proc. n.º 338/04, de 02.05.2007, Proc n.º 9/7, de 02.03.2011, no Proc. n.º 0880/11 cf. ac. STA-Pleno da 2.ª Secção, 17/6/2009, rec. 447/07; ac. STA-2.ª Secção, 22/5/2013, rec. 1008/12; ac TCA Sul 2.ª Secção, 21/5/2015, proc. 8379/15; ac. T.C.A. Sul-2.ª Secção, 10/9/2015, proc. 8862/15...

X. Justamente, a Recorrente adere a este entendimento da jurisprudência, mais entendendo que o mesmo, embora anterior à introdução do n.º 5 do artigo 43.º da LGT, aditado pela Lei n.º 64-B/2011, se mantém na íntegra, na medida em que, ambos os juros (indemnizatórios e moratórios) partilham a mesma natureza indemnizatória, inexistindo cumulação de juros de mora e juros indemnizatórios no mesmo período temporal, sob pena de duplicação injustificada de reparação do mesmo prejuízo.

XI. Significava assim que existindo incumprimento da execução espontâneo do julgado e havendo lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, aos respectivos períodos de retardamento aplica-se a mesma taxa legal de 4 % ao ano, inexistindo cumulação de juros indemnizatórios e juros de mora relativamente ao mesmo período temporal (v.d. acórdão desse Colendo Tribunal de 07.09.2011. no Proc. n.º 0352/11 e ainda acórdão de 02.07.2008, no Proc. n.º 0303/08, e acórdão de 17.06.2009, no Proc. n.º 0447/07).

XII. Propalou-se assim nesse douto Tribunal no acórdão de 2013.10.09, proferido no Proc. n.º 01235/12, referindo se a impossibilidade de cumulação de juros moratórios e juros indemnizatórios que: «visando estes ressarcir os prejuízos da privação da importância indevidamente paga, não se pode justificar uma dupla compensação pela mesma privação da disponibilidade daquela quantia...

XIII. Resulta assim que a jurisprudência firmada por esse douto tribunal, tem reiteradamente entendido que é legalmente inadmissível a cumulação de juros indemnizatórios e moratórios, sobre o mesmo período temporal.

XIV. O aditamento do n.º 5 do artigo 43.º da LGT pela Lei n.º 64-B/2011, de 30/12, em nada contraria o entendimento acolhido na mencionada jurisprudência do STA, pois não alterou a razão de ser dos juros de mora, que continua a ser o direito do contribuinte a ser compensado pela privação de uma disponibilidade financeira, tendo por fundamento a inexecução espontânea de uma decisão judicial transitada em julgado que condena a restituição do imposto.

XV. O contexto específico do incumprimento de uma decisão judicial transitada em julgado justifica a aplicação de uma taxa de juro agravada para o dobro, que esteja em harmonia com a mora naquele incumprimento, por forma a cumular a sua função reparadora com uma função sancionatória pelo incumprimento do prazo para pagamento de dívida já reconhecida por sentença judicial.

XVI. Não se vislumbra, por conseguinte, como defende o acórdão recorrido, que o disposto no n.º 5 do Art. 43.º da LGT se esgote na prossecução de uma finalidade sancionatória, destinada a compelir a Recorrente a executar tempestivamente as decisões transitadas em julgado, uma vez que essa finalidade já é prosseguida por outros mecanismos legais que garantem o direito a tutela judicial efectiva na vertente do direito a execução das decisões judiciais, como são o disposto no Art. 159.º do CPTA, sob a epígrafe «Inexecução ilícita das decisões judiciais», que prevê a responsabilidade civil, disciplinar e criminal quando a Recorrente não cumpre os deveres que lhe incumbem em virtude de decisão judicial e o disposto no Art. 169.º do CPTA sob a epígrafe «Sanção pecuniária compulsória».

XVII. Aquele agravamento destina-se, por conseguinte, a reforçar as medidas legislativas já existentes, destinadas a compelir ao cumprimento do julgado, e, simultaneamente, a manter a função reparadora que desde sempre foi reconhecida aos juros de mora, inexistindo na letra ou no espírito da lei elementos que permitam justificar a intenção de alteração da natureza ou essência dos juros de mora, tanto mais que a integração sistemática dos juros de mora no Art. 43.º da LGT revela a partilha da sua manifesta identidade teleológica com os juros indemnizatórios, porquanto, recorde-se, tem por base e fundamento a privação da prestação tributária paga.

XVIII. Foi esse o entendimento acolhido nos mais...

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