Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2012, de 21 de Maio de 2012

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2012 Processo n.º 148/07.0TAMBR.P1 -B.S1 - 3.ª Acordam no Pleno das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça: No processo n.º 148/07.0TAMBR.P -B do Tribunal da Relação do Porto — 4.ª Secção, a arguida Lucinda de Jesus Grandão Tomé de Almeida Pinto, nos mesmos identificada, veio nos termos e para os efeitos do ar- tigo 437.º, n.º 2 do CPP, interpor recurso extraordinário de fixação de jurisprudência, do Acórdão daquele Tribunal, de 11 de maio de 2011, proferido nos autos, já transitado em julgado, por se encontrar em oposição com o acór- dão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22/01/2003, proferido no âmbito do Recurso Penal n.º 9049/02 que se encontra publicado in Coletânea de Jurisprudência, ano XXVII , 2003, t.

I , p. 127 a p. 129, apresentando as seguintes conclusões:

  1. Decidiu o douto Acórdão recorrido que o prazo a que alude o n.º 1 do artigo 115.º do CP tem o seu términos às 24 horas do dia que corresponde dentro do 6.º mês seguinte ao dia seguinte à ocorrência e conhecimento de tais factos, ou seja, decidiu que o último dia do 6.º mês seguinte para apresentar a queixa corresponde ao dia seguinte ao da ocorrência e conhecimento dos factos; B) O douto Acórdão fundamento decidiu que, de harmo- nia com as mesmas regras de contagem dos prazos, o prazo para a apresentação de queixa termina às 24 horas do dia que corresponde dentro do 6.º mês seguinte ao mesmo dia em que ocorreram os factos e que deles teve conhecimento o denunciante; C) Entre ambos os Acórdãos mencionados é, portanto, manifesta a divergência no que concerne ao dies ad quem, ou seja, ao dia que corresponde ao último dia do prazo para o exercício do direito de queixa; D) Trata -se de uma questão de relevante interesse, um vez que a determinação do concreto dia em que o exercício do direito de queixa se considera extinto, contende com a apreciação da tempestividade do exercício de tal direito.

    Termos em que, deverá ser o presente recurso admitido, concluindo -se pela existência de oposição de julgados entre o Acórdão recorrido e Acórdão fundamento, prosseguindo os seus ulteriores trâmites.

    Cumprido o disposto nos artigos 439.º e 440.º do CPP, veio este Supremo Tribunal, por acórdão de 11 de janeiro de 2012 a concluir pela oposição de julgados, prosseguindo o recurso, nos termos da 2.ª parte do artigo 441.º n.º 1, e cumprindo -se o disposto no artigo 442.º n.º 1, ambos do CPP. Ministério Público, Recorrente e Assistente foram no- tificados para apresentarem no competente prazo as ale- gações escritas.

    Lucinda de Jesus Grandão Tomé de Almeida Pinto, veio apresentar as suas alegações, produzindo as seguintes conclusões:

  2. Ambos os Acórdãos que servem de base para o pre- sente recurso convergem quanto ao dia em que ocorreram os factos e que deles teve conhecimento o denunciante, que, segundo ambos, não releva para efeitos do cômputo do prazo previsto no artigo 115.º, n.º 1, do CP, o mesmo já não sucedendo quanto à solução partilhada para a contagem de tal prazo, vista à luz das alíneas

    1. e

    2. do artigo 279.º do Código Civil, no que ambos os acórdãos já divergem; B) Analisando a discórdia jurisprudencial à luz das alí- neas

    3. e

    4. do artigo 279.º do Código Civil, é manifesta a divergência no que concerne ao dies ad quem entre ambos os Acórdãos mencionados, ou seja, ao dia que corres- ponde ao último dia do prazo para o exercício do direito de queixa; C) O período de tempo decisivo para a contagem do prazo mencionado no artigo 115.º do CP é aquele que medeia entre a tomada de conhecimento do facto por parte do ofendido e a deposição da queixa; D) De acordo com o disposto na alínea

    5. do artigo 279.º do Código Civil, o prazo fixado em meses, contado a partir de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda dentro do último mês e se no último dia do mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês; E) Nos prazos fixados em meses — situação em causa — aplica -se tout cour o regime estabelecido na alí- nea

    6. daquele artigo 279.º do C. C. em cuja contagem já não é considerado o dia da notificação; F) No caso concreto, o prazo para a apresentação da queixa começou a contar no dia 22 de fevereiro de 2007 e terminou no dia 22 de agosto de 2007 que era o último dia de que o queixoso dispunha para a apresentação desta queixa, por aplicação inegável daquela alínea

    7. do ar- tigo 279.º do Código Civil; G) Pelo que, em 23/08/2007, quando o queixoso apresentou em juízo a respetiva queixa, já o seu di- reito de a exercer se encontrava extinto por efeito de caducidade, devendo a mesma ser julgada, como o foi, intempestiva; H) Ao considerar -se que o aludido prazo referido no artigo 115.º do CP terminou a 23 de agosto de 2007, como sustenta o douto Acórdão recorrido, tal redundaria numa subversão incontornável e infundada da regra constante da alínea

    8. do artigo 279.º do CC que determina que um prazo fixado em meses termina às 24 horas do dia a que corresponda dentro do último mês; I) No caso de factos que constituam ilícitos criminais, o marco determinante para se aferir do termo final do prazo a que alude o artigo 115.º do CP, é o dia em que aqueles fac- tos ocorreram apesar de, para efeitos de contagem do termo inicial do prazo, este não ser incluído no cômputo; J) «O dia a que corresponda» na terminologia da alí- nea

    9. do artigo 279.º do CC, tem de ser interpretado no sentido do dia da ocorrência do acontecimento em si — o facto ilícito —, e não como o começo do termo inicial da contagem do prazo, pois é aquele facto ilícito típico que marca o exercício da faculdade prevista naquele normativo; K) E é o dia da ocorrência do facto ilícito típico, já não falando das regras substantivas de contagem do prazo em questão, que determina o termo final do prazo para o exercício do direito de queixa; L) Mesmo com a não contagem do próprio dia em que o facto ilícito ocorreu no cômputo do tempo, como já se viu, o preenchimento dos seis meses verificou -se às 24 horas do dia 22 de agosto de 2007 (dia em que os factos ocorreram e que deles teve conhecimento o ofendido) e outro enten- dimento não é de colher, sob pena de permitir o exercício do direito do ofendido, por mais um dia; M) Tal entendimento, perfilhado no douto acórdão recor- rido, contraria frontalmente o disposto no artigo 279.º, alí- nea

      c), do CC, que é explícito e inequívoco quanto à regra da contagem de prazos que contém e que é no sentido de que «O prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data», o qual naquela hipótese não teria então aplicação; N) O acréscimo desse dia faz com que o prazo não termine no dia a que corresponde a ocorrência dos factos descritos na queixa -crime, o que contraria a disposição do artigo 115.º do CP, ao fixar, impreterivelmente, para o exercício do direito de queixa o prazo de seis meses.

      Termos em que, deve a jurisprudência ser fixada no sentido de que o prazo para o exercício do direito de queixa termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro do 6.º mês seguinte, ao mesmo dia em que ocorreram os factos e que deles teve conhecimento o denunciante.

      Por sua vez, o Ministério Público conclui as alegações que apresentou, da seguinte forma: «7.1 — Tal como o afirmam também, nesta parte sem qualquer divergência, os arestos antitéticos, há que dar por pacificamente adquirida a interpretação que aponta no sentido de que o prazo de seis meses para o exercício do direito de queixa, normativamente previsto no artigo 115.º, n.º 1 do Código Penal, é um prazo de caducidade, de natureza substantiva e em cuja contagem são convocáveis as regras enunciadas no artigo 279.º do Código Civil; 7.2 — Neste quadro, e estando assim em causa a necessidade de convocação para o direito penal de um comando normativo do direito civil, aconselham ele- mentares regras de interpretação que se procure conhe- cer as soluções que, em sede de cômputo dos prazos, têm vindo a ser adotadas pela doutrina e pela jurisprudência desses ramos do direito. 7.3 — Sobre tal problemática, ensinam os Profes- sores Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol.

      I , 3.ª ed., Coimbra Editora, p. 256, ano- tando precisamente o preceito contido no mencionado artigo 279.º do Código Civil, que, citamos, ‘a doutrina da alínea

    10. harmoniza -se com as regras das alíneas anteriores.

      Assim, o prazo de uma semana que começou numa segunda -feira termina às 24 horas da segunda- -feira seguinte, não se contando, portanto, o dia do início do prazo’. 7.4 — Decorre assim do citado ensinamento que, pre- cisamente por via da aplicação conjugada daqueles dois segmentos normativos, a contagem de um prazo de, por exemplo, uma semana que comece numa segunda -feira, inicia -se apenas na terça feira — assim se observando a regra contida naquela alínea

    11. — e tem o seu términos às 24 horas da segunda -feira seguinte.

      O que vale por dizer que, sendo o prazo de uma semana, que tem sete dias, na respetiva contagem há que incluir apenas os sete dias subsequentes ao dia inicial, que não se conta. 7.5 — No mesmo sentido, e com idêntica argumen- tação, aponta também Luís A. Carvalho Fernandes, na sua Teoria Geral do Direito Civil, vol.

      II , 2.ª ed., Lisboa, 1996, p. 536, onde pode ler -se a este propósito que, citamos, ‘na contagem do tempo, se não atende, por exemplo, num prazo de cinco dias, àquele em que o prazo começa.

      Assim, se esse prazo começar no dia 10 de certo mês, ele acaba no dia 15, ou seja, contam -se os dias 11, 12, 13, 14 e 15’. 7.6 — Aliás, o que o legislador visou com o critério introduzido na alínea

    12. foi, precisamente, este de garan- tir que, perante um prazo de, por exemplo, uma semana, seja concedida efetivamente uma semana completa, o que não sucederia se na respetiva contagem se incluísse o dies a quo.

      Nesta hipótese, se o facto tivesse ocor- rido às 23 horas de segunda -feira, a inclusão...

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