Acórdão n.º 118/97, de 24 de Abril de 1997

Acórdão n.º 118/97 - Processo n.º 31/94 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional: I - Relatório 1 - O Provedor de Justiça, ao abrigo do disposto no artigo 281.º, n.º 1 e 2, alínea d), da Constituição da República Portuguesa, veio requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da norma constante do n.º 1 do artigo 53.º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro, na parte em que nega às associações sindicais legitimidade para iniciar o procedimento administrativo e para nele intervir.

Como fundamento do seu pedido, alega o requerente que tal norma viola o disposto nos artigos 56.º, n.º 1, 267.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2 e 3, da Constituição.

2 - No essencial, alega o Provedor de Justiça o seguinte: 'Constitui, pois, entendimento pacífico que as associações sindicais têm legitimidade para participar em outros procedimentos - processos burocráticos, nas palavras de Marques Guedes - para além do legislativo-laboral, do contratual ou do de representação em organismo de concertação social.

Logo, quando num procedimento administrativo esteja em jogo um direito ou interesse legalmente protegido de uma pessoa enquanto `trabalhador', será legítimo concluir que nele poderá intervir a organização sindical que, como tal, a represente.

Independentemente de à associação sindical ser atribuída legitimidade activa per si, por via da aplicação do artigo 12.º, n.º 2, da Constituição.

[...] O princípio da participação dos interessados na Administração Pública é reconhecido pelo artigo 267.º, n.º 1, da Constituição.

[...] A participação dos cidadãos no processo de tomada das decisões administrativas é, pois, imposição constitucional e característica de uma Administração Pública democrática.

Permite aos administrados a protecção dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.

[...] Isto significa que a garantia dos direitos fundamentais exige, para a sua realização, uma participação por via do procedimento.

[...] Assim, o princípio de participação constitui, antes de mais, um direito activo dos cidadãos, cujo exercício deve ser assegurado pela Administração.

[...] Nestes termos, parece legítimo concluir que o legislador ordinário, ao não obedecer aos ditames do hodierno princípio da administração participada, negando às associações sindicais legitimidade quer para iniciar quer para intervir no procedimento, restringe, de facto, o consequente direito de participação.' E conclui: 'Assim, a norma legal sub judice não se conforma aos objectivos que presidem ao próprio procedimento administrativo.

Fica, pois, demonstrado que a restrição introduzida pelo artigo 53.º, n.º 1, in fine, do Código do Procedimento não se funda na Constituição, nem expressa nem implicitamente.

[...] De acordo com o exposto, apresenta-se como conclusão pacífica o facto de o legislador ordinário negar legitimidade activa às associações sindicais, afastando-as do procedimento administrativo, contrariando desse modo as premissas subjacentes à solução de jure condito constitucionalmente recebida.' 3 - Notificado, nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), o Primeiro-Ministro pronunciou-se no sentido da plena constitucionalidade da norma em causa.

Na sua resposta, entende o Primeiro-Ministro que não se verifica qualquer inconstitucionalidade e que o 'iter argumentativo' do Provedor de Justiça assenta em 'premissas incorrectas' e num 'equívoco metodológico'.

Este equívoco verifica-se, segundo o Primeiro-Ministro, na interpretação feita dos preceitos constitucionais invocados, concretamente dos artigos 56.º, n.º 1, e 267.º, n.º 1, entendendo que dos mesmos não promana o sentido normativo que lhes é dado pelo Provedor de Justiça.

Assim, pode ler-se na resposta: 'Os sindicatos são, de acordo com a definição que surge na alínea b) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 215-B/75, de 30 de Abril (Lei Sindical), associações permanentes de trabalhadores para a defesa e promoção dos seus interesses sócio-profissionais. São, por conseguinte, pessoas colectivas constituídas para a prossecução de certo escopo (defesa e promoção dos interesses sócio-profissionais dos trabalhadores que representam). Por seu turno, o substrato pessoal destas pessoas colectivas (do género associativo) é constituído por certa categoria profissional - ou seja, como se lê na alínea g) do mesmo artigo 2.º, por um `conjunto de trabalhadores que exercem a mesma profissão, ou se integram na mesma actividade, ou que exercem profissões ou se integram em actividades de características globalmente afins entre si diferenciadas de todas as demais'.

Da conjugação destes elementos resulta o entendimento de que o escopo dos sindicatos se traduz na defesa e promoção dos direitos e interesses dos trabalhadores enquanto integrados em certa categoria profissional (ou, como muitas vezes se designa, categoria sindical). Este escopo tem, portanto, uma dimensão colectiva.

[...] Quer dizer: os sindicatos encontram-se legitimados, nos termos das normas materiais e das convenções respectivas, para representar os seus associados. Nestes casos, a legitimidade procedimental é assegurada pelo n.º 1 do artigo 53.º, ao reconhecer tal legitimidade aos titulares de direitos ou interesses legítimos. Não existe, em consequência, qualquer limitação a essa representatividade.

O que o preceito em apreço faz é impedir que os sindicatos e partidos políticos venham a intervir em qualquer procedimento relacionado com os seus associados relativamente a matérias que nada têm que ver...

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